PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

April 12, 2016 | Author: Luzia de Abreu Monsanto | Category: N/A
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1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP ODAIR SILVA SOARES CURRÍCULO E INTERD...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

ODAIR SILVA SOARES

CURRÍCULO E INTERDISCIPLINARIDADE PROFISSIONAL: BASE PARA UMA NOVA GESTÃO EMPREENDEDORA

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

SÃO PAULO 2016

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

ODAIR SILVA SOARES

CURRÍCULO E INTERDISCIPLINARIDADE PROFISSIONAL: BASE PARA UMA NOVA GESTÃO EMPREENDEDORA

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Educação: Currículo sob a orientação da Profa. Dra. Ivani Catarina Arantes Fazenda.

SÃO PAULO 2016

Para contato com o autor Odair Silva Soares enviar mensagem para [email protected] ou [email protected]

SOARES, Odair Silva. CURRÍCULO E INTERDISCIPLINARIDADE PROFISSIONAL: BASE PARA UMA NOVA GESTÃO EMPREENDEDORA Odair Silva Soares, São Paulo: PUC/SP, 2016. (242 FLS) Tese de Doutorado em Educação: Currículo, sob a orientação da Professora Dra. Ivani Catarina Arantes Fazenda. 1 . Administração. 2. Ecossistema Empreendedor. 3. Gestão. 4. Interdisciplinaridade Profissional. 5. Micro e Pequena Empresa (MPE).

Banca Examinadora

Profa. Dra. Ivani Catarina Arantes Fazenda Orientadora

Dedico... Aos meus pais, Mário Soares (póstuma) e Tereza S. Soares, e a minha companheira, Claudete A. Oliveira por serem o meu porto seguro nas navegações turbulentas, por me darem as forças necessárias para transpor os obstáculos em meu caminho, e coragem para alçar este voo...

Agradecimentos Foram muitos os quebra-cabeças que desmontei, remontei, vivi e senti. Uns escritos e outros só vividos. Todos essenciais para o meu percurso até aqui. Meus agradecimentos primeiramente a Deus que me permitiu chegar até aqui. Aos meus pais que me deram a base e à Claudete Alves de Oliveira que fez um enorme esforço buscando compreender as minhas ausências. À Professora Doutora Marina Graziela Feldmann, que entre fins de 2011 e início de 2012 abriu espaços em sua agenda para me ajudar na decisão de fazer o doutorado. Agradeço à Professora Doutora Branca Jurema Ponce com quem fiz três semestres de disciplinas. Acolheu e entendeu minhas dificuldades em relação à área da educação, incentivando e me orientando nos caminhos a trilhar. Um profundo agradecimento à minha maravilhosa orientadora, Professora Doutora Ivani Catarina Arantes Fazenda, que me deu toda a autonomia possível e soube me indicar os melhores caminhos para juntar as peças do emaranhado de conhecimentos e experiências dos quais dispunha para, depois de muito estudo e pesquisa, juntar novas peças na montagem do meu quebra-cabeça. Agradeço às Professoras Doutoras Neide De Aquino Noffs e Dirce Encarnación Tavares que participaram da banca de qualificação e ajudaram a orientar a montagem de meu quebra-cabeça. Aos Professores do Programa de Pós-graduação em Educação: Currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, por todos os ensinamentos durante o curso. Aos componentes do GEPI que muito me apoiaram e estimularam nesse percurso. À Professora Doutora Maurina Passos Goulart Oliveira da Silva que foi a grande parceira de revisão e crítica da minha tese, soube apontar com delicadeza e flexibilidade os meus problemas de escrita e de vícios de linguagem. A todos os amigos, por todo o incentivo que me deram, de todas as formas, de perto ou de longe, inclusive àqueles que fizeram parte da minha história de vida e muito me ensinaram. Muito obrigado a todos

Resumo SOARES, Odair Silva. CURRÍCULO E INTERDISCIPLINARIDADE PROFISSIONAL BASE PARA UMA NOVA GESTÃO EMPREENDEDORA. São Paulo: PUC-SP, 2016. A forma como se ensina, como se aprende e se pratica administração, e mais especificamente empreendedorismo, com teoria e prática calcada ainda numa visão cartesiana provocou a inquietação e o desejo de desenvolver a presente pesquisa. Nossa escolha no desenvolvimento dessa questão não foi tratar dos tradicionais estudos sobre currículo, mas observar como a concepção de conhecimento e seus desdobramentos podem, historicamente, ter interferido na visão atual de administração e empreendedorismo. Nossa trajetória profissional, rica em experiências diversas, permitiu perceber a interdisciplinaridade como postura e forma de articular o conhecimento imbricado na base da ação empreendedora e na gestão de micro e pequenas empresas. A pesquisa qualitativa teve como eixo a articulação da interdisciplinaridade e do empreendedorismo numa perspectiva de vislumbrar a construção de um ecossistema empreendedor. Realizada a partir de um denso rastreamento bibliográfico utilizou-se da linha do tempo como fio condutor. Nessa perspectiva, analisando a transição da sociedade industrial para a sociedade do conhecimento, identificou nos estudos sobre o pensamento complexo uma abordagem que tem em sua base o germe da interdisciplinaridade. O objetivo da pesquisa foi tentar desvelar o quanto interdisciplinaridade e empreendedorismo identificam-se e podem contribuir de maneira determinante e em diversas dimensões na gestão das micro e pequenas empresas (MPEs), na prática cotidiana e na produção teórica, rara atualmente. Recorrendo à metodologia de investigação interdisciplinar de Fazenda e Japiassu e de história de vida em Pineau, das memórias do pesquisador foram resgatadas experiências ricas em articulações interdisciplinares que tentaram dialogar com os teóricos da administração e empreendedorismo como Drucker, Filion e Dolabela, dentre outros. Nesse percurso, foi possível constatar como a visão interdisciplinar está presente no caminho empreendedor, apontando para a premente necessidade de um ecossistema que contribua para o desenvolvimento econômico e social, em âmbito regional e nacional. Ao final dos estudos é possível afirmar que o século XXI é o século da interdisciplinaridade e do empreendedorismo. Não é possível ser empreendedor sem ser interdisciplinar. A interdisciplinaridade enquanto atitude é uma prática empreendedora, marcada pela coragem e pela ousadia. Entendemos que essa coragem e ousadia são necessárias à reformulação dos currículos, não apenas na área epistemológica da administração e empreendedorismo, mas inclusive nos currículos que formam profissionais de outras áreas, afinal todos se relacionam no mercado. Palavras-chave: Administração. Ecossistema Empreendedor. Gestão. Interdisciplinaridade Profissional. Micro e Pequena Empresa.

Abstract SOARES, Odair Silva. SYLLABUS AND PROFESSIONAL INTERDISCIPLINARITY BASIS FOR A NEW ENTREPRENEURIAL MANAGEMENT. São Paulo: PUC-SP, 2016. The way how management, and more specifically entrepreneurship, is taught, learned and practiced, with theory and practice still based on a Cartesian view, has provoked uneasiness and the desire to develop this research. Our choice in the development of this issue was not to deal with the traditional studies on the syllabus, but notice how the conception of knowledge and its unfoldings may historically have affected the current view of management and entrepreneurship. Our professional career, rich in diverse experiences, allowed to perceive interdisciplinarity as a posture and a way of articulating the imbricated knowledge on the basis of entrepreneurial action and management of micro and small enterprises. The qualitative research was articulated around the axis of interdisciplinarity and entrepreneurship in a perspective to envision building an entrepreneurial ecosystem. Out of a dense literature screening, time was used as the thread line. In this perspective, analyzing the transition from the industrial society to the knowledge society, the research identified in the study of the complex thinking an approach that has the germ of interdisciplinarity. The objective of the research was to try to unveil at what extent interdisciplinarity and entrepreneurship are identified and can contribute in a decisive way and various dimensions in the micro management and small enterprises in everyday practice and theoretical production, currently so rare. Using the interdisciplinar research methodology by Fazenda and Japiassu and life story by Pineau, the researcher's memories of rich experiences were rescued in interdisciplinary articulations establishing dialetics to management and entrepreneurship theorists like Drucker, Filion and Dolabella, among others. Along the way, it was identified how the interdisciplinar vision is present in the entrepreneurial path, pointing to the urgent need for an ecosystem that contributes to the economic and social development at the regional and national level. At the end of the studies it is clear that the twenty-first century is the interdisciplinar and entrepreneurship century. You can not be an entrepreneur without being interdisciplinar. Interdisciplinarity, as an attitude, is an entrepreneurial practice, marked by courage and boldness. Both, courage and boldness are necessary for a new syllabus, not only in the epistemological area of management and entrepreneurship, but also for professionals in other fields, as all are involved in the market. Keywords: Administration. Entrepreneurial Ecosystem. Management. Professional Interdisciplinarity. Small and Medium Enterprises.

Lista de Abreviaturas e Siglas Abreviatura ou Sigla

Descrição

5S

Seiri (Sort, Separar), Seiton (Systematize, Organizar), Seiso (Shine, Dar brilho), Seiketsu (Standardize, Padronizar, Normatizar) e Shitsuke (Sustain, Selfdiscipline, Manter, Conservar)

5W

Five Whys ou cinco porquês

ABC paulista

Santo André, São Bernardo e São Caetano

ABNT

Associação Brasileira de Normas Técnicas

ACSP

Associação Comercial de São Paulo

AED

Agência de Educação para o Desenvolvimento

AFAPUC

Associação dos Funcionários da PUC-SP

AI-5

Ato Institucional n 5

APL

Arranjo Produtivo Local

APROPUC

Associação dos Professores da PUC-SP

ASN

Agência SEBRAE de Notícias

BB

Banco do Brasil

BBC

British Broadcasting Corporation

BNDES

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BP ou PN

Business Plan ou Plano de Negócio

BR

Brasil

BRICS

Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

BSP

Business School São Paulo

CA Leão XIII

Centro Acadêmico Leão XIII

CAMP

Círculo de Apoio ao Menor Patrulheiro apoiado e mantido pelo Rotary Clube

CCE

Características do Comportamento Empreendedor

CE PUC-SP

Centro de Empreendedorismo da PUC-SP

CIPA

Comissão Interna Para Prevenção de Acidentes

CLT

Consolidação das Leis do Trabalho

CNI

Confederação Nacional das Indústrias

CNPq

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

DA

Diretório Acadêmico

DCE

Diretório Central de Estudantes

DIEESE

Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos

DO

Desenvolvimento Organizacional

DOI-CODI

Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (subordinado ao II Exército)

DOPS

Departamento de Ordem Política e Social

DOU

Diário Oficial da União

o

Abreviatura ou Sigla

Descrição

EDUFBA

Editora da Universidade Federal da Bahia

EDUFU

Editora da Universidade Federal de Uberlândia

EM

Jornal Estado de Minas

EMPRETEC

Workshop mundial de formatação padronizada, das características do empreendedor

ENIAC

Electrical Numerical Integrator and Computer

EPP

Empresa de Pequeno Porte

EUA

Estados Unidos da América

FAAM

Faculdades Alcântara Machado

FDC

Fundação Dom Cabral

FEA PUC

Faculdade de Economia, Administração, Ciências Contábeis e Atuarias

FGV

Faculdade Getúlio Vargas

FJE

Fórum dos Jovens Empreendedores

FMU

Faculdades Metropolitanas Unidas

FOC

Faculdades Oswaldo Cruz

GEM

Global Entrepreneurship Monitor

GEPI

Grupo de Estudos e Pesquisa em Interdisciplinaridade

GQT ou TQM

Gestão da Qualidade Total ou Total Quality Management

HEC Montréal

Hautes études commerciales de Montréal

IBGE

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IBQP

Instituto Brasileiro Qualidade e Produtividade

IES

Instituições de Ensino Superior

IEL

Instituto Euvaldo Lodi

INATEL

Instituto Nacional de Telecomunicações

MDB

Movimento Democrático Brasileiro

ME

Movimento Estudantil

MG

Minas Gerais

MGE

Média e Grande Empresa

MIT

Massachusetts Institute of Technology

MOVER

Movimento Empreendedor de Ribeirão Preto

MPE

Micro e Pequena Empresa

MPME

Micro, Pequenas e Médias Empresas

OCDE

Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

PBE

Programa Brasil Empreendedor

PCB

Partido Comunista Brasileiro

PCdoB

Partido Comunista do Brasil

PUC-SP

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Abreviatura ou Sigla

Descrição

PEA

População Economicamente Ativa

PDV

Programa de Desligamento Voluntário

PERT-CPM

Program Evaluation and Review Technique - Critical Path Method

PhD

Philosophiæ Doctor ou Doutor da Filosofia

PIB

Produto Interno Bruto

PMDB

Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PN ou BP

Plano de Negócio ou Business Plan

POCC

Planejamento, Organização, Comando e Controle

PPG

Programa de Pós Graduação

PSDB

Partido da Social Democracia Brasileira

PT

Partido dos Trabalhadores

RAE

Revista de Administração de Empresas (FGV)

SBT

Sistema Brasileiro de Televisão

SEBRAE

ou SEBRAE-NA Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa

SEBRAESP

Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa de São Paulo

SERT

Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo

SP

São Paulo

TCC

Trabalho de Conclusão de Curso

TEA

Taxa Total de Empreendedores Iniciais

TEE

Taxa Total de Empreendedores Estabelecidos

TGS

Teoria Geral de Sistemas

TRE-SP

Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo

TTE

Taxa Total de Empreendedorismo

UBES

União Brasileira dos Estudantes Secundaristas

UEE

União Estadual dos Estudantes

UFF

Universidade Federal Fluminense

UFBA

Universidade Federal da Bahia

UFMG

Universidade Federal de Minas Gerais

UFSC

Universidade Federal de Santa Catarina

UFU

Universidade Federal de Uberlândia

UNE

União Nacional dos Estudantes

UNIVAC

UNIVersal Automatic Computer

Lista de Diagramas Diagrama Título – Descrição

Pág

3.1

Visão das principais disciplinas da administração dentro da visão linear. .

131

3.2

Visão das principais disciplinas da administração dentro da visão sistêmica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

131

3.3

Visão das principais disciplinas da administração dentro do pensamento complexo com sua visão integradora. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

132

Lista de Figuras Figura

Título – Descrição

Pág

I.1

Ficha do DOPS da composição da 1ª. Diretoria DCE Livre da PUC-SP Chapa vitoriosa ―Pé no Chão‖. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

25

I.2

Capa Relatório do DOPS de maio/1979 sobre ME. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

26

I.3

Página 5 do Relatório do DOPS de maio/1979 sobre atuação de Odair Soares e outros no ME. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..

27

I.4

Ficha de Odair Soares nos arquivos do DOPS sobre atuação sindical de Odair Soares. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

30

I.5

Cópia da Capa do Caderno de Economia tratando da greve da categoria bancária. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

31

I.6

Foto da Capa do Caderno de Economia tratando da greve da categoria em setembro/1986. Em destaque Odair Soares no canto superior esquerdo. . .

31

1.1

Prelúdios do pensamento administrativo do século XVIII até a década 10 do século XX. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

46

1.2

Linha do tempo das teorias da administração ocidentais sem o modelo japonês de gestão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

49

1.2a

Linha do tempo das teorias da administração ocidentais e japonesa. . . . . .

58

1.3

Articulação das disciplinas de Peter Senge para a criação da organização de aprendizagem. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

57

1.4

Bases do modelo japonês de administração. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

59

Figura

Título – Descrição

Pág

1.5

Princípios do sistema Toyota de produção. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

60

2.1

Grafia do termo crise no dialeto Kanji chinês. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

86

2.2

Síntese do processo Destruição Criadora. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

89

2.3

Ilustração do processo Destruição Criadora de Joseph A. Schumpeter. . . .

90

2.4

O processo de visão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

96

2.5

Três categorias de visão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

97

2.6

As ligações entre o sistema de relações, as visões e as ações. . . . . . . . . .

98

2.7

O processo visionário. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104

2.8

O Processo Gerencial dos Empreendedores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106

2.9

O Processo Gerencial dos Operadores de Negócios. . . . . . . . . . . . . . . . . .

107

2.10

Esquema de estruturação do Ecossistema Empreendedor. . . . . . . . . . . . . .

116

2.11

Domínios do Ecossistema Empreendedor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

117

2.12

Ilustração de um Ecossistema Empreendedor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

119

3.1

Abordagem Metafórica da Redução da Relação Tempo. . . . . . . . . . . . . . . .

136

3.2

Representação dos ciclos de vida das inovações. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

137

3.3

Conflito de Paradigmas Sociedade Industrial X do Conhecimento. . . . . . . .

143

4.1

Convite no site PUC-SP para evento do Núcleo de Jovens Empreendedores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

166

A.1

Livro publicado pela Distrital Lapa da ACSP, 2002. . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

220

Lista de Gráficos Gráfico

Título – Descrição

Pág

1.1

Evolução do número de estabelecimentos por porte – Brasil 2002-2012 (em milhões). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

63

1.2

Taxa de sobrevivência internacional de empresas com até 2 anos, para empresas com empregados (%).. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

72

1.3

Taxa de mortalidade de empresas com 2 anos, por região do país. . . . . .

73

1.4

Renda média mensal real dos ocupados nas MPEs Regiões Metropolitanas e Distrito Federal 2012 (em R$). . . . . . . . . . . . . .

76

2.1

Taxa Total de Empreendedorismo dos Países dos BRICS. . . . . . . . . . . . .

112

2.2

Evolução das taxas de empreendedorismo segundo estágio do empreendimento TEA, TEE, TTE – Brasil 2002-2015. . . . . . . . . . . . . . . . .

112

2.3

Especialistas avaliando o Brasil segundo os fatores limitantes e favoráveis à atividade empreendedora – Brasil – 2015. . . . . . . . . . . . . . . .

115

Lista de Mapas Mapa

Título – Descrição

Pág

1.1

Proporção de empregadores no universo de ocupados. . . . . . . . . . . . . . . .

75

1.2

Proporção de conta própria no universo de ocupados. . . . . . . . . . . . . . . .

75

2.1

Área de Cobertura Geográfica do GEM Acinzentada. . . . . . . . . . . . . . . . . .

110

2.2

Localização de Santa Rita do Sapucaí (MG). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

121

A.1

Cidade de São Paulo com destaque acinzentado para a Vila Curuçá no extremo leste do município de São Paulo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

217

Lista de Quadros Quadro

Título – Descrição

Pág

I.1

Seis experiências pessoais escolhidas na linha histórica de vida do empreendedor Odair Soares entre cinquenta e seis centelhas . . . . . . . . . .

13

1.1

Comparativo entre as ideias ocidentais e as orientais em relação à administração. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

61

1.2

Número de estabelecimentos com e sem empregados por porte e setor de atividade econômica – Brasil 2012. . . . . . . . . . . . . . . . . .

68

1.3

Classificação das MPEs segundo o número de empregados . . . . .

69

1.4

Evolução da distribuição dos estabelecimentos por porte Brasil 2007 – 2012 (em %). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

70

Título – Descrição

Pág

3.6

Dados, informações e conhecimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

141

4.1

Operadores Cognitivos ou de religação: características, enunciados e significados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

154

4.2

Termos comuns à interdisciplinaridade, ao empreendedorismo e ao pensamento complexo, com seus correspondentes significados. . . . . . . . .

170 a 175

A.1

Centelhas empreendedoras e interdisciplinares. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

210 a 214

A.7a

Origem e participantes do GEM. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

223

A.7b

Nota Metodológica das Pesquisas GEM – 2014 e 2015. . . . . . . . . . . . . . . .

223

Quadro

Lista de Tabelas Tabela

Título – Descrição

Pág

I.1

Sinônimos com Diversos Significados do Termo Faísca. . . . . . . . . . . . . . . . .

15

1.1

Evolução da taxa de empregadores e conta própria Brasil 2002 – 2012 (% e nos. absolutos). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

74

1.2

Características dos empresários com registro da empresa na JUCESP (2007). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

78

2.1

Vantagens resultantes da visão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

101

2.2

Raio X dos Operadores de Negócios/Empreendedores Distribuição percentual dos empreendedores segundo característica sócio demográficas – Brasil – 2015. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

111

2.3

Percentual da população segundo o sonho – Brasil, 2014. . . . . . . . . . . . . . .

113

2.4

Distribuição das principais recomendações citadas pelos especialistas – Brasil – 2014. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

114

4.1

Características e consequências da prática do pensamento integrador por pessoas integradoras. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

156

Sumário

Introdução .................................................................................................................1 I.1 – Problema e Objetivo ..................................................................................... 2 I.1.1 – Esclarecimentos ............................................................................................ 6

I.2 – Caminho escolhido ....................................................................................... 8 I.2.1 – Autobiografia ............................................................................................... 10

I.3 – Linha histórica da vida de uma faísca empreendedora ........................... 12 I.3.1 – Revisita a marca Faísca como metáfora .................................................... 14

I.4 – “Uma faísca pode incendiar toda a pradaria”........................................... 17 I.4.1 – Ingresso no Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ................................... 20 I.4.2 – Sonhos: revisitando e religando vagas lembranças ao presente ............ 23 I.4.3 – Sonhos: autonomia e liberdade como uma postura interdisciplinar ....... 29 I.4.4 – Articulações interdisciplinares na política ................................................ 33

I.5 – Teorias que se entrelaçam na rede do saber............................................ 34 I.6 – Panorama da tese ....................................................................................... 36

Capítulo 1 – Fundamentos e Práticas da Administração ...................................40 1.1 – Fundamentos da administração ............................................................... 41 1.1.1 – Visão geral da administração .................................................................... 41 1.1.2 – Administração antes das teorias ............................................................... 44 1.1.3 – Escolas e teorias da administração .......................................................... 48 1.1.3.1 – Modelo Japonês de Administração ................................................................... 58

1.2 – Práticas administrativas nas Micro e Pequenas Empresas (MPEs) brasileiras .................................................................................................... 62 1.2.1 – Aspectos gerais sobre as MPE’s ............................................................... 63 1.2.2 – Conceito e participação das MPEs na economia brasileira..................... 67 1.2.3 – Diagnóstico da mortalidade das MPEs no Brasil ..................................... 73

1.3 – Perspectivas das MPES ............................................................................. 79 1.4 – Impasses na vida de um professor de empreendedorismo para administradores .......................................................................................... 82 1.4.1 – Educador empreendedor ou empreendedor educador? .......................... 83

Capítulo 2 – Bases e Perspectivas do Empreendedorismo...............................85 2.1 – Retrospectiva das abordagens sobre o empreendedorismo ................. 87 2.1.1 – Primeiros estudos sobre o empreendedorismo ....................................... 87 2.1.2 – O empreendedorismo: foco de estudos mais abrangentes..................... 92

2.2 – Tipologia dos empreendedores segundo Filion ...................................... 95 2.2.1 – Sistema da visão e relações empreendedoras ......................................... 95 2.2.2 – O Processo visionário dos empreendedores e dos operadores de negócios .................................................................................................... 102

2.3 – Empreendedorismo no Brasil e no mundo ............................................ 109 2.4 – Ativista do ecossistema empreendedor................................................. 115

Capítulo 3 – Rompendo com a Visão Linear Mecânica e Ingressando na Sociedade do Conhecimento ..........................................................123 3.1 – Breve retrospectiva das bases cartesianas ........................................... 123 3.1.1 – Razões da visão mecânica ....................................................................... 124 3.1.2 – Pensamento sistêmico em oposição à visão cartesiana ....................... 126

3.2 – Uma visão e postura interdisciplinar...................................................... 130 3.2.1 – Críticas à visão mecânica linear e a teoria de sistemas ........................ 130

3.3 – Sociedade do Conhecimento .................................................................. 134 3.3.1 – Redução na relação tempo espaço ......................................................... 135 3.3.2 – A Sociedade do Conhecimento ............................................................... 139

3.4 – Reflexões sobre o conflito de paradigmas ............................................ 142

Capítulo 4 – Interdisciplinaridade e Empreendedorismo numa Abordagem Integradora .......................................................................................149 4.1 – Pensamento integrador interdisciplinar................................................. 149 4.1.1 – O pensamento complexo ou integrador.................................................. 150

4.2 – Interdisciplinaridade: prática integradora.............................................. 157 4.2.1 – Princípios e características da interdisciplinaridade ............................. 159 4.2.2 – Interdisciplinaridade como postura ........................................................ 162 4.2.3 – A doença do pensamento ........................................................................ 163

4.3 – Empreender como uma prática necessariamente interdisciplinar ...... 165 4.4 – Interdisciplinaridade, Empreendedorismo e Pensamento Integrador três faces do mesmo lado da moeda ...................................................... 167

Lampejos Finais ....................................................................................................176

Referências .........................................................................................................185 Índice Onomástico ............................................................................................ 199 Notas de Esclarecimento – Ordem Alfabética ................................................ 201

Anexos .................................................................................................................210 Anexo A.1 – Quadro das Centelhas Empreendedoras e Interdisciplinares ............. 210 Anexo A.2 – Criação Compuarte – Empresa de Eliandre Martini (Lia) .................... 215 Anexo A.3 – Relato da morte da esposa Eliandre Martini (Lia) ............................... 215 Anexo A.4a – Programa Brasil Empreendedor (PBE) VILA CURUÇÁ 1 ................. 217 Anexo A.4b – PBE Vila Curuçá 2............................................................................ 218 Anexo A.4c – PBE ROTARY – CAMP .................................................................... 218 Anexo A.5 – Distrital Lapa ACSP............................................................................ 219 Anexo A.6 – TCC Velejando no Litoral Paulista ...................................................... 221 Anexo A.7 – Quadros GEM .................................................................................... 223

Introdução Quem explicará a explicação? Byron A desgraça das ciências humanas reside no fato de lidarem com um objeto que fala. Bourdieu Não sabemos se sabemos [...] não sabemos nem mesmo o que é saber. Metrodoro de Chios

Currículo e Interdisciplinaridade Profissional – Base para uma nova gestão empreendedora foi o título escolhido para a tese resultante do estudo dos conflitos vividos por este profissional durante sua vida até o presente momento, muito antes de se conhecer os termos interdisciplinaridade e empreendedorismo, vivendo desassossegos ora impostos pela vida, alguns totalmente fora de controle, ora provocados pela sua constante curiosidade e postura desafiadora, porém com quase nenhum ou nenhum controle sobre a situação. Buscamos costurar uma história com diversos episódios interessantes do ponto de vista da pesquisa interdisciplinar e empreendedora, às vezes com lances curiosos, engraçados e até trágicos, como é a vida de todos nós. Poderia ser mais uma história, pintada em tons pastéis, bem leve, mas, buscamos carregar nos tons mais fortes: vermelhos, amarelos, azuis, obviamente, sem alterar o conteúdo histórico, apenas dirigindo o olhar crítico de pesquisador, realçando alguns aspectos centrais em nossa tese. A articulação entre a administração, a história de vida, a interdisciplinaridade e o empreendedorismo, objetivou demonstrar como atitudes e posturas podem mudar os rumos de uma vida ou até mesmo de várias. A ação de um ser humano não é isolada, insere-se em um contexto muito maior que a sua própria vida, influenciada pelo ambiente que o cerca, influenciando mais ou menos nesse contexto, dependendo de sua predisposição interdisciplinar e empreendedora. Para Fazenda; Tavares; Godoy (2015, p. 2 e 3), pesquisar interdisciplinarmente é um desafio de diferentes ordens que enfrentamos - teórica, pessoal e metodológica nas seguintes dimensões: profissional, científica, prática e metodológica. Na interdisciplinaridade profissional, nos perguntamos o quanto empreendedores somos

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na busca por maiores e melhores competências, o quanto somos abrangentes na busca por soluções. (FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 3). A interdisciplinaridade científica encaminha-nos a questionar o desenvolvimento da ciência até o momento, com humildade, paciência e respeito pelas produções anteriores. Em relação à interdisciplinaridade prática, somos impelidos a manter estreita sintonia entre o pensar e o agir. Devemos na opinião de Fazenda; Tavares; Godoy (2015, p. 3) ―tornar o familiar estranho, tarefa das mais complexas a que a Pesquisa Interdisciplinar nos convida‖. Na interdisciplinaridade metodológica, a coerência nos impele a romper com os muros elitistas da academia e ―ir onde o povo está‖ com humildade, paciência, acessando novos saberes, através de novos olhares, despertando infinitas perguntas. Essas dimensões expostas são indissociáveis e como tal devem ser vistas, sentidas e implementadas. A interdisciplinaridade é considerada uma visão estratégica sobre todas essas dimensões, ratificada em diversos eventos nacionais e internacionais. (FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 3). Nossa intenção, como pesquisadores interdisciplinares é transformar e sermos transformados. Ousar incomodar e aceitar sermos incomodados. Ser humilde para saber ouvir, ter opinião e saber se apresentar com essas ideias, sem arrogância. Usar a interdisciplinaridade como norte para uma visão mais ampla, estratégica e, adotar posturas empreendedoras na vida em todas as suas dimensões.

I.1 – Problema e Objetivo As razões da entrada no doutorado, que vieram se clarificando nos últimos anos, tornaram-se a razão dessa tese. Formado em economia, mestre em administração e, há vinte e um anos dedicando-se intensamente ao estudo e a prática empreendedora. Com experiência de trinta e seis anos em formação e aplicação de treinamentos, dezesseis anos ministrando aulas em faculdades de administração e na pós-graduação nos últimos nove anos. Nessa trajetória a questão educacional tem nos provocado intensamente

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A forma como se ensina, se aprende e, se pratica administração, mais especificamente empreendedorismo provocou as inquietações tratadas no decorrer do trabalho. Essas inquietações acabaram por nos lançar nos braços do Programa de Estudos Pós-Graduados de Educação: Currículo, especificamente na área epistemológica da interdisciplinaridade. Nossa escolha no desenvolvimento dessa questão não foi tratar dos tradicionais estudos sobre currículo, mas observar como a concepção de conhecimento e seus desdobramentos podem, historicamente, ter interferido na visão atual de administração e empreendedorismo. Portanto, indo à questão fulcral, o problema de pesquisa está diretamente ligado à interdisciplinaridade, empreendedorismo e à administração, seus fundamentos e práticas acadêmicas e gestão organizacional. A interdisciplinaridade jogou luz em uma série de questões candentes, que foram surgindo a partir de diversas pesquisas, que por sua vez ensejaram novas pesquisas. Para Quivy e Campenhoudt (1998, p. 31) o receio de iniciar mal um trabalho pode levar alguns pesquisadores a rodearem o problema por muito tempo, sem o tratarem de maneira mais adequada. Para os autores a solução está na elaboração de uma apropriada pergunta de partida, que outros chamam de pergunta chave. Essa pergunta chave, em síntese, como o próprio termo indica, deve representar a essência do que se quer estudar, do que se pretende responder com o trabalho de pesquisa. Aprofundando mais, Quivy e Campenhoudt (1998, p. 44) afirmam que existem claramente [...] três níveis de exigência que uma boa pergunta de partida deve respeitar: primeiro, exigências de clareza; segundo, exigências de exequibilidade; terceiro, exigências de pertinência, de modo a servir de primeiro fio condutor a um trabalho do domínio da investigação em ciências sociais. (QUIVY; CAMPENHOUDT, 1998, p. 44).

Mais especificamente para a elaboração de uma adequada pergunta chave, devemos nos preocupar em formular uma questão que seja precisa, unívoca e concisa, no que diz respeito à clareza; em relação à possibilidade de sua realização ela necessita ser factível. Por último em relação a sua adequação ela deve ser prospectiva e não preditiva, buscar compreender e não julgar; deverá ser efetivamente aberta e não um questionamento que já se sabe a resposta antecipadamente; deverá captar um campo de possibilidades, de desafios e não

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exercer previsão do futuro; visará o melhor conhecimento dos fenômenos estudados e não simplesmente sua descrição. (QUIVY; CAMPENHOUDT, 1998, p. 44). Atendendo a esses requisitos formulamos a seguinte pergunta que nos orientou durante a pesquisa e durante toda a redação de nossa tese.

A S P R ÁT IC A S E CO N HE CI M E NT O S D A A D MI NI ST R AÇ ÃO R E L A C IO N A DO S AO E M PR E EN D ED O R I SM O E INT E RD I SC I PL IN AR ID A D E E ST ÃO SI N T O NIZ ADO S E AT E ND E M À S EX IG Ê N CI A S D A S M P Es N A S O CI E D AD E CO NT E MP O R ÂN E A ?

As práticas e o conhecimento da administração modificam-se constantemente, enquanto algumas convicções são atemporais. Parece-nos, que essas alterações ocorrem mais intensamente no campo teórico que no prático, pelos gestores estarem mais arraigados a fundamentos da administração clássica. Dessa forma, faremos uma abordagem reflexiva com base na história de vida de um administrador, professor de administração e empreendedor que incursionou no programa de estudos pós-graduados em Educação: currículo objetivando seu doutoramento. Dessa questão chave decorrem outras, que secundariamente pretendemos responder como:  Quais seriam as necessidades teórico-práticas mais urgentes da Administração?  Em que bases estariam alicerçadas tais práticas e conhecimentos da administração para atender tais necessidades?  Qual(is) a(s) direção(ões) da(s) mudança(s)?  Na sociedade contemporânea os modelos existentes são suficientes ou, necessitam mudar, ou ainda existe a necessidade de um novo modelo, que absorva mais intensamente criatividade, inovação, empreendedorismo e interdisciplinaridade, criando assim novas oportunidades.

Como iremos trabalhar com história de vida autobiográfica como método de pesquisa, cabe levantar uma questão ao protagonista dessa história:

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 Como este pesquisador, oriundo da área epistemológica da administração, se comportou e, tem se defrontado com a criatividade, inovação, empreendedorismo e interdisciplinaridade?

Partimos de algumas hipóteses preliminares, buscando através do olhar de pesquisador interdisciplinar, questionar tais conjecturas no decorrer da tese. Primeira,

consideramos

que

assim

como

o

empreendedorismo

a

interdisciplinaridade faz parte da essência do ser humano, e que o status quo busca enformar, pasteurizar as pessoas, assim, nossa visão se forma fragmentada, fracionada, dificultando a visão do todo. Com isso, nossa cultura ―mata‖ os germes da interdisciplinaridade e do empreendedorismo na educação e deformação da atual escola e da cultura. Segunda, o choque de paradigmas da sociedade industrial com a sociedade do conhecimento descortina um horizonte confuso, onde as pessoas que, foram formadas sob o antigo paradigma apresentam um discurso que se propõe a ser moderno, ou pelo menos politicamente correto, mas mantém uma prática contraditória a esse mesmo discurso. Terceira, as teorias cartesianas e dos sistemas, base científica e filosófica da sociedade industrial, necessitam ser descontruídas, questionadas e substituídas em aspectos ultrapassados, criando bases mais férteis e apropriadas para a sociedade do conhecimento, com incentivo ao empreendedorismo e tendo como suporte a interdisciplinaridade. Quarta, o desenvolvimento do pensamento complexo ou integrador, só seria possível através da interdisciplinaridade. Rompendo com o passado, com a sociedade industrial e com a visão fragmentadora e fragmentada imposta pela visão linear mecânica e a circular sistêmica. Não podemos imaginar movimentos e ações isolados,

mas

sim,

a

construção

de

ambientes

arejados

que

respirem

interdisciplinaridade e empreendedorismo. O ecossistema empreendedor é esse ambiente e, portanto, representa nossa principal hipótese. Sua construção e consolidação podem mudar regiões e se propagar como uma faísca na pradaria.

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I.1.1 – Esclarecimentos Partimos do pressuposto que o ser humano nasce interdisciplinar, também com características básicas do empreendedorismo. Dolabela1 (2003b, p.15) nos inspira a pensar que a educação e a sociedade acabam reprimindo o livre desabrochar e desenvolvimento da postura interdisciplinar e das características empreendedoras. Para ele ―lidar com crianças é lidar com autênticos empreendedores ainda não contaminados pelos valores antiempreendedores da educação, nas relações sociais, no ‗figurino cultural‘ conservador a que somos submetidos‖ (DOLABELA, 2003b. p. 15). A educação tradicional disciplinar aprisiona, “impõe limites, preserva poderes, exclui‖ (DOLABELA, 2003b. p. 15) mutila as mentes impossibilitando a criação e criatividade. Enquanto a interdisciplinaridade e o empreendedorismo libertam, pois, estes diferentemente daquela, não privam os jovens do conhecimento e dos sonhos. Ao contrário, impelem as pessoas a sonharem, articularem seus pensamentos, seus conhecimentos em busca da conquista da autonomia e do livre pensar. Parte-se do pressuposto que o homem precisa primeiro sonhar para em seguida realizar. A origem e a essência da interdisciplinaridade e do empreendedorismo estão na emoção do indivíduo, na energia2 que o leva a transformar-se e a transformar sua vida. Mas, como então trabalhar os significados de interdisciplinaridade e de empreendedorismo no desfavorável ambiente acadêmico? Resistimos muito a adotar história de vida autobiográfica como metodologia de pesquisa interdisciplinar,

1

2

Fernando Dolabela: mineiro autor de nove livros (entre eles o Segredo de Luísa com 160 mil exemplares vendidos) e dois softwares, criador dos maiores programas de ensino de ensino empreendedorismo do Brasil na educação básica e universitária: A metodologia Oficina do Empreendedor (utilizada em projetos do IEL (CNI), Sebrae, CNPq e outros órgãos) já foi implementada em mais de 400 instituições de ensino superior, atingindo cerca de 3.500 professores e 160.000 alunos/ano. A metodologia Pedagogia Empreendedora (educação empreendedora para a educação infantil, ensino fundamental e médio), apesar de recente já é utilizada em 120 cidades, envolvendo cerca de 10.000 professores e 300.000 alunos com repercussão em uma população de 2,5 milhões de habitantes. Consultor e professor da Fundação Dom Cabral, ex-professor da UFMG, consultor da CNI-IEL Nacional, do CNPq, e da AED (Agência de Educação para o Desenvolvimento) e dezenas de universidades, participa com publicações nos maiores congressos nacionais e internacionais. DOLABELA, Fernando. (2016). Energia: para Dolabela (1999, p. 78) ―Diz respeito a quantidade e qualidade do tempo dedicado ao trabalho. A energia é influenciada pelo conceito de si e pelos valores que vão determinar o quanto estamos dispostos a investir em determinado momento. É com base na energia que o empreendedor terá fôlego para compreender um setor, desenvolver uma visão, estabelecer as relações necessárias, aprofundar-se nas características do produto ou serviço e dedicar-se à organização e ao controle [...] a visão é um processo permanente, que exige muita energia‖.

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por estar preso à forma convencional. Entretanto, fomos convencidos pela sabedoria e paciência interdisciplinares de nossa orientadora Profa Dra. Ivani Fazenda. Afinal, não é nada fácil falar de si mesmo. Corríamos o grande risco de pender para a visão de enfatizar os erros esquecendo os acertos ou ao contrário, caindo em uma visão egocêntrica e arrogante apenas apontando os aspectos positivos e enaltecedores. O equilíbrio e a ponderação são muito difíceis. Outros aspectos que pesam é o medo da rejeição pela academia de tal metodologia e o receio da exposição pública de sua vida, de sua identidade. Essa ideia foi amadurecendo por longos 587 dias e acabamos por escrever uma história de vida, nossa história de vida. Podemos afirmar, sem sombra de dúvidas, que este feito constituiu-se num marco pessoal, um grande impasse interdisciplinar. Ao escrever sobre temas tão caros de nossa vida, da formação, do desenvolvimento e dos nossos sonhos3 sentimos uma grande realização. Exigiu muito equilíbrio e discernimento, atuar ora como pesquisador, ora como objeto da pesquisa. Segundo Pineau (2000-2006 apud FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 80) ocorre uma decapagem temporal, isto é, o indivíduo relata sua história (primeira camada) realçando o que viveu, emoções pessoais fronteiriças entre o consciente e o inconsciente, e, num recontar como uma nova camada sente-se numa ―segunda tomada de consciência‖. Conhecemo-nos e conscientizamo-nos sobre a nossa experiência como se a estivéssemos vivendo novamente, com toda a experiência acumulada e vivida. Tratando disso, Pineau (2000-2006 apud FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 80) sobre a escola da experiência, afirma: A escola da experiência se expande em dois tempos: interação e um tempo de reflexão. Quanto mais o tempo de interação é forte, mais o tempo de reflexão é longo para compreender realmente o que foi vivido [...]. A experiência é como uma professora temível, que primeiro aplica a prova para depois dar as aulas. (PINEAU, 2000-2006 apud FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 80)

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Sonho(s): Em muitos momentos trato desse termo, escrevi algumas reflexões que disponibilizo mais a frente nessa introdução sob o título ―Sonhos: revisitando e religando vagas lembranças com o presente‖. Raul Seixas compôs a música Prelúdio com a simples letra: ―Sonho que se sonha só. É só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade‖. Escreveu apoiado no romancista, dramaturgo e poeta castelhano Miguel de Cervantes Saavedra (1547 – 1616) que escreveu em sua primorosa obra Dom Quixote, publicada em 1605, ―Quando se sonha sozinho é apenas um sonho. Quando se sonha junto é o começo da realidade‖.

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Passamos a escrever então nossa vivência por prazer, por uma alegria de viver e poder rever e crescer. A Profa. Ivani Fazenda costumeiramente repete: ―quem não escreve não se inscreve‖ para a eternidade, mas principalmente, para a vida. (FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 81) Nossa tese busca entender significados e vínculos entre o empreendedorismo e a interdisciplinaridade analisando conflitos, problematizando através de história de vida. ―Utilizando as práticas do cotidiano e vivenciando essas práticas com um olhar mais aprimorado e uma escuta mais sensível‖. Investigando, entranhando nas obras de diversos autores, mas, principalmente, dentro de mim mesmo. (FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 15).

I.2 – Caminho escolhido Existe um enorme interesse por biografias, haja vista a grande polêmica em torno da recente votação no Supremo Tribunal Federal (junho/2015), que por unanimidade de seu plenário declarou inexigível autorização prévia para a publicação de biografias, derrubando assim, os artigos 20 e 21 do Código Civil. Estes vigoravam desde 2002. Histórias de vida, particularmente de pessoas públicas, sempre foram de interesse público. Histórias de vida podem servir como exemplo, ou simples comparação, para um conjunto de outras pessoas construírem ou reconstruírem suas vidas. Para o conhecimento tradicional o que está fora do convencional vira marginal. Assim, podemos dizer que o método escolhido ―história de vida‖, vem quebrando barreiras, superando os limites da racionalidade, da convencionalidade e, da quantificação impostas pelas metodologias quantitativas tradicionais. Nossa preocupação não é ser diferente, mas usar um método que nos permita trabalhar com mais segurança e envolvimento. Mirian Goldenberg (2015, p. 62) trata essa questão flexibilizando-a da seguinte forma ―[...] a escolha de trabalhar com dados estatísticos ou com um único grupo de indivíduos, ou com ambos, depende das questões levantadas e dos problemas que se quer responder‖.

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Mais adiante a autora reforça sua preocupação com a criatividade e flexibilidade afirmando que ―[...] o importante é ser flexível e criativo para explorar todos os possíveis caminhos e não retificar a idéia (sic) positivista de que os dados qualitativos comprometem a objetividade, a neutralidade e o rigor científico‖ (GOLDENBERG, 2000, p. 62). Nossa maior preocupação é com a compreensão do significado e menos com o rigor estatístico e matemático. Por intermédio de cartas, fotos, filmagens, documentos pessoais, dentre outros recursos, o pesquisador objetiva captar a profundidade da história do sujeito. Importante que se diga que essa metodologia é extremamente nova, tendo surgido na chamada Escola de Chicago vinculada à Sociologia, com pesquisas desenvolvidas entre 1915 e 1940 na Universidade de Chicago. A memória reveste-se de característica de singularidade. Uma mesma história será contada de forma diferente por todas as pessoas que a contarem, amparadas exclusivamente em suas memórias. Por trás das memórias estão histórias pessoais que revelam particularidades. Assim, ―ao descobrir e valorizar a memória do homem, entendemos que estamos preservando a sua memória física e espacial, possibilitando a evidência dos fatos coletivos‖. (FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 82). Fazenda; Tavares; Godoy (2015, p. 82) afirmam em sua obra, que existem algumas faces da libertação de uma metodologia de história de vida e, normalmente conduz aos seguintes questionamentos:  Qual face da história de vida se deseja recuperar?  O que é importante salientar sobre a história de vida?  Deve-se fazer um recorte menor ou maior de determinado período?  Quais dos papéis exercidos devem ser narrados?  Como alinhavar e dialogar com outros autores sobre as etapas escolhidas?

Essas questões permitem ao pesquisador e ao pesquisando reverem seus conceitos, práticas vividas, autonomias e seus posicionamentos como cidadãos. Para Tavares (2008): A história de vida é um instrumento de investigação ao coletar dados, relatando a voz do narrador sobre sua existência por meio do tempo, e

10 buscando reconstruir, de forma linear e individual, os acontecimentos significativos vivenciados e a experiência adquirida. (TAVARES, 2008 apud FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 82).

Essa dinâmica da história de vida vem reforçar toda a sua riqueza, um processo de construção social envolvendo as diversas histórias de vida, pensamentos, atitudes e valores diferentes na interpretação de cada experiência. Para Fazenda; Tavares; Godoy (2015, p. 84) a história de vida representa a: Visão emancipadora de pesquisar, de criar e recriar, de escutar a si mesmo, de auxiliar na escolha do tema, ainda, de contribuir no encorajamento do pesquisador, na valorização e revalorização do mesmo, no processo de autoestima, no desvelamento de seus mistérios, na capacidade de redesenhar sua vida. (FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 84)

Enfim, a produção do saber pode passar, nas ciências humanas em particular, pela história de vida, que isoladamente, sem a intervenção do pesquisador, pode não representar nada cientificamente, senão mais uma história. A transformação se dá na intervenção do pesquisador e sua interação com o pesquisado, podendo se transformar em um veículo poderoso da educação.

I.2.1 – Autobiografia O método História de Vida permite ter acesso a uma realidade que transborda a realidade do narrador no papel de narrador. Mesmo que seja a mesma pessoa exercendo papéis diferentes. Isto é, por meio da história de vida contada de maneira própria pelo sujeito, tentamos desvelar o universo do qual ele fez ou faz parte. Pela biografia o sujeito revela-se através da subjetividade, singular e única a respeito de suas experiências e seus saberes, produzindo um conhecimento sobre si, sobre os outros, sobre o cotidiano e o ambiente. Partindo de si, como protagonista e não como coadjuvante, questiona os sentimentos de suas experiências e aprendizagens, ressignificando-as. A tradição antiga reservava a autobiografia aos notáveis, que tinham poder para falar e escrever, participantes de uma classe social privilegiada. Felizmente ocorreu uma democratização ou transição paradigmática revertendo este quadro e, numa

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dança dos movimentos, sabemos que não são mais os sujeitos formados que fazem a história de vida, mas sim, conforme declara Gaston Pineau (2000-2006 apud FAZENDA; TAVARES; GODOY, 2015, p. 88) ―a história de vida que forma os sujeitos‖. No âmbito da cultura empreendedora as pesquisas (auto) biográficas têm feito emergir

enormes

contribuições

para

melhor

compreensão

do

cotidiano

empreendedor, das melhores práticas em determinados contextos, de atitudes e posicionamentos prenhes de iniciativa e criatividade, de visões e insights revolucionários. Quando o relato colhido é uma ―produção de si‖, que o sujeito/pesquisador elabora, ele não pode ser uma simples ―apresentação de si‖. Para Barros (2007, p.32) a história de vida tem vários sentidos, importando o sentido que o sujeito dá ao real, cabendo ao pesquisador posteriormente dar conta do indivíduo como social. Outro aspecto a ser considerado referente ao procedimento história de vida, é que um relato é sempre dirigido a outra pessoa e, assim, provoca outro efeito em quem ouve e assim, sucessivamente. Conforme Galvão (2005, p. 331): [...] as histórias revelam conhecimento tácito, importante para ser compreendido; têm lugar num contexto significativo; apelam à tradição de contar histórias, o que dá uma estrutura à expressão; geralmente está envolvida uma lição de moral a ser aprendida; podem dar voz ao criticismo de um modo social aceitável; refletem a não separação entre pensamento e ação no ato de contar, no diálogo entre narrador e audiência.

Para Souza (2007, p.68) escrever sobre si, sobre um caminho para o conhecimento, numa perspectiva hermenêutica4, não representa uma tarefa técnica ou mecânica. Olhar no espelho da vida e ver refletido seu eu, que te faz pensar, rememorar momentos de sua trajetória existencial na terra. Falar de si e, relatar surge num contexto intelectual de valorização da subjetividade e das experiências pessoais. A também chamada ego-história possibilita que saiamos de nós mesmos. Contar histórias que antes pertenciam ao nosso íntimo constituía-se em conhecimento 4

Hermenêutica: ciência ou técnica que tem por objeto a interpretação de textos filosóficos ou religiosos; sentido das palavras.

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tácito5, tornando-se agora conhecimento explícito6. Esse movimento nos permite desenvolver um trabalho interdisciplinar numa construção e reconstrução de nossa história, dando-lhe um novo sentido, ressignificando-a. Dedicamo-nos integralmente nesse trabalho de revisão de nossa vida, através da identificação dos impasses e soluções interdisciplinares nela vivido, à luz de um conjunto de teorias. Isso nos tem permitido refletir com humildade sobre o passado e, trabalhar sob novas perspectivas interdisciplinares e empreendedoras em relação ao futuro. Esperamos que este texto, ao ser lido por outros pesquisadores, possa ajudá-los a se perceberem e se repensarem como temos feito.

I.3 – Linha histórica da vida de uma faísca empreendedora O Quadro I.1 a seguir, foi apartado do Anexo A.1 acessível ao final dessa tese. Neles estão descritas resumidamente experiências vinculadas às três palavras chave da tese: Administração, Empreendedorismo e Interdisciplinaridade. Nesses quadros as vivências do autor foram distribuídas em quatro colunas, em ordem cronológica crescente por período: ano7 da ocorrência na linha do tempo além de ter a idade do autor no momento da ocorrência, buscando facilitar a visualização do leitor e uma melhor contextualização. As outras colunas são problema entendido como objetivo ou questão principal, causa, como razão da ocorrência e, solução Odair Soares como alternativa(s) apresentada(s) pelo autor para resolver o referido problema e/ou impasse. Foram selecionadas seis experiências a serem relatadas no decorrer da tese, escolhidas por critério de maior significação conforme descrito a seguir. Foram estabelecidas as seguintes regras para a descrição das cinquenta e seis experiências:

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Conhecimento tácito: todo o conhecimento da humanidade não documentado, explicitado, incluindo experiências e o senso comum, portanto, representa a maioria esmagadora do conhecimento da humanidade. Transmitido informalmente para outros seres humanos. Ex.: leite com manga faz mal, conhecimentos na memória de excelentes funcionários, conhecimentos adquiridos cotidianamente. 6 Conhecimento explicito: é todo aquele documentado das mais diversas formas, possível de ser questionado cientificamente, testado e transmitido oficialmente para outros seres humanos. Ex.: trabalhos acadêmicos, manuais empresariais, CD‘s, DVD‘s e outras produções documentadas. 7 Ano: em alguns casos destacamos mês ou período da ocorrência.

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1) Algum vínculo com uma das palavras chave da tese: Administração, Empreendedorismo e Interdisciplinaridade; 2) Eventos organizados pelo autor ou que contaram com sua participação consciente. QUADRO I.1 – Quinze experiências pessoais escolhidas na linha histórica de vida do 8 empreendedor Odair Soares entre cinquenta e seis centelhas . Período

Problema 9

Introdução 1976 a 1989 19 anos

Luta contra as injustiças e a participação como militante e dirigente do PCdoB nos Movimentos Estudantil e Sindical

Causa Inicialmente curiosidade e motivação para participar das atividades estudantis proibidas pelo Regime Militar, posteriormente participação e organização consciente de eventos políticos no ME e Sindical.

Capítulo 1 2001 44 anos

Implantação da disciplina de empreendedorismo em cursos de administração. Capítulo 2

2005 48 anos

2003/4 46 anos

Estudar e relatar a experiência de Santa Rita do Sapucaí (MG) como uma cidade empreendedora. Capítulo 3 Conflito de Paradigmas.

Capítulo 4 2013 56 anos

Agosto Setembro

2006 49 anos

Necessidade de um Núcleo de empreendedorismo na PUC-SP.

Lampejos Finais Convite para participar junto com o Fórum dos Jovens Empreendedores (FJE) da ACSP da elaboração do programa José Serra

Exigência crescente do mercado profissional e dos alunos.

Sta. Rita do Sapucaí (MG) cidade com 40 mil habitantes no sul de Minas Gerais eleita pelo SEBRAE 2003 uma das cidades mais empreendedoras do Brasil. Sociedade Industrial X Sociedade do Conhecimento.

A PUC-SP com tradição humanista e de qualidade na educação, não poderia se ausentar dessa discussão e ação contemporânea.

Programa do candidato José Serra (PSDB) ao Governo estado de São Paulo

Solução Odair Soares Iniciar a militância estudantil nas atividades do Diretório Acadêmico Leão XIII de estudantes da FEA PUCSP. Nesse processo foi dado o apelido de Faísca que, acaba se mantendo até 1989. Estruturação da disciplina de Empreendedorismo para as Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) para as Faculdades Alcântara Machado FAAM e Faculdades Oswaldo Cruz, todas na cidade de São Paulo. Escrever um livro relatando esse fato. Por diversos motivos, alheios a minha vontade, foi suspenso o projeto. Projeto a ser retomado após doutoramento. Reflexões Sobre o Conflito dos Paradigmas da Sociedade Industrial X Sociedade do Conhecimento. Lançada a proposta na semana de Administração em maio/2013, s realizamos as 1ª . reuniões de grupos de alunos interessados nos períodos da manhã e noite no Campus Perdizes, nos meses de maio e junho, contando com a participação de representantes do Campus Consolação que já tinha um grupo funcionando há 1 ano. Dentro das proposições dos jovens ao programa do candidato, Odair Soares se concentrou no sub grupo de Educação Empreendedora propondo a criação de uma Universidade Livre de Empreendedorismo.

Fonte: Autor.

Para chegarmos às seis principais experiências do autor a serem trabalhadas no decorrer dessa tese, fizemos uma primeira triagem tendo como base aqueles que o 8 9

Centelhas: chamamos de centelhas as citações faiscantes resumidas na linha do tempo de Odair Soares. Introdução: Nesse quadro sintetizamos dez experiências escolhidas dentro do tema ―luta contra as injustiças‖. Maiores detalhes sobre critérios e a distribuição dessas passagens estão disponíveis no quadro completo com cinquenta e seis vivências que chamamos de centelhas Anexo A.1.

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autor participou conscientemente, ou a partir de uma reflexão e/ou que tenha desenvolvido um planejamento mínimo. A partir daí refinamos mais nossa seleção, usando os seguintes preceitos: 1) Vínculo mínimo por experiência com duas ou três palavras chave da tese: Empreendedorismo, Interdisciplinaridade, Gestão e/ou Administração; 2) Eventos onde houve uma ação articulada e planejada do autor; 3) Teve uma duração de dois ou mais meses, isto é, houve envolvimento e participação que merecesse ser relatada.

Algumas experiências relatadas foram agrupadas por se tratarem do mesmo momento histórico, e/ou mesmo tema, ou ainda um desdobramento uma da outra. A sua localização nessa tese está informada na coluna Problema.

I.3.1 – Revisita a marca Faísca como metáfora Essa intenção de revisitar a marca Faísca representou um momento particular importantíssimo na elaboração dessa tese. Tal revisita ao apelido, dentro de um contexto próprio, extrapolou o simples significado dele. Levou-nos a uma vinculação com aspectos físicos e morais, no caso, nossos aspectos físicos e morais, isto é, uma pessoa de estatura pequena, magra, rápida e como liderança podendo incendiar uma pradaria. No dicionário Michaelis (2008, p. 378), faísca consta como um substantivo feminino, centelha, chispa, faúlha, fagulha. Eletricidade: Efeito luminoso da descarga elétrica. Parcela de matéria abrasada que se eleva de uma fornalha. Cintilação produzida pela combinação de fluidos elétricos; raio. Mas, aprofundando a pesquisa em meio eletrônico, outros sinônimos e palavras relacionadas demonstraram a diversidade do termo faísca, como se pode acompanhar na Tabela I.1. Falamos há pouco sobre o interesse em trabalhar com analogias10, mas o que são analogias? Pesquisando, encontramos para o termo o seguinte significado: analogia é uma relação de semelhança estabelecida entre duas ou mais entidades distintas, obtida através de comparação. O termo tem origem na palavra grega ―analogia‖ que 10

Analogia(s): do grego analogia, "proporção". SIGNIFICADOS . Acesso em 30 ago, 2015.

[analogia].

Disponível

em

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significa ―proporção‖. Na Filosofia, a analogia é uma forma de averiguar o porquê da semelhança entre objetos ou ideias. Porém, para a analogia ocorra é necessário existir elementos semânticos semelhantes entre os dois termos em questão.

TABELA I.1 – Sinônimos com Diversos Significados do Termo Faísca 1. Inteligência 2.Cintilação 3.Covardia 4.Pusilanimidade 5.Lampejo 6.Corisco 7.Nesga 8.Reverberar 9.Talento 10. Centelha 11. Resplandecer 12. Área 13 Perímetro 14.Faiscação 15.Fagulha 16.Estalar 17.Chamegar 18 Espirrar 19. Brilho 20.Radiar 21.Cintilar 22 Estralar 23.Cintilante 24.Crepitar 25.Chispa 26.Refulgir 27.Correr 28.Raio 29.Pererecando 30. Brasa 31. Relampear 32.Dardejar 33. Fulgurar 34.Brilhar 35. Relampejar 36.Resplendor 37.Chispar 38.Revérbero 39.Respingar 40.Tremor 41.Tremelique 42.Fuzilar 43.Faúla 44.Coruscar 45.Lampejar 46. Faiscante 47.Chamejar 48.Centelhar 49.Fagulhar 50. Coriscar 51.Rebrilhar 52.Faular 53.Faulhar. Fonte: Dicionário Informal. (2015).

Faremos essas analogias através do recurso da metáfora. O uso de analogias e metáforas como recurso didático é uma possibilidade de ampliar a oferta de conhecimentos científicos de forma que se permita a interação com os conhecimentos prévios do público alvo do discurso. Japiassu; Marcondes (2001, p. 129-130) em seu Dicionário Básico de Filosofia afirmam que, metáfora representa transposição, transgressão, é uma “Figura de retórica pela qual se faz uma comparação, utilizando-se uma palavra que denota uma coisa para representar uma qualidade definidora de outra‖. Segundo a definição de Aristóteles, a metáfora é uma "palavra usada com um sentido alterado", como exemplo: uma raposa política; uma flor de pessoa; um mar de lama no palácio. (JAPIASSU; MARCONDES, 2001, p. 129-130). Metáfora (metaphora) é um termo que, no latim, ―meta‖ significa ―algo‖ e ―phora‖ representa ―sem sentido‖. Foi traduzida do grego onde metaphorá é mudança. É uma comparação abreviada em que o verbo não está expresso, mas subentendido. Por exemplo, dizer que tal pessoa foi e voltou como uma faísca significa uma pessoa rápida. Encontrou a solução numa faísca dos neurônios, representa que o citado teve um insight, um lampejo, foi brilhante, inteligente. Em outros termos, metáfora é uma figura de linguagem que produz sentidos figurados por meio de comparações implícitas. Ela pode dar duplo sentido à frase com a ausência de uma conjunção comparativa. Dentre as abordagens mais antigas

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sobre a teoria da metáfora, destaca-se a de Aristóteles, tanto que sua conceituação e classificação atravessaram milênios, e ainda hoje é referência. Aristóteles inclui a metáfora nas obras intituladas ―Retórica‖ e ―Poética‖, em que o uso da metáfora está ligado, como todo o discurso, a um efeito persuasivo. Na verdade, todos falam por meio de metáforas e de palavras no seu sentido ―próprio‖ e ―apropriado‖, o que deste modo demonstra que, ao se compor corretamente, o texto resultará algo de não familiar, mas, ao mesmo tempo, será possível dissimulá-lo e resultar claro. Sobre a clareza da metáfora (e também seu exotismo), Aristóteles diz: ―É, sobretudo, a metáfora que possui clareza, agradabilidade e exotismo, e ela não pode ser extraída de nenhum outro autor‖. (ARISTÓTELES, 2005, p. 98). Este certo afastamento nos interessa, na medida em que traduz não somente as semelhanças que geram uma metáfora, mas também as dessemelhanças, as disparidades. Onde Aristóteles via a disparidade, ele via o risco. Mas via também o êxito: Uma aprendizagem fácil é, por natureza, agradável a todos; por seu turno, as palavras têm determinado significado, de tal forma que as mais agradáveis são todas as palavras que nos são desconhecidas, embora as conheçamos no seu sentido ―apropriado‖; mas é, sobretudo a metáfora que provoca tal. (ARISTÓTELES, 2005, p. 115)

Vemos neste trecho o que Aristóteles chamou de “aprendizagem agradável‖ e de ―aprendizagem mais agradável”, esta última engendrada pela metáfora. Ela seria mais agradável porque nós conheceríamos o significado do conceito e ao mesmo tempo desconheceríamos. Daí também, seu caráter de enigma, suscitado neste trecho: “É, com efeito, a partir de bons enigmas que se constituem geralmente metáforas apropriadas‖. (ARISTÓTELES, 2005, p. 100). Acreditamos ser oportuno apresentar aqui a metáfora do quebra-cabeça na construção do conhecimento. Como pesquisador na elaboração dessa tese, buscamos um conjunto de textos, artigos, livros, sites, filmes, depoimentos, etc. Consideramos que cada elemento pesquisado equivale a um quebra-cabeça montado pelo(s) seu(s) autor(es). Quando iniciamos a pesquisa desses materiais esses diversos quebra-cabeças estão montados, mas dentro da lógica de seu(s) autor(es).

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Na medida, que tomamos contato, sentindo sua textura, seus desenhos e encaixes, entendendo a lógica de sua construção, resolvemos desmontá-lo, mesmo que parcialmente e remontá-lo, para testar nossos domínios. Quando conseguimos nos sentimos aptos a fazer certas afirmações sobre nosso entendimento da lógica do(s) autor(es) sobre determinado assunto. Para a construção de nosso trabalho, nosso quebra-cabeça, usamos peças de diversos quebra-cabeças, de uns apartamos mais peças e de outros, menos peças, até construirmos o nosso dentro da nossa lógica. Todo conhecimento para ser compreendido, precisa ser desconstruído e reconstruído, para assim, entendermos a lógica de seu idealizador.

I.4 – “Uma faísca11 pode incendiar toda a pradaria”12 (TUNG; Mao, T.13, 05/01/1930) Após a introdução metodológica, lançamos mão do título da carta escrita por Mao Tse Tung ao Partido Comunista da China em 1930 para iniciar nossa história. Pode parecer estranho, mas é extremamente oportuno. Em meados dos anos setenta, mais precisamente fevereiro de 1975, inicio na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) o curso de Ciências Econômicas. Pouco dinheiro e muitos sonhos. Afinal, naquela época, era raro o filho de um balconista e de uma empregada doméstica frequentar uma universidade particular. Iniciávamos a realização de um sonho, como o de muitos jovens: entrar na universidade. A opção foi fazer ciências econômicas, pois, naquele período os economistas eram vistos como a elite dos pensadores. Detinham a capacidade de analisar o todo e apresentar soluções para o desenvolvimento do país e suas diversas regiões. Diversos economistas ocupavam vasto espaço na mídia, exerciam 11

Faísca: Fragmento luminoso que se desprende de um corpo em brasa ou resultante do atrito de dois corpos; chispa, fagulha, centelha. Incendiário. Esse termo, como diversos outros, tem sido utilizado propositadamente dentro da perspectiva do recurso metafórico. DICIONÁRIO INFORMAL [Faísca]. Disponível em: . Acesso em: 10 out. 2015. 12 Uma faísca pode incendiar toda a pradaria: Título de uma carta escrita por Mao Tse Tung, em 05 de janeiro de 1930 com o objetivo de criticar certas tendências pessimistas que então existiam no Partido Comunista da China (fundado em julho de 1921). (MARXISTS, 01 jun. 2016). 13 Mao Tse Tung: (1893 –

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cargos públicos e muitos eram convidados a concorrer ao legislativo em seus diversos níveis. Os economistas estavam em evidência, afinal vivíamos o chamado Milagre Econômico14. As faculdades de economia proliferavam numa proporção semelhante ao que ocorreu nos anos 1990 com os cursos de administração. Escolhemos a Faculdade de Economia e Administração da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo FEA PUC-SP - por um olhar estratégico que me fez considerar a qualidade de ensino e proximidade de nossa residência no bairro da Casa Verde, divisa com o Bairro do Limão no município de São Paulo. Muito embora sem ter muita clareza, foi considerada a orientação católica humanista. A PUC, no início dos anos 1970, apesar das limitações da censura à mídia, apresentava-se como uma instituição diferente, questionadora do status quo, como uma referência de qualidade no universo acadêmico e social. Assim também eram referências, nessa época, a Universidade de São Paulo e o Mackenzie. Vivíamos um regime de exceção. O Governo Militar15 que chegou ao poder através do golpe militar de 1º de abril de 1964, concedia aos militares poderes máximos. Mandavam no país usando e abusando de todos os recursos autoritários possíveis. Perseguiam, prendiam, torturavam e matavam16 aqueles que se opunham mais clara e abertamente às suas opiniões e posturas, ao seu poder. De outubro de 1969 a março de 1974, a ditadura vive seu apogeu, no governo do general Emílio Garrastazu Médici. 14

Milagre Econômico é chamado o período de excepcional desenvolvimento econômico entre os anos de 1968 a 1973 (Regime Militar) quando a taxa de crescimento do PIB saltou 9,8% aa para 14% no final desse período, paradoxalmente, foi um período de maior concentração de renda e aumento da pobreza, pois, a inflação disparou de 19,46%, saltando para 35,55% aa. WIKIPEDIA [milagre econômico brasileiro]. Wikipedia. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2016. 15 Governo Militar: responsável pela ditadura militar, que é um governo autoritário, exercido por uma única pessoa ou por um grupo de pessoas a revelia da participação e interesses da maioria da população. Quando esse governo é exercido preponderantemente pelos militares é a sua melhor expressão. WIKIPEDIA [Ditadura militar no Brasil e Regime Militar]. Wikipedia. Disponível em: . Acesso em 01 jun. 2016. 16 Perseguições políticas: Segundo Caderno Especial do Jornal Folha de São Paulo com o título ―O Acerto de Contas‖ publicado em 23 de março de 2014, próximo de completar 50 anos do Golpe Militar, no período de 1º. de abril de 1964 a 1985 ocorreram aproximadamente 25.000 prisões políticas, foram exilados cerca de 10.000, 7.367 processados por crimes políticos na justiça militar e, constam 356 mortos e desaparecidos. UOL FOLHA [Acerto de contas – o golpe e a ditadura militar]. Arte Folha SP UOL. Disponível em: . Acesso em: 01 ago. 2015. Mas para a Comissão da Verdade o número de mortos e desaparecidos é ainda maior chegando a 434, sendo 191 assassinados e 243 desaparecidos. ÚLTIMO SEGUNDO [Comissão da verdade]. Último Segundo. Disponível em: . Acesso em: 01 ago. 2015.

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Nesse período, sob a vigência do Ato Institucional n o517 de 1969, foi nomeado Ministro da Educação e Cultura o Coronel Jarbas Passarinho, famoso por seus posicionamentos em apoio à radicalização do regime de exceção, contrário às liberdades democráticas. Após esse período da história brasileira, assume a presidência o General Ernesto Geisel, entre março de 1974 e março de 1979; fruto de dissidências militares contra o AI-5. Geisel nomeia para Ministro da Educação Ney Braga, que mesmo sendo militar era conhecido por sua oposição ao AI-5. Afinal, o que tudo isso tem a ver com ―Uma faísca pode incendiar a pradaria‖, Odair Soares, a PUC e o governo militar? Uma história de vida deve ser estudada e analisada dentro de um contexto, pois, como afirma Ivani Fazenda (2012, p.75) ela ―é produzida em um determinado espaço e num tempo historicamente determinado. A história atual de uma determinada prática só pode ser revelada em sua complexidade quando investigada em suas origens de tempo e espaço‖ (grifo nosso). Quando entrei18 na PUC sonhava em ter poder para fazer a diferença, e, mudar esse estado de coisas. Porém, era um jovem um pouco tímido, acredito que, por algumas inseguranças. A PUC vivia um período de grandes movimentos internos, havia sido implantado em 1971 o Ciclo Básico de Ciências Humanas e Educação 19 sob a coordenação do professor Casemiro dos Reis Filho. Esse Ciclo Básico foi meu primeiro contato formal acadêmico com a interdisciplinaridade, pois tínhamos um primeiro ano de grande integração entre professores-alunos e alunos-alunos de 17

Ato Institucional nº 5, AI-5, baixado em 13 de dezembro de 1968, durante o governo do general Costa e Silva, foi a expressão mais acabada da ditadura militar brasileira (1964-1985). Vigorou até dezembro de 1978 e produziu um elenco de ações arbitrárias de efeitos duradouros. Definiu o momento mais duro do regime, dando poder de exceção aos governantes para punir arbitrariamente os que fossem inimigos do regime ou como tal considerados. CPDOC FGV [AI 5]. CPDOC FGV. Disponível em: . Acesso em: 30 jul. 2015. 18 Entrei: mudamos propositalmente da primeira pessoa do plural para a primeira do singular nesse trecho, pois, diz respeito estritamente à experiência pessoal do pesquisador como objeto da pesquisa. Assim, todo o texto referente à autobiografia será apresentado em primeira pessoa. 19 Ciclo Básico de Ciências Humanas e Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) foi criado em 1971, implementando a determinação da Reforma Universitária (Lei 5540\68 e Decreto-lei 464\69) que previa a criação de Primeiro Ciclo, o primeiro ano do curso de graduação, para introduzir os alunos na vida universitária. A proposta da PUC-SP significou uma tentativa de se constituir numa ação inovadora, na medida em que incorporava uma preocupação humanista, uma concepção da aprendizagem como processo, assim como a intenção de promover a interdisciplinaridade (FLEURI, 1982, p. 8-13). Procurou-se viabilizar a ―integração disciplinar‖ em nível de alunos,professores e coordenação.Em nível de alunos, esperava-se facilitar a interdisciplinaridade pela formação de turmas de alunos matriculados em diversos cursos. Em nível de professores, a interdisciplinaridade era procurada nas equipes de professores das ―disciplinas comuns‖ ao elaborar os respectivos programas pedagógicos, cuja integração era buscada em nível de coordenação geral, tendo como referência os objetivos gerais do Ciclo Básico. A articulação entre os professores se dava também nas ―interequipes‖, formadas por professores da mesma turma, que se reuniam periodicamente para avaliar conjuntamente o desempenho de seus alunos. (FLEURI, 1982, p. 8-13).

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diversos cursos da área de ciências humanas e educação. A política era algo distante, mas que eu almejava, adorava ler a Revista Veja e Exame na época e absorver tudo o que o noticiário econômico e político permitiam, apesar da censura. Comecei a participar de reuniões do Diretório Acadêmico Leão XIII (DA), sempre com muita curiosidade e admiração dos líderes estudantis que se apresentavam num discurso invariavelmente inflamado contra o status quo. O DA que estava sob intervenção de uma junta de estudantes de economia, administração, contabilidade e atuária nomeada pela reitoria, cumprindo exigências do governo de exceção, resolveu reconquistar sua autonomia cassada pelo poder militar. Assim, eu comecei a participar do movimento estudantil em 1975. Reuníamo-nos no DA Leão XIII e definíamos um conjunto de ações para a conscientização dos alunos a respeito da situação social e política de nosso país. Íamos às salas de aula e com autorização dos professores transmitíamos informações sobre encaminhamentos e conclamávamos alunos e professores a participarem das ações e eventos. Eu, com toda a empolgação, fazia tudo muito rápido, buscando um resultado célere. Foi assim que ganhei o apelido de Faísca. Daí a frase extraída do título da carta de Mao Tse Tung ―Uma faísca pode incendiar toda a pradaria‖. A frase tinha também estreita relação com minha motivação, agitação e o momento conjuntural, específico e geral. Nossas reuniões, que começaram com cinco a dez participantes no ano de 1976, chegaram a variar entre quinhentos e setecentos alunos no primeiro ano e em dois anos atingiram entre dois mil e três mil alunos. E o que foi interessante é que eu, de coadjuvante, passei a ser um dos principais atores na medida em que formulava políticas e dirigia reuniões e assembleias.

I.4.1 – Ingresso no Partido Comunista do Brasil (PCdoB) À época Mao era tido como camarada20, as suas obras eram leitura obrigatória, junto com as de Karl Marx21 e Friedrich Engels22. Vladimir Ilyich Lenin23 e Joseph Stalin24 20

Camarada: muito embora o significado convencional desse termo seja: pessoa que convive com outra; companheiro. Pessoa que tem a mesma profissão que outra. Colega, condiscípulo. Bom sujeito, amigo. O termo carrega uma forte conotação militar. Forte conotação política para setores da militância partidária, sindical e associativa. Usada entre adeptos de uma mesma ideologia, membros de uma associação ou

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constituíam-se exemplos a serem seguidos. Começo a me aproximar das organizações de esquerda, mais especificamente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Em julho de 1977 ingressei nas fileiras desse partido clandestino,

passando a ter uma dupla vida: uma legal com meu nome de registro civil e, outra clandestina com um ―nome de guerra‖ ou codinome25. A entrada para o PCdoB em 1977 transformou minha vida. Passei a ter um relacionamento intenso com o coletivo de militantes e simpatizantes do partido26. Importante reafirmar, no entanto, o partido era clandestino e proibido. Dessa forma a organização interna do partido era composta por militantes com nomes distintos dos nomes do registro civil. A estrutura do partido era hierarquizada: diretório central, estadual ou regional, municipal e as células (base). Meu nome na clandestinidade era Maurício, assumido em homenagem a Maurício Grabois27, camarada do partido morto na Guerrilha do Araguaia28 em 25 de dezembro de 1973. Maurício Grabois foi dirigente do PCdoB, um de seus fundadores

militantes de um partido, assim, assume uma conotação de correligionário ou companheiro. (DIÁRIO LIBERDADE, 01 jun. 2016). 21 Karl Marx: (1818 – 1883) foi um filósofo, sociólogo, jornalista e revolucionário socialista. Nascido na Prússia, ele mais tarde se tornou apátrida e passou grande parte de sua vida em Londres, no Reino Unido. A obra de Marx em economia estabeleceu a base para muito do entendimento atual sobre o trabalho e sua relação com o capital, além do pensamento econômico posterior. Ele publicou vários livros durante sua vida, sendo que O Manifesto Comunista (1848) e O Capital (1867-1894) são os mais proeminentes. (WIKIPEDIA, 15 mai. 2016). 22 Friedrich Engels: (1820 – 1895) foi um teórico revolucionário alemão que junto com Karl Marx fundou o chamado socialismo científico ou marxismo. Ele foi coautor de diversas obras com Marx, sendo que a mais conhecida é o Manifesto Comunista. (WIKIPEDIA, 15 mai. 2016). 23 Vladimir Ilyich Lenin: (1870 – 1924) Vladimir Ilitch Lenin ou Lenine, foi um revolucionário e chefe de Estado russo, responsável em grande parte pela execução da Revolução Russa de 1917, líder do Partido Comunista, e primeiro presidente do Conselho dos Comissários do Povo da União Soviética. Influenciou teoricamente os partidos comunistas de todo o mundo, e suas contribuições resultaram na criação de uma corrente teórica denominada leninismo. (WIKIPEDIA, 15 mai. 2016). 24 Joseph Stalin: (1878 – 1953) Josef Vissarionovitch Stalin, nascido em Gori, Geórgia na Rússia, foi secretáriogeral do Partido Comunista da União Soviética e do Comitê Central a partir de 1922 até a sua morte em 1953, sendo assim o líder da União Soviética. (WIKIPEDIA, 15 mai. 2016). 25 Codinome ou “nome de guerra” designação que serve para ocultar a identidade de alguém ou para nomear de maneira secreta um plano de ação, uma organização etc. 26 Militantes e simpatizantes: os militantes eram aqueles mais engajados na luta política e que militavam numa organização, contribuindo inclusive financeiramente, enquanto que os simpatizantes eram pessoas próximas que comungavam com os ideais total ou parcialmente, mas não participavam da estrutura organizacional do partido. 27 Maurício Grabois: (1912 – 1973) (WIKIPEDIA, 15 mai. 2016). 28 Guerrilha do Araguaia: Movimento guerrilheiro ocorrido no sul do Pará, ao longo do rio Araguaia, entre fins da década de 1960 e a primeira metade da década de 1970. Criada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), tinha por objetivo fomentar uma revolução socialista a partir do campo, já que a repressão do regime militar se concentrava nas regiões urbanas do Brasil. (WIKIPEDIA, [Guerrilha do Araguaia], 15 mai. 2016).

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e um dos principais políticos da esquerda brasileira junto com Luiz Carlos Prestes 29 e Carlos Marighella30. Minha participação em algumas reuniões dos organismos partidários ocorria em dupla com outro companheiro, andando pelas ruas. Por muitas vezes quando essas reuniões se estendiam, cansavam pela caminhada. Esses encontros se davam em grandes quarteirões e os participantes caminhavam em direções opostas até se encontrarem, numa hora pré-agendada e continuavam caminhando juntos, quando então se iniciava a reunião. Esse tipo de reunião exigia uma enorme concentração em sua pauta, para não haver dispersão. Por outro lado, necessitava de atenção redobrada com o que acontecia no entorno, pois, existia a possibilidade concreta de perseguição policial. As reuniões da base (células) eram realizadas em locais públicos com a presença exclusiva de militantes, raramente de simpatizantes. Orientava-se para que essas reuniões não contassem com a presença de mais de oito participantes. A forma de participação em organismos de direção era de reunir um número restrito de participantes, pois, quanto mais alto fosse o nível hierárquico dos participantes, maiores eram as preocupações com a segurança de seus membros. Chegava-se a fazer rodízio dos membros das instâncias mais altas dessa hierarquia – comitês regionais e central. Nesses níveis pouco se sabia um do outro, conheciase o essencial para a realização dos objetivos partidários. A estratégia de transporte e chegada dos participantes nos locais de reunião era uma verdadeira ―loucura‖. Os participantes não podiam saber onde se realizaria a reunião para não ―queimar‖ o local. Assim, eram conduzidos com os olhos fechados em carros reservados para essa operação. Todo esse aparato se manteve até o fim da ditadura militar em 1984, mas é claro que com o passar do tempo foi relaxando, principalmente nos anos 1980, quando o 29

Luiz Carlos Prestes: (1898 – 1990) foi um militar e político comunista brasileiro, uma das personalidades políticas mais influentes no país durante o século XX. Foi secretário-geral do Partido Comunista do Brasil PCB e foi companheiro de Olga Benário, morta na Alemanha Nazista por câmara de gás, após ser entregue àquele regime pelo governo do ditador Getúlio Vargas. Foi eleito um dos 100 maiores brasileiros de todos os tempos, por concurso realizado pelo SBT e pela BBC em 2012. (WIKIPEDIA, [Luiz Carlos Prestes], 15 mai. 2016). 30 Carlos Marighella: (1911 – 1969) foi um político, guerrilheiro e escritor brasileiro, e, a partir de 1964, um dos principais organizadores da luta contra a ditadura militar. Chegou a ser considerado o inimigo "número um" da ditadura. (WIKIPEDIA, [Carlos Marighella], 15 jun. 2016).

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país estava sob a presidência do General João Baptista Figueiredo e, teve o General Golbery do Couto e Silva como Chefe da Casa Civil. Golbery como um grande estrategista especialista em geopolítica brasileira idealizou a estratégia de ―distensão política lenta, gradual e segura‖, que conduziu o país à ―Abertura política‖.

I.4.2 – Sonhos: revisitando e religando vagas lembranças ao presente Sonhar mais um sonho impossível Lutar quando é fácil ceder Vencer o inimigo invencível Negar quando a regra é vender Sofrer a tortura implacável Romper a incabível prisão Voar num limite improvável Tocar o inacessível chão Chico Buarque & Ruy Guerra

As pessoas, em geral, por uma série de circunstâncias acabam tendo esperanças delimitadas pelo status quo. Como diz a letra musicada de Chico Buarque & Ruy Guerra, Sonho Impossível31: Algumas vezes essa mínima esperança se torna o grande desafio de algumas pessoas. Na minha infância, antes da idade escolar acompanhei minha mãe Tereza em seus trabalhos de empregada doméstica. Não tinha ideia das diferenças econômico-sociais e isso não me incomodava, mas me impeliu a brincar sozinho muitas vezes, por falta de amigos na minha faixa etária nas mansões do Jardim Paulista, na capital paulista. Deixei de acompanhar minha mãe quando passei a ir à pré-escola, ficando no contra turno com minhas tias e primos. Sofri muito com uma bronquite asmática que me enclausurava em casa. Era magérrimo, pesava menos de vinte e oito quilos com onze anos. Essa situação de saúde modificou-se radicalmente quando, aos doze anos passei a praticar natação com muita disciplina e amor. Coincidência ou não, um esporte individual. Individual como foi grande parte de minha infância. A bronquite (TERAPIA HOLÍSTICA, 31

Sonho Impossível: “The Impossible Dream” Composição musical: Joe Darion, Mitch Leigh / letra Chico Buarque & Ruy Guerra; 1972, gravada em 1975 pela inesquecível interpretação de Maria Bethânia. (JOBIM.ORG [Sonho Impossível], 01 jun. 2016). Essa letra parece ter se apoiado em Miguel de Cervantes em sua magnífica obra Dom Quixote onde escreve: "Sonhar o sonho impossível,/ Sofrer a angústia implacável, / Pisar onde os bravos não ousam, / Reparar o mal irreparável, / Amar um amor casto à distância, / Enfrentar o inimigo invencível, / Tentar quando as forças se esvaem, / Alcançar a estrela inatingível: Essa é a minha busca". (ROINESXXI, [Cervantes], 01 jun. 2016).

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[Bronquite], 04 ago. 2015) é vista numa perspectiva holística como expressão da existência de uma emoção reprimida e a necessidade de que esse núcleo afetivo contido possa ser expulso, já que prejudica a pessoa em seu mundo interno. Dito e feito: quando adquiri mais independência e autonomia, a bronquite sumiu e eu engordei um pouco. Importante destacar que mesmo não sendo uma criança que brincasse direto na rua, não foi por falta de oportunidade, pois meus pais permitiam e meus amigos insistiam. Apesar desse certo distanciamento físico dos amigos nas ruas, eles e eu nos entendíamos muito bem, era uma relação de companheirismo muito forte que nos unia. Marcadamente diferente dos primos, dos amigos de escola e os do bairro que, preferiam jogar futebol, bola de gude e peão, a estudar. Mundos diferentes, mas ao mesmo tempo integrados. Minha relação com meu pai Mário Soares foi marcante. Falecido em 30 de março de 2004, faz ainda muita falta em minha vida suas conversas e ponderações com uma sabedoria da maturidade de quem viveu e observou muito. Ele sempre muito esforçado construiu nossa vida e nossa moradia com muito esforço físico. Eu e ele produzimos, no ano de 1965, os tijolos de bloco em casa. Fizemos isso para economizar e fazer render os parcos recursos. Assim, foi construída nossa moradia no Bairro do Limão, zona noroeste da capital paulista. A vida de muito trabalho de duas pessoas com poucas letras – pai balconista e mãe empregada doméstica - despertou em mim um sonho – ser alguém que fizesse mais, que conquistasse o mundo, que pudesse fazer a diferença contribuindo com a sociedade de maneira que eu fosse o ator principal, se possível. Esse olhar diferente sobre a vida e as coisas, curioso, fez com que eu lesse e estudasse muito. Naturalmente, na juventude sem toda essa clareza. Na adolescência, aos dezessete anos passo no vestibular de Economia da PUC-SP (1974) e um ano depois já participava do Movimento Estudantil (ME). Tive grande participação no ME da PUC-SP sendo presidente do Centro Acadêmico Leão XIII (CA), representando os alunos de economia, administração, contabilidade e atuária, de 1976 a 1979 e, um dos organizadores do Diretório Central dos Estudantes PUCSP (DCE).

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Na primeira eleição, 1977, foi eleita presidente aquela que viria a ser minha esposa, anos mais tarde, Eliandre Martini (Lia), eu fui eleito vice-presidente. A Figura I.1 apresenta a cópia de arquivo do DOPS de alguns personagens que até aqui retratamos. Na 2ª eleição fui eleito o presidente desse 2º mandato do DCE da PUCSP. Na PUC passei a alimentar o sonho de ser político, como se políticos fossem somente os parlamentares. Comecei participando de todo evento novo e diferente: reuniões, encontros estudantis, organizações estudantis, partido político clandestino. Fui recrutado para as fileiras do PCdoB em julho de 1977, em plena mobilização para a reconstrução de nossas entidades estudantis: União Nacional dos Estudantes (UNE), União Estadual dos Estudantes (UEE) e Diretórios Centrais dos Estudantes (DCEs)32. FIGURA I.1 – Ficha do DOPS da composição da 1ª. Diretoria DCE Livre da PUC-SP Chapa vitoriosa “Pé no Chão”

Fonte: Arquivo do estado de São Paulo. (SÃO PAULO, 07 mai. 2016)

Na Figura I.2 e I.3 é possível verificar o meu nome e de outras lideranças no processo de reorganização do Movimento Estudantil. Entre elas o nome do

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UNE – União Nacional dos Estudantes, UEE – União Estadual dos Estudantes e DCE‘s – Diretórios Centrais de Estudantes todos proibidos e cassados pelo regime militar e proibidos explicitamente pelo AI-5.

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Deputado Federal Arnaldo Jardim33 que é o atual Secretário da Agricultura do Estado de São Paulo; Marcelo Barbieri34 prefeito reeleito de Araraquara interior de São Paulo. FIGURA I.2 35 – Capa Relatório do DOPS de maio/1979 sobre ME.

Fonte: Arquivo do estado de São Paulo. (capa)

Como expus na introdução desta tese, adquiri o apelido de Faísca no ME. Era assim conhecido pelos companheiros, ninguém me conhecia pelo nome. Quando da bárbara invasão da PUC-SP em 22 de setembro de 1977, fui um dos procurados na invasão, mas, por coincidências do destino não me encontrava no Campus Monte

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Arnaldo Jardim: Arnaldo Calil Pereira Jardim (1955 - ) é deputado federal por São Paulo eleito nas eleições de 2014 pelo Partido Popular Socialista (PPS). (SÃO PAULO, 15 mai. 2016). 34 Marcelo Barbieri: Marcelo Fortes Barbieri (1956 - ) Natural de Araraquara, Marcelo Barbieri, se envolveu na política através do movimento estudantil em 1975 filiando-se ao então MDB (PMDB).Entrou para a vida pública em 1990 quando disputou pela primeira o cargo de Deputado Federal, pelo estado de São Paulo, se elegendo nesta e em mais duas ocasiões (1994/1998) ficou na câmara federal até o começo do ano de 2003. (WIKIPEDIA, [Marcelo Barbieri], 15 mai. 2016). 35 Capa Relatório do DOPS de maio/1979 intitulado: UNE ―Movimento Estudantil de Reestruturação‖ produzido pelo Setor de Análise, Operações e Informações com colaboração do DOI – CODI – II Exército. SÃO PAULO, 07 mai. 2016).

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Alegre naquela oportunidade. Fui convocado para depor na Polícia Federal como Faísca – apelido dado pelos colegas do ME. O objetivo deles era me incriminar como um dos responsáveis pela subversão da ordem, incitador dos estudantes e da população contra o poder militar. Meu objetivo era sem negar totalmente minha participação, pois, eles dispunham de diversas provas, buscar caracterizá-la de uma forma menos hostil, mais branda como luta pela democracia.

FIGURA I.3 36 – Página 5 do Relatório do DOPS de maio/1979 sobre atuação de Odair Soares no ME.

Fonte: Arquivo do estado de São Paulo. (SÃO PAULO, 07 mai. 2016, p. 5).

Naquela oportunidade ser democrata não era crime, ou pelo menos crime passível de prisão. O delegado da Polícia Federal perguntou num determinado momento de seu interrogatório se eu não tinha medo. Respondi a ele ―corajosamente‖, entretanto com medo que, ―quem não deve não teme‖. Depois de quatro horas entre

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Odair Silva Soares (―Faísca‖) como participante identificado da comissão executiva do Pró-UNE. (SÃO PAULO, 07 mai. 2016, p. 5).

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interrogatórios e esperas sentado em um desconfortável e duro banco, cumprindo um castigo, liberaram-me, sem fichamento. Saí da Delegacia de Polícia Federal feliz em ter podido cumprir com meu papel de democrata, na luta pelas liberdades políticas que temos hoje. O sonho de fazer a diferença tem se realizado, mas muitos daqueles que mantiveram a posição de poder a todo o custo em nome de um ideal, infelizmente se perderam em conquistas mesquinhas, locupletando-se com o poder. Enfim, tudo isso faz parte do aprendizado da humanidade, particularmente de nós, brasileiros, e especificamente do meu. O movimento estudantil dos anos 1970 foi muito importante, mas as greves dos trabalhadores a partir da grande greve dos metalúrgicos do ABC paulista 37 em abril de 1980 foram determinantes na ampliação da luta por liberdades. Outros setores além do estudantil despertaram para essa luta, e os trabalhadores começaram a se mobilizar, por melhores salários inicialmente e, em seguida por liberdades políticas e pelo fim do regime militar. O partido era regido por um centralismo democrático, que significava a tomada de decisões pelas instâncias superiores, e o cumprimento dessas deliberações pela base partidária. O que garantia a aplicação dessas decisões era a chamada unidade democrática, e o forte compromisso e confiança existentes internamente, além do foco concentrado na luta por conquistar as liberdades democráticas. Assim, ocorreu minha transferência do movimento estudantil para o movimento sindical no início de 1981. Minha atuação se ampliou do ponto de vista da abrangência e importância, em relação ao movimento político e social. Passava a ter uma intervenção mais relevante.

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Região do ABC: ABC Paulista, Região do Grande ABC, ABC ou ainda ABCD, é uma região tradicionalmente industrial do estado de São Paulo, parte da Região Metropolitana de São Paulo, porém com identidade própria. A sigla vem das quatro cidades, que originalmente formavam a região, sendo: Santo André (A), São Bernardo do Campo (B) e São Caetano do Sul (C) - Diadema (D) é às vezes incluída na sigla. É relativamente comum encontrar também ABCDMRR que também inclui os municípios de Ribeirão Pires, Mauá e Rio Grande da Serra. (WIKIPEDIA, [Região do Grande ABC], 04 abr. 2016).

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I.4.3 – Sonhos: autonomia e liberdade como uma postura interdisciplinar Fui bancário pelo Banco Mercantil de São Paulo38 por vinte meses, até o mês de abril de 1981, quando ingressei por concurso no Banco do Brasil (BB) ocorrido em 1980. Como militante do PCdoB, resolvemos em 1981, pela minha transferência na ação política antes no Movimento Estudantil (ME) agora para o movimento sindical. Eu era ainda funcionário do Banco Mercantil, instituição conhecida pela sua truculência ao tratar de assuntos sindicais, quando comecei a participar de reuniões no Sindicato dos Bancários. Passei a dirigir uma célula de militantes do PCdoB bancários. O apelido de Faísca transferiu-se do ME para o movimento sindical. Como passei a ter estabilidade no emprego por ser funcionário concursado do BB, apresentava-me aberta e publicamente como sindicalista. Escrevia para diversos periódicos. Num deles, a Folha Bancária, publiquei um artigo muito polêmico em relação à disputa presidencial entre Tancredo Neves e Paulo Maluf em 1984 sob o título ―Quem não Tancreda, Malufa‖. (FOLHA BANCÁRIA, 06 mai. 2016). Fui protagonista na organização e a deflagração da 1ª greve de vinte e quatro horas dos bancários do Banco do Brasil ocorrida em fevereiro de 1985. Ocorreu em sua preparação a ―Feira da Miséria dos funcionários do Banco do Brasil‖, com o objetivo de denunciar à população a situação de arrocho salarial em que se encontravam os funcionários do BB. Além disso, de mãos dadas, todos nós presentes no ato demos um abraço simbólico no prédio do Centro de Processamento de Dados do BB (CESEC) em Santo Amaro na zona sul de São Paulo. Fui autor e defensor de tais propostas e encaminhamentos, tendo sido apresentadas em assembleia e reuniões dos funcionários no galpão conhecido como ―quadra dos bancários‖.

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Banco Mercantil de São Paulo: foi um banco brasileiro com sede na cidade de São Paulo fundado por Gastão Vidigal (São Paulo, 15 de maio de 1889 — 14 de novembro de 1950). Sob a direção de seu filho, Gastão Eduardo de Bueno Vidigal, chegou a ser um dos maiores bancos privados do Brasil nos anos 1960. Por volta do fim dos anos 1990 o banco tinha um patrimônio muito grande, mas contava com poucos ativos e, por esse motivo, também emprestava pouco. Foi vendido em 2002 ao Bradesco após a morte de Gastão Eduardo de Bueno Vidigal. (WIKIPEDIA, [Banco Mercantil de São Paulo], 01 jun. 2016).

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Em processo de enfraquecimento, o Regime Militar ainda mantinha informantes infiltrados nos movimentos, que transmitiam informações sobre a atividade dos ditos ―subversivos‖ aos órgãos de segurança. Na Figura I.4 vemos uma ficha do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) disponível ao público nos arquivos do Estado de São Paulo. Podemos observar meu nome completo: Odair Silva Soares, Vulgo: ―FAÍSCA‖ e duas datas marcantes - 08 de julho de 1983, tratando de um panfleto assinado por mim, que distribuí no BB em outubro de 1986, e outro, sobre minha candidatura a Deputado Federal Constituinte. O curioso é que anos mais tarde, descobri a autoria dessa delação, pelo próprio delator numa mesa de bar, o funcionário Derval Fattore supervisor de segurança do Banco do Brasil. Curiosíssimo foi descobrir em minha pesquisa para essa tese que Derval Fattore foi presidente do PCdoB de Itanhaém, cidade do litoral paulista em 2011, onde reside. FIGURA I.4 – Ficha de Odair Soares nos arquivos do DOPS sobre atuação sindical de Odair Soares.

Fonte: Arquivo do Estado de São Paulo. (SÃO PAULO, 07 mai. 2016).

Em 1986 ocorreu outra grande greve dos bancários e eu como líder do movimento apoiava da melhor forma possível, participando de diversas atividades da Campanha Salarial. Num desses momentos fui capturado pelas lentes do fotógrafo Homero Sérgio da Folha de São Paulo em 11 de setembro e, publicada no Sábado, 13 de setembro de 1986 na capa do Caderno de Economia, conforme Figura I.5 39, recorte da capa do Caderno de Economia do jornal Folha de São Paulo e, Figura I.6 com a

39

FUCHS; FRANÇA; PINHEIRO, 2013, p. 245, orientando sobre citação de matéria de jornal sem indicação de autoria.

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foto original publicada, retratando o momento em que eu discursava aos grevistas em frente ao Banco Itaú da Rua Boa Vista, centro da capital paulista. FIGURA I.5 – Cópia da Capa do Caderno de Economia tratando da greve da categoria bancária

Fonte: Caderno de Economia – Folha de São Paulo 13/09/1986. (BANCOS, Folha de SP, 13 set 1986).

FIGURA I.6 – Foto da Capa do Caderno de Economia tratando da greve da categoria em setembro/1986. Em destaque Odair Soares no canto superior esquerdo.

40

Fonte: Folhapress. 11/09/1986. Fotógrafo: Homero Sérgio. (SÉRGIO, 1986) . 40

FUCHS; FRANÇA; PINHEIRO, 2013, p. 254, tratando de referências a documentos iconográficos (foto).

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Na foto e em seu destaque estou sobre o caminhão de som do Sindicato dos bancários de SP, discursando e comandando a greve da categoria no dia 11 de setembro de 1986. Essa se configurou como uma das maiores greves da categoria bancária já realizada no país. Em função dessa evidência que eu vinha obtendo no movimento sindical, o PCdoB entendeu que eu deveria me candidatar a Deputado Federal nas eleições de novembro de 1986, para a Constituinte de 1988. Fiz uma campanha paupérrima, com recursos captados e investidos em torno de trinta mil reais. Aprendi muito com a experiência, porém o desgaste foi grande. Segundo informações do partido, obtive em torno de dois mil e quinhentos votos tendo perdido muitos votos pelo fato de atrelar meu nome ao apelido Faísca, pelo qual eu era mais conhecido. Meu nome como candidato foi Odair Soares – Faísca. Em diversas zonas eleitorais o voto em Faísca foi considerado como voto nulo. Mas, ninguém dos potenciais eleitores me conhecia pelo nome só pelo apelido. Após as eleições de 1986, tendo militado incondicionalmente pelo partido por nove anos, decidi me desligar, pois minha evolução no que diz respeito ao desenvolvimento pessoal, individual e familiar se tornou incompatível com a visão do PCdoB. Entretanto, desliguei-me só recentemente, em outubro de 2015, efetiva e formalmente, quando descobri que meu nome ainda constava no Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE SP) como filiado ao PCdoB. A partir daí, resolvi empenhar-me numa promoção no BB, porém me sentia perseguido pelos superiores por minha intensa militância. Fui orientado por alguns chefes simpáticos às minhas posições, pois viam em mim um defensor dos interesses da maioria, a pedir transferência para outra unidade. Nessa nova unidade fui promovido sucessivamente, mesmo sendo ainda um militante sindical. Estava menos radical, até mesmo pelo fato de não mais militar no cotidiano do PCdoB. Ao mesmo tempo comecei com Eliandre Martini (Lia), minha esposa, a estudar alternativas de aumentar nossos ganhos. Começava assim a se manifestar em minha vida mais claramente, o intraempreendedorismo ou o empreendedorismo corporativo.

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I.4.4 – Articulações interdisciplinares na política Nessa intensa trajetória militante no movimento estudantil, sindical e político convivemos com conhecidos senhores públicos. O Ministro da Defesa (out/2015) Aldo Rebelo, nos anos 1980, enquanto presidente da UNE almoçou por diversas oportunidades em minha residência. O atual (out/2015) Ministro-Chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, Sr. Ricardo Berzoini com quem tivemos diversas dissensões diretas na luta sindical bancária, privo-me de comentar os detalhes sórdidos dessas disputas. O ministro da Justiça (out/2015) José Eduardo Cardozo foi dirigente do CA 22 de Agosto de Direito, tivemos algumas alianças e embates no movimento estudantil. O Chefe da Casa Civil (out/2015) do atual governador de São Paulo Geraldo Alckmin, Edson Aparecido dos Santos, estudante de história da PUC-SP nos anos 1970 foi inclusive militante do PCdoB, da base PUC-SP, tendo composto a primeira diretoria do Diretório Central dos Estudantes da PUC-SP (DCE) – ver Figura I.1 apresentada anteriormente – desenvolvemos muitas atividades estudantis e partidárias conjuntamente. Revisitando esse cenário político percebemos muitas contradições, discursos e práticas totalmente destoantes. Palavras para o povo e práticas voltadas para a defesa de interesses pessoais. O poder que almejava era totalmente diferente desse que parece ser o objetivo de muitos. Como cidadão ativo que sempre fui, muito difícil é não me abalar com o quadro político que temos presenciado no cenário nacional, bem como no estadual, regional e municipal. Causa-me repulsa, principalmente quando vejo alguns políticos buscando se locupletar, esquecendo os ideais pelos quais foram eleitos ou nomeados, e diziam lutar durante anos. Fui um militante profissional por ideologia, não por remuneração, até por que não recebia. Essa disciplina por ideologia me forjou como profissional. Profissional compromissado com a causa, e respeitoso com os demais companheiros de luta; no meu caso particularmente, inclusive, com os companheiros de outras organizações políticas. Sempre procurei manter as divergências políticas na esfera do embate

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político e nunca na esfera do relacionamento pessoal e social. Talvez esse meu perfil já apontasse minha postura interdisciplinar.

I.5 – Teorias que se entrelaçam na rede do saber Há aproximadamente vinte e um anos tomei contato com termos e ideias como empreendedorismo, empreendedor e intraempreendedor por meio de cursos que participei, ao me desligar do BB, mais especificamente no EMPRETEC 41. Posteriormente, há uns dezesseis anos, no processo de elaboração da minha dissertação de mestrado, reforcei o conhecimento no campo do empreendedorismo, através dos diversos textos de Louis Jacques Filion, considerado por alguns como um empreendedor acadêmico. O início do nosso século foi extremamente instigante, intelectualmente falando, em relação a empreendedorismo e administração. Defendi, em 2002, minha dissertação de mestrado com o título ―Visão Empreendedora: um estudo sobre a influência na micro e pequena empresa‖ no programa de administração apoiado em obras de Louis Jacques Filion, Fernando Dolabela e Peter Drucker. Fernando Dolabela, o pioneiro na abordagem pedagógica do empreendedorismo, com importantes colaborações, através de suas obras pilares O Segredo de Luísa, Pedagogia Empreendedora e Oficina do Empreendedor, tem dado enorme contribuição à área, apresentando-nos diversas outras obras nas quais nos apoiaremos no decorrer de nossa tese. As leituras do último livro produzido por Peter Drucker no final do Século XX, Desafios Gerenciais Para o Século XXI (1999) onde ele critica fortemente a visão cartesiana na administração dos executivos das organizações, inadequada com o paradigma42 da Sociedade do Conhecimento43 que vivemos.

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EMPRETEC: workshop para o autoconhecimento empreendedor, com uma metodologia da Organização das Nações Unidas - ONU voltada para o desenvolvimento de características de comportamento empreendedor e para a identificação de novas oportunidades de negócios, promovido em cerca de 34 países. No Brasil, o Empretec é realizado exclusivamente pelo Sebrae e já capacitou cerca de 215 mil pessoas, em 9.100 turmas distribuídas pelos 27 Estados da Federação. Todo ano, o Empretec capacita em torno de 10 mil participantes. (EMPRETEC SEBRAE, 01 set. 2015). 42 Paradigma: (grego paradeigma) (1) Segundo Platão, as *formas ou *idéias são paradigmas, ou seja, arquétipos, modelos perfeitos, eternos imutáveis dos objetos existentes no mundo natural que são cópias desses modelos, e que de algum modo participam deles. As noções de paradigma e de participação, ou seja

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Outros termos foram surgindo com muita força, nos últimos dez anos, e têm me chamado muito a atenção: patologia do saber, doença do pensamento, inteligência cega, pensamento complexo44, tratados por Edgar Morin45. Bem como através das reflexões do professor Humberto Mariotti46 em reuniões de professores, grupos de estudo e fórum da Business School São Paulo – BSP, escola de executivos, onde ministrei algumas aulas de empreendedorismo como professor convidado. Mariotti trata melhor seus pensamentos em seu livro Pensamento Complexo (2007), voltado para a aplicação nas organizações, com foco na liderança, lançado posteriormente as nossas reuniões na BSP. Nas obras do filósofo e educador Edgar Morin, Introdução ao Pensamento Complexo (2011) e em O Método 3: O conhecimento do conhecimento (2012a), encontramos base para o aprofundamento em nossos estudos. Nos últimos quatro anos, tomei contato com o discurso e a prática da interdisciplinaridade, através do Grupo de Estudos e Pesquisa em Interdisciplinaridade (GEPI) e pela minha orientadora, reconhecida nacional e internacionalmente por seu trabalho na área, Profa. Dra. Ivani Fazenda e suas obras, especificamente por Interdisciplinaridade: História Teoria e Pesquisa (2012), Integração e Interdisciplinaridade no Ensino Brasileiro (2011a) e, Didática e Interdisciplinaridade (2011b).

da relação entre o modelo e a cópia, levam, no entanto, a vários impasses que são discutidos por Platão sobretudo no diálogo Parménides (128-134). (2) O filósofo da ciência Thomas Kuhn utiliza o termo em sua análise do processo de formação e transformação das teorias científicas — da "revolução" na ciência — considerando que "alguns exemplos aceitos na prática científica real — exemplos que incluem, ao mesmo tempo, lei, teoria, aplicação e instrumentação — proporcionam modelos dos quais surgem as tradições coerentes e específicas da pesquisa científica" (A estrutura das revoluções científicas). Esses modelos são os paradigmas, p. ex. a astronomia copernicana, a mecânica de Galileu, a mecânica quântica etc. Assim, "um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em indivíduos que partilham um paradigma" (id.). (JAPIASSU; MARCONDES; 2001, p. 147) 43 Sociedade do Conhecimento: paradigma que vem suplantando a Sociedade Industrial, origina-se com a revolução da informação, ocorrida nos anos 40/50 (Século XX); principais características: mudanças/rupturas, autonomia, Empowerment, agilidade. Valores: criatividade, iniciativa e improviso. Foco na Inovação. (SOARES, 2002, p. 2 a 7). 44 Patologia do saber, doença do pensamento, inteligência cega, pensamento complexo: termos comuns na discussão sobre o Pensamento Complexo abordados nas obras sobre o assunto de Edgar Morin e Humberto Mariotti. Abordamos mais pormenorizadamente esses termos no Capítulo 4. 45 Edgar Morin: (1921 – ) nasceu em Paris, formou-se em história, geografia e direito, migrou para a filosofia, a sociologia e a epistemologia, depois de ter participado da resistência ao nazismo na França ocupada, durante a Segunda Guerra Mundial. (MORIN, 2011, aba posterior) 46 Humberto Mariotti: (1941 – ) é escritor, médico psicoterapeuta, ensaísta e filósofo. Professor, autor dos livros: Pensamento Complexo e Organizações de Aprendizagem: educação continuada e a empresa do futuro, publicado pela Atlas; e As Paixões e o Ego pela Palas Athena. Coordenador do Centro de Desenvolvimento de Lideranças da Business School São Paulo (BSP) e pesquisador nas áreas de pensamento sistêmico, complexidade e ciência cognitiva. (WIKIPEDIA, [Humberto Mariotti], 01 jun. 2016).

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Articulamos47 os termos administração, interdisciplinaridade, e empreendedorismo estudando um pouco sobre epistemologia em Hilton Japiassu, saudoso filósofo falecido em abril de 2015, por intermédio de A Crise das Ciências Sociais (2012), Interdisciplinaridade e Patologia do Saber (1976) e Introdução à Epistemologia da Psicologia (2001). Trataremos, portanto, neste trabalho, de três áreas epistemológicas: administração, empreendedorismo e interdisciplinaridade, tomando como base algumas obras elucidativas. Veremos a seguir a organização dessa articulação na tese. Muito embora

esses

termos

estejam

intrinsecamente

ligados

e

articulados

epistemologicamente, bem como em relação a minha história de vida, por uma questão didática, daremos destaque a cada um em capítulo específico. Imprescindível esclarecer que devido aos assuntos serem diversificados e, os leitores terem especializações diferentes, decidimos registrar os nomes num índice e esclarecer diversos termos dessa tese, através de notas de rodapé como notas explicativas. (FUCHS; FRANÇA; PINHEIRO, 2013, p. 203). Em relação aos nomes, independente de constarem nas notas de rodapé, por sua importância e em respeito a essas personalidades, independente de ideologia, resolvemos fazer um Índice Onomástico situado entre as Referências e as Notas Explicativas. A nota explicativa no rodapé está relacionada ao primeiro aparecimento do termo, mas, como alguns termos aparecem com o mesmo significado diversas vezes – caso surjam dúvidas sobre o significado de um termo já explicado anteriormente e, o leitor não tenha que ficar ―caçando‖ onde foi que leu a explicação daquele termo – fizemos uma lista em ordem alfabética das notas de rodapé, disponível ao final da tese, após as Referências.

I.6 – Panorama da tese Afinal, existe uma crise instaurada? O que aprendemos há quarenta anos não é mais válido? A educação educou e não educa mais? O ser humano está regredindo

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Articulamos: retomamos aqui o uso da primeira pessoa do plural, finalizando o depoimento autobiográfico inserindo-se na análise e estudo do objeto de pesquisa. Destacamos que em todos os capítulos da tese a proposta foi manter o diálogo entre a teoria e a história de vida.

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em relação aos seus conhecimentos e práticas da administração? Na busca por respostas a essas questões, ou pelo menos, para melhor entendimento de seus fundamentos, foram desenvolvidos alguns estudos e pesquisas que apresentaremos no decorrer de nossa obra. Após termos apresentado o problema, o objetivo e objeto da pesquisa, a metodologia, contextualizado os termos chave e uma apresentação do autor através de sua autobiografia na Introdução; articulado com a teoria e a prática da administração, da interdisciplinaridade e do empreendedorismo, também na abertura do trabalho; apresentamos a estrutura da tese, que está organizada com essa introdução, três capítulos e as conclusões assim distribuídos: O primeiro capítulo, ―Fundamentos e Práticas da Administração‖, iniciamos abordando aspectos históricos e teóricos das bases da administração. Seu desenvolvimento teórico, as escolas numa linha do tempo e com destaque ao modelo japonês de gestão e produção. Em seguida tratamos das práticas da gestão nas micro e pequenas empresas. Aqui reside uma das bases para buscarmos a resposta a nossa pergunta chave. Destacamos a implantação da disciplina de empreendedorismo em cursos de administração no período de 2000 a 2006, como realce na trajetória de Odair Soares como educador empreendedor. O segundo capítulo, ―Bases e Perspectivas do Empreendedorismo‖, apresentamos diversas visões sobre empreendedorismo. Resgatamos as primeiras ideias mais gerais até a formação de um campo específico de estudo e pesquisa. Retratamos a atualidade do empreendedorismo no Brasil e no mundo. Apresentando ao final algumas perspectivas. Na biografia do autor resgatamos em 2005 a experiência de ter organizado jovens empreendedores da Associação Comercial numa caravana a Santa Rita do Sapucaí (MG), demonstrando a importância de um ecossistema empreendedor para o desenvolvimento local e regional; e, posteriormente, em 2006 foram realizadas pesquisas sobre uma das cidades mais empreendedoras do país a ser transformada em livro. No terceiro capítulo intitulado ―Rompendo com a Visão Linear Mecânica e Ingressando na Sociedade do Conhecimento‖, fazemos uma breve retomada histórica, como base para a discussão do pensamento cartesiano e da teoria dos

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sistemas. Apresentamos as principais críticas a essas duas visões. Expomos os dois grandes paradigmas do mundo ocidental a sociedade industrial e a sociedade do conhecimento numa encruzilhada de fortes embates. Essa colisão de paradigmas é tratada ao final, onde o autor expõe sua tese sobre tais conflitos de paradigmas e seus reflexos em nossas vidas e, especificamente na interdisciplinaridade, no empreendedorismo e na administração. No quarto capítulo denominado ―Interdisciplinaridade e Empreendedorismo Numa Abordagem Integradora‖ retratamos o pensamento complexo, como um integrador das diversas visões e pensamentos, buscando sínteses que melhor atendam as necessidades humanas. A interdisciplinaridade é analisada como um instrumento para o aprimoramento da compreensão e ação em suas conexões entre a teoria e a prática e como importante ferramenta para a administração e o empreendedorismo, base para o pensamento complexo. Aqui relatamos a experiência da organização do Núcleo de Empreendedorismo na PUC-SP em 2013. Concluímos o capítulo demonstrando através de um extenso quadro que representa a pesquisa e análise de textos do empreendedorismo, da interdisciplinaridade e do pensamento complexo apontando diversos pontos comuns entre essas áreas epistemológicas, indicando para uma formulação, discurso e práticas muito similares, dando indícios de uma possível conexão para maiores aprofundamentos teóricos. Na última parte da tese, que, ousamos nomeá-la de ―Lampejos Finais‖, após articularmos e tecermos uma rede interdisciplinar apoiados nos fundamentos e práticas da administração, nas bases e perspectivas do empreendedorismo, e no pensamento integrador, chegamos à conclusão que o Século XXI é o século da interdisciplinaridade e do empreendedorismo. Nesses lampejos retomamos as perguntas chave, aquelas que serviram como mote por toda a tese, especialmente a pergunta de partida: ―as práticas e conhecimentos da administração relacionados ao empreendedorismo e interdisciplinaridade estão sintonizados e atendem às exigências das MPEs na sociedade contemporânea?‖ Essa retomada da questão chave nos remete a algumas respostas, outras questões, mas principalmente para a ação interdisciplinar empreendedora.

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Ao final desse percurso da tese considerando que interdisciplinaridade e empreendedorismo é ação, não poderia deixar calar a força empreendedora e apresentamos, portanto, algumas propostas concretas mostrando nossa sintonia entre o pensado e o vivido. É lógica da vida e da tese alinhavar o percurso autobiográfico às reflexões teóricas e práticas. Assim, dentre outras propostas apresentadas,

destacamos

a

criação

de

uma

Universidade

Livre

de

empreendedorismo. Ainda que sejam necessárias articulações políticas, é possível acreditar na materialização desse sonho. Sonhar um sonho possível.

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Capítulo 1 – Fundamentos e Práticas da Administração Cada época produz uma forma de organização adequada ao seu próprio tempo. Alvin Toffler Eu gosto do impossível Porque lá a concorrência é menor. Walt Disney

A administração48 é um campo instigante e chave para o desenvolvimento organizado da humanidade. Envolve um conjunto de conhecimentos, habilidades49, comportamentos e atitudes usados na organização de empreendimentos, no seu posicionamento e direcionamento. Para garantir esse suporte às organizações humanas, ela abrange a relação entre pessoas, e suas atividades que necessitam ser administradas. Atualmente, a administração se encontra numa encruzilhada, confrontando-se com enormes desafios, que envolvem uma evolutiva competição global e local. Uma disparada na demanda por valor e qualidade, por parte de um mercado com consumidores sequiosos por constantes inovações, exigindo das organizações cada vez mais apoio no fator humano e, menos no fator industrial e produtivo. A perspectiva é de extremo acirramento dessas condições numa velocidade nunca vista antes. Olhando para os profissionais administradores, em relação à superação desses desafios crescentes, impõe-se a necessária flexibilidade, pró-atividade, concentrados na qualidade de tudo que realizam, com foco no mercado. Tudo isso, leva a um questionamento sobre a suficiência do modo como as organizações se estruturam e funcionam.

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Administração: a raiz etimológica de ―administração‖ está na palavra latina minus, que significa literalmente ―menos‖. Este termo evoluiu para minor, um superlativo que é traduzido para ―menor‖. Com o tempo, minor se transformou em minister para se referir aos ―servos‖ e ―criados‖. No entanto, mais tarde, a conotação deste termo passou a ser utilizado para ―sacerdotes‖, ―servos de Deus‖ ou ―servos religiosos‖. Esta palavra possuía um sentido de ―desempenhar um cargo importante‖ ou ―servir à uma personalidade importante‖. Em outras palavras, consistia em ―administrar‖ ou ―organizar algo‖. Para somar o sentido de ―desempenho de uma atividade‖, foi anexado o prefixo AD, que significa ―junto‖. Assim sendo, administer – administrar – significa ―servir ou ajudar junto a…‖ (uma instituição, governo, empresa e etc). Após a definição do conceito moderno de administração, o termo entrou para o dicionário da língua portuguesa através do latim administratìo, evoluindo depois para amenistraçom e aministraçon (século XIV). A palavra chegou à grafia atual – administração – apenas a partir do século XV. (DICIONÁRIO ETIMOLÓGICO [Administração], 15 jun. 2016). 49 Habilidades: são as destrezas específicas para transformar conhecimento em ação que resulte no desempenho desejado para alcance dos objetivos organizacionais. (SILVA; 2013, p. 13).

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Primeiramente, cabe esclarecermos epistemologicamente o que vem a ser uma organização. No dicionário encontramos quatro sentidos da palavra: ordem (arranjo, sistematização, disciplina, etc.), coordenação (administração, gestão, preparo, etc.), associação (corporação, sociedade, coletividade, etc.) e estrutura corporal dos seres vivos (corpo, compleição, constituição, etc.). (SINÔNIMOS [Organização], 03 mai. 2016). Olhando especificamente para os objetivos desse trabalho, podemos afirmar que organização ocorre quando duas ou mais pessoas se unem com o desejo de cooperar para alcançar um objetivo comum. Portanto, o homem lança mão de organização desde seus primórdios. Claro que sem a complexidade que diversas organizações atingiram na atualidade.

1.1 – Fundamentos da administração Para que possamos entender a evolução da administração, uma série de conceitos e definições precisam ser apresentados, além de necessitarmos desenvolver uma abordagem histórica para compreendermos o significado da frase de Alvin Toffler ―Cada época produz uma forma de organização adequada ao seu próprio tempo‖ em destaque no início desse capítulo. A priori pode dizer que temos fortes indicativos que a administração organizacional é fortemente reativa às necessidades de respostas práticas ao seu cotidiano, como veremos a seguir.

1.1.1 – Visão geral da administração Para Silva (2013, p. 6) ―Administração é um conjunto de atividades dirigidas à utilização eficiente50 e eficaz51 dos recursos, no sentido de alcançar um ou mais objetivos ou metas52 da organização‖. Três elementos distintos merecem destaque nessa definição: O trabalho administrativo representa ação, exigindo: observação, audição, comunicação verbal e escrita, leitura, reflexão e projeção. Administrar exige uso eficiente dos recursos materiais (máquinas, equipamentos, financeiros, 50

Eficiente: ligado aos meios, aos recursos, aos caminhos. Aquele que usa os recursos de forma parcimoniosa, equilibrada. 51 Eficaz: ligada aos fins, aos objetivos finais. Aquele que atinge os objetivos a contento. 52 Metas: Objetivos quantificáveis, mensuráveis. Exemplo meta de produção acadêmica: produzir 1 artigo por ano e defender a tese em 24 meses após iniciado o doutorado.

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humanos, etc.), além dos imateriais (tempo, informacionais, conhecimentos, tecnologia, potencialidades humanas, etc.). Por último, eficácia em relação aos objetivos e, especificamente com as metas que constituem um dos aspectos mais importantes da profissão. A administração é considerada por alguns como ciência, outros a tratam como arte e, outros ainda como uma profissão. Entendendo a ciência como um corpo sistematizado de conhecimento, baseado em certos princípios capazes de aplicação generalizada, a administração acaba sendo ciência pelo uso de metodologia científica, análise, pesquisas, generalizações. Para Maximiano (2015a, p.6) ―eventos são observados primeiro, fatos são estabelecidos, e a precisão desses fatos é verificada por meio de observação contínua‖. No entanto, a administração nunca poderia ser uma ciência exata porque os negócios são altamente dinâmicos e suas condições mudam continuamente. (MAXIMIANO, 2015a, p. 7) Como arte a argumentação de Amaru Maximiano (2015a, p. 7) é de que a administração é uma arte quando impõe ordem ao caos. Os princípios da administração não são desenvolvidos em função do conhecimento em si, mas pela prática específica, muitas vezes empiricamente, assim, o feeling acaba sendo chave. Da mesma forma que as habilidades artísticas podem ser conquistadas e aprimoradas através do treinamento, as habilidades administrativas também. Administrador profissional tem sido um termo recorrente em nossos dias. Demanda do profissional um alto nível de assertividade, clareza de objetivos e firmeza de propósitos. Existindo uma enormidade de ferramentas e técnicas em constante desenvolvimento para transformar a teoria em prática. Diga-se de passagem, o surgimento dos Master Business Administration – MBAs estão relacionados diretamente com essa permanente necessidade das organizações disporem de gestores que resolvam problemas práticos. Por toda a história da administração foram surgindo três visões que se destacaram caracterizando-a: a) uma sucessão de papéis53; b) um conjunto de funções; c) aplicação de habilidades específicas. Todas tinham como centro da estudo o administrador, entendendo-as como integradas e interdependentes. A dinâmica do 53

Papéis: são o conjunto de expectativas de comportamento de um indivíduo, em situações específicas. (SILVA; 2013, p.15)

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mercado e da sociedade têm imposto mudanças. Todavia essas abordagens práticas, não foram suficientes para responder as necessidades das organizações. Estudiosos atendendo a essa demanda desenvolvem teorias54. Elas buscam explicar e predizer o comportamento das organizações e seus membros. Teorias surgem de necessidades mais sofisticadas das organizações, mas elas principiam da experiência prática e da observação dos estudiosos constituindo-se nas teorias de configuração55, enquanto que o refinamento da análise conduz ao desenvolvimento de teorias científicas56, fruto de métodos científicos. A junção de práticas e teorias conduz à aquisição da habilidade de administrar, integrando sistematicamente a teoria e prática no processo administrativo. Surgem assim, diferentes apreciações sobre a administração. Segundo Silva (2013, p.4) existem quase tantas perspectivas de administração, quanto livros, publicados tratando do assunto. Partindo de uma ideia básica que ―a administração está relacionada com o alcance de objetivos por meio dos esforços de outras pessoas‖. As diversas definições de administração foram classificadas em cinco categorias57: escola funcional; escola das relações humanas; escola da tomada de decisão; escola de sistemas; escola contingencial. (SILVA, 2013, p.4). Até aqui pudemos demonstrar a imprescindibilidade da administração para as organizações. Não dá para imaginar uma organização, por mais simples e menor que seja sem a prática e o uso de técnicas administrativas. Nisso, destacam-se seus profissionais, os administradores.

54

Teoria: Uma teoria é um conjunto de conceitos e ideias que explica e prediz fenômenos sociais e físicos. (SILVA, 2013, p. 4). 55 Teorias de configuração: desenvolvidas pelos próprios estudiosos ou aprendidas por meio da observação e como resultado das experiências práticas. (SILVA; 2013, p.4). 56 Teorias científicas: A expressão Teoria Científica (ou simplesmente teoria) designa um conjunto articulado de proposições ou sistema de informações usado para explicar e prever determinados acontecimentos e fenômenos no mundo natural. (KNOOW.NET Enciclopédia temática [Teorias científicas], 28 abr. 2016). 57 Classificação das cinco categorias: Escola funcional: ―administração é um processo distinto, que consiste no planejamento, organização, atuação e controle, para determinar e alcançar os objetivos da organização pelo uso de pessoas e recursos‖. (TERRY, George, 1953 apud SILVA; 2013, p. 6); Escola das relações humanas: considera a administração como um processo social. ―Administração é o alcance de resultados por meio dos esforços de outras pessoas‖. (APPLEY, Lawrence, 1956 apud SILVA; 2013, p. 5); Escola da tomada de decisões: Segundo Drucker, ―Administração é simplesmente o processo de tomada de decisão e o controle sobre as ações dos indivíduos, para o expresso propósito de alcance de metas predeterminadas‖. (DRUCKER, 1965 apud SILVA; 2013, p. 5); Escola de sistemas: pela teoria de sistemas, ―as organizações são sistemas orgânicos e abertos, consistindo da interação e interdependência de partes que têm uma variedade de metas‖. (SILVA; 2013, p. 6); e Escola contingencial: a administração é situacional; não existe um modo melhor de projetar organizações e administrá-las. (SILVA; 2013, p. 6)

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Os administradores e a própria gestão não existiriam sem a identificação e aplicação de princípios administrativos58, que não deveriam ser tratados como regras rígidas e inflexíveis

para

o

comportamento

dos

gestores.

Sendo

eles:

dinâmicos,

generalizáveis, relativos, inexatos e universais, isto é, os princípios da administração mudam continuamente. Seres humanos se comportam mais erraticamente que fenômenos físicos; não são leis absolutas; são relacionados ao caos, e buscam trazer ordem a ele. Esses princípios são aplicáveis a negócios, governos, universidades e outras organizações não lucrativas em torno do mundo.

1.1.2 – Administração antes das teorias Nas sociedades primitivas não eram necessárias teorias, pois, bastava ao ser humano empiricamente dar solução aos problemas. Hoje, no entanto, não podemos desperdiçar conhecimentos acumulados pela humanidade, sobre aquilo que serve e não serve em determinadas condições. Assim, surgem teorias da organização que representam modos de ―analisar as organizações de maneira mais precisa e aprofundada do que qualquer outro modo poderia fazê-lo e se baseiam em padrões e regularidades no projeto organizacional e no comportamento‖. (MAXIMIANO, 2015b, p. 43). A administração e as organizações acompanham a humanidade desde suas origens, em todos os ramos de atividade. Com o desenvolvimento humano as diversas civilizações deram importantes contribuições para sua evolução. Citamos as principais como: a Suméria59, o Egito60, a Babilônia61, a China62, a Grécia63 e Roma64. Porém, as primeiras contribuições militares marcaram época.

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Princípio administrativo: ―Um princípio é uma afirmativa básica ou uma verdade fundamental que provê de entendimento e orientação ao pensamento e a prática, na tomada de decisões‖. [no meu entendimento, diferente da visão do reconhecido autor, representam mais características que propriamente princípios] Portanto, eles são: Dinâmicos: estão mudando continuamente; generalizáveis: seres humanos se comportam mais erraticamente que fenômenos físicos; relativos: não se constituem em leis absolutas que possam ser aplicadas em todas as situações; inexatos: a administração é relacionada ao caos e os princípios procuram trazer ordem a ele, regulando o comportamento humano em qualquer situação; universais: a maioria dos princípios administrativos pode ser aplicada em qualquer tipo de organização, são aplicáveis a negócios, governos, universidades e organizações do terceiro setor. (SILVA; 2013, p. 9) 59 Suméria: os mais antigos documento que datam de 5 mil anos atrás, tratando de práticas de controle administrativo. A coleta de tributos realizada por sacerdotes que prestavam contas ao sumo sacerdote. Montaram um verdadeiro sistema tributário. (SILVA; 2013, p. 80) 60 Egito: Entre 2 mil e 3mil a.C. conhecimentos de planejamento, organização e controle foram necessários no processo da construção da pirâmide de Quéops que envolveu trabalho de mais de 100 mil homens, durante vinte anos e foram utilizados mais de 2,3 milhões de blocos, cada um com peso de 2,5 toneladas. (SILVA; 2013, p. 81)

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Exemplificamos com Ciro, líder militar e governante grego (aC) que nos deixou um grande legado baseado num pensamento avançado para sua época. Conhecido criador de estratagemas, sobre planejamento escreveu ―Pondere de noite o que os seus homens farão no dia seguinte e examine de dia como os assuntos podem ser solucionados até a noite‖. Também conhecia os princípios da divisão do trabalho, unidade de direção, de comando e de ordem. Reconheceu a necessidade do trabalho em equipe, da coordenação e da unidade de propósito em sua organização. (SILVA, 2013 p. 88). Como herança do Império Romano, a Igreja Católica Romana, organização formal mais antiga do mundo, representa outro importante exemplo. No século II seus líderes perceberam a premência de definir com mais rigor os objetivos, a doutrina e a conduta das atividades cristãs, bem como os critérios para se tornar membro dessa organização. Tratando de gestão centralizada, vemos a figura do Papa emergir com todos os poderes e autoridade. Outra iniciativa, que infelizmente não foi replicada em outras organizações foi a de manter um conjunto de assessores que contribuíam como conselheiros da Igreja Católica. Como dito anteriormente a administração vem num processo evolutivo, atendendo as necessidades da humanidade, que se organiza dentro das condições necessárias e disponíveis num determinado momento histórico. Para efeito de melhor contextualização, apresentamos através da Figura 1.1 as bases do pensamento administrativo do século XVIII até a primeira década do último século. Daniel Wren (1994) (apud SILVA, 2013, p. 100) descreve resumidamente as premissas das reflexões da administração.

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Babilônia: O Código de Hamurabi que vigorou no período de 2000 a 1700 a.C. contém um conjunto de ensinamentos administrativos que contribuiu na manutenção da paz do Império Babilônico. (SILVA; 2013, p. 82) 62 China: A constituição de Chow, escrita por volta de 1100 a.C. é rica em princípios envolvendo as funções da administração. Destaque é dado a obra a Arte da Guerra do general SunTzu (544 – 496 a.C.) muito embora, não exista bibliografia formal e sobre essa obra exista a suspeita de ser uma obra coletiva passada de geração em geração. (SILVA; 2013, p.83 e 84) 63 Grécia: A democracia grega e a complexidade de sua manutenção, no século V a.C., trouxeram grande desenvolvimento ao pensamento administrativo. Foi lá que se desenvolveu o método científico com forte influência nos estudos da administração no início do século XX. (SILVA; 2013, p. 85) 64 Roma: (476 a.C. – 27 a.C.) só uma excelente administração seria capaz de comandar 50 milhões de pessoas que viveram debaixo do Império Romano que chegou a abranger um território que se estendia da Grã-Bretanha 2 até a Síria, incluindo parte da Europa e todo o norte da África, algo em torno de 6,5 milhões de km . Mas, foi a má administração que fez esse império ruir. (SILVA; 2013, p. 86)

46 FIGURA 1.1 – Prelúdios do pensamento administrativo do Século XVIII até a década 10 do Século XX Primeiras civilizações: ponto de vista da função da administração no exército, no lar, na igreja e no governo.

As pessoas buscam a satisfação de suas necessidades por meio de esforços organizados, levando a administração a se tornar uma atividade.

A Revolução Industrial na Inglaterra cria sistemas de fábrica e problemas administrativos.

Ênfase na organização e nos métodos: Babbage e outros Revolução Industrial nos EUA antes da Guerra Civil Ênfase nos problemas humanos: Owen.

Pós-Guerra Civil: a expansão da indústria.

O Renascimento Cultural estabelece precondições para a industrialização.

Ênfase na organização e nos métodos: McCallum e Poor. Reconhecimento dos problemas humanos: Poor.

Administração sistemática: um início da administração científica (século XX)

Fonte: Adaptado WREN (1994 apud Silva, 2013, p. 100).

Daniel Wren (1994 apud SILVA, 2013, p. 101) dividiu o ambiente cultural do Século XVIII até a primeira década do Século XX em três: econômico, social e político 65 e nomeou uma sequência formando um contexto lógico de formação das primícias do pensamento administrativo: Reforçando as palavras anteriores destacamos o período da Revolução Industrial66 iniciada em fins do século XVIII, que marcou o início de um avanço tecnológico sem

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Ambiente econômico  Escassez de recursos e das necessidades econômicas de pessoas  Economias localizadas e baixa estima das empresas  Declínio do mercantilismo; aumento da pesquisa aplicada; encorajamento da inovação e da concorrência pela ética do mercado  Explosão tecnológica na energia e no transporte mais a ética do mercado  Pressões por economias de escala; divisão do trabalho  Acumulação de recursos. Ambiente social  Necessidade de família e de afiliação  Sociedades fechadas, alto grau de influência da Igreja; baixa motivação por realizações  Alteração; aumento da motivação pela realização  O funcionamento da ética protestante  Primeiro ―homem econômico‖; urbanização; sociedade mais aberta  Ética protestante e forte necessidade por realizações; filantropia individual. Ambiente político  Hostilidade na natureza e nas necessidades por segurança  Monarquia e filosofia centralizada de liderança  Declínio da monarquia e crescimento de governos constitucionais  Liberdade política e política econômica do laissez faire  Investigações sobre mão de obra de crianças e de mulheres  Começo do declínio do laissez faire. Essa abordagem resumidíssima de um conjunto muito amplo de diversos outros nomes, acontecimentos e outros conhecimentos do pensamento administrativo, tem por objetivo maior mostrar como surgiram as preocupações e estudos da administração do Século XVIII até a primeira década do Século XX. (SOUZA, RAM, 31 mai. 2016). 66 Revolução Industrial: pode ser dividida em 2 períodos ou como preferem alguns autores em 2 revoluções: a) 1780 a 1860 também chamada de revolução do carvão e do ferro, centra-se na Inglaterra chamada a ―oficina do mundo‖, onde dominam a produção de bens de consumo (os que atendem diretamente à demanda a médio ou longo prazo, p.ex., um automóvel, um eletrodoméstico, etc.), os têxteis e a energia a vapor; b) 1860 – 1914 conhecida como revolução do aço e da eletricidade, período que se expande pela Europa, América do Norte e Ásia. A indústria de bens de produção (conhecida também por indústrias de base ou pesadas, transformam matérias-primas brutas em matérias-primas processadas, sendo a base para outros ramos industriais) se desenvolve e as ferrovias se expandem. A energia elétrica e o petróleo surgem como novas formas de energia na propulsão do desenvolvimento. (SILVA; 2013, p. 96)

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precedentes na história da humanidade. No centro dessa revolução estava o motor a vapor como uma nova fonte de energia, revolucionando o comércio e a indústria, reduzindo sensivelmente seus custos, com maior eficiência. Para Maximiano (2015b, p. 95), um espírito de inovação levou a invenções, que, por sua vez, levaram a fábricas, e estas geraram a uma necessidade de administração e organização mais sofisticadas e complexas. Concentraram-se em grandes unidades fabris muitos trabalhadores e sendo necessários volumes de investimento enormes para financiar essas empreitadas. Mais máquinas foram demandadas e aumento constante da produção passou a ser exigido pela demanda do mercado. A mão de obra foi dividida e cada trabalhador se especializava em alguma tarefa. Silva descreve dando muita vida àquela realidade: Eram necessários administradores para planejar o que era para ser feito, para designar tarefas e responsabilidades, para liderar e coordenar os esforços humanos e para garantir que o trabalho estava sendo feito da forma correta. [...] Os primeiros administradores também tinham problemas urgentes com a força de trabalho. O analfabetismo era comum, e as habilidades básicas de ensino estavam em falta; desenhos, folhas de instruções e os procedimentos para a operação das máquinas exigiam alguma habilidade com relação a ler, calcular e responder com resultados previsíveis. O treinamento era conduzido em sua maior parte por instruções orais, demonstrações, tentativas e falhas. (SILVA, 2013, p. 95).

Como pudemos observar na Figura 1.1, muitos foram os estudiosos que se dedicaram a pesquisar, entender, analisar e apresentar soluções práticas e teóricas na resolução dos novos problemas que foram surgindo. Inicia-se um novo estágio da administração com um conjunto de pioneiros dos estudos com foco na administração:  Adam Smith67 conhecido economista clássico deu grandes contribuições para a evolução das funções administrativas, divisão do trabalho e seus respectivos benefícios;  Robert Owen68 precursor da perspectiva dos problemas humanos da industrialização.  Charles Babbage69 reconhecido por alguns como o fundador da pesquisa operacional e da ciência da administração; 67 68

Adam Smith (1723 – 1790) economista clássico, nascido na Escócia. (SILVA; 2013, p. 96) Robert Owen (1771 – 1858) nascido no País de Gales. Trabalhou usando a persuasão moral ao invés da punição corporal. Desenvolveu um mecanismo singular, chamado de ―monitor silencioso‖, para ajudar na disciplina e na motivação. (SILVA; 2013, p. 97)

48

 Henry Poor70 através de recomendações avançadas para sua época concebeu três princípios: organização, comunicação e informação;  Daniel McCallum71 enfocou sistema de organização que levasse a uma melhoria no desempenho das ferrovias, para ele a boa administração tinha como base a disciplina, descrições específicas e detalhadas de empregos, acompanhamento próximo dos níveis de desempenho. A administração deu um enorme salto no início do século XX, devido à existência de um

número

maior

de

empresas,

mas

principalmente

pela

complexidade

administrativa que impôs uma perspectiva mais científica preocupada em substituir o empirismo e a improvisação que preponderavam. O momento exigia que a gestão e as organizações passassem a ser tratadas mais profunda e analiticamente em relação aos problemas da complexidade organizacional.

1.1.3 – Escolas e teorias da administração A seguir apresentamos as teorias e escolas da administração resumidas na Figura 1.2 através de grupo de perspectivas72 numa linha do tempo com essas perspectivas perfiladas cronologicamente de duas em duas décadas. O tratamento tanto dessas perspectivas, quanto das teorias e escola, é feito na medida do escopo de nossa tese, priorizamos as informações efetivamente mais importantes para uma visão do desenvolvimento da administração enquanto prática e teoria. Existem diversos livros específicos tratando das teorias da administração, dedicando mais de trezentas páginas ao assunto, nós resumimos em onze páginas, até para não tornar a leitura enfadonha.

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Charles Babbage nascido em Devonshire, na Inglaterra foi um gênio, em 1822 apresentou a primeira calculadora mecânica que se tem notícia, chamada de ―máquina da diferença‖ e, em 1833, desenvolveu seu ―motor analítico‖, considerado o primeiro computador. (1792 – 1871) (SILVA; 2013, p. 98) 70 Henry Poor (1812 – 1905) nascido em Andover, Maine EUA, conhecido fundador da Standart & Poors (É uma das três maiores agências de classificação de risco). (SILVA; 2013, p. 98) 71 Daniel McCallum (1815 – 1878) nasceu na Escócia e mudou-se para os EUA em 1822, responsável pelo desenvolvimento de um sistema de informação dos mais desenvolvidos de sua época, que consistia em uso do telégrafo para realizar operações mais seguras, contribuindo decisivamente para o planejamento e controle organizacional. (SILVA; 2013, p. 99) 72 Grupo de perspectivas: forma didática de agrupar as teorias e escolas. Importante deixar claro que os períodos da Figura 1.2 não representam com exatidão o momento de sua ocorrência, e nem mesmo um ciclo de vida, pois muitas das teorias e escolas sobrevivem até hoje, ou pelo menos, algumas características e aspectos principais. Essa classificação adotada para as diversas perspectivas não é uma unanimidade, mas é aceita por um grande número de estudiosos reconhecidos e consagrados na administração como: Harold Koontz, Gary Dessler, Daniel Wern, James Donnelly, David Van Fleet, Richard Daft e outros. (SILVA, 2013, p. 102).

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Temos a Perspectiva Clássica, a partir do final do século XIX e início do século XX, mais especificamente na Figura 1.2 no ano de 1900, tratando concentradamente da estrutura da organização formal. Representa o primeiro esforço na construção de uma efetiva teoria da administração, para as organizações mais avançadas no referido período. FIGURA 1.2 – Linha do tempo das teorias da administração ocidentais sem o modelo japonês de gestão Perspectiva clássica Perspectiva humanística Perspectiva quantitativa Perspectiva moderna Perspectivas contemporâneas 1900

1920

1940

1960

1980

Fonte: adaptado de Silva (2013, p.106).

Até então a organização era tida como um meio racional para realizar metas e objetivos. Embora do ponto de vista mais geral esteja correta, essa abordagem tendia a desconsiderar aspectos subjetivos subjacentes a todas as organizações. Três teorias pertencem a essa perspectiva: a Teoria da Administração Científica, a Teoria Administrativa e a Teoria da Burocracia73. A Teoria da Administração Científica teve como seu principal teórico Frederick Taylor74, seus estudos se caracterizavam por cinco aspectos que se tornaram a base dessa teoria: análise do trabalho; padronização das ferramentas; seleção e treinamento dos trabalhadores; supervisão e planejamento; e, pagamento por produção. Taylor identificou as seguintes características da administração científica: ciência em lugar do empirismo, harmonia em vez de discórdia, cooperação, não individualismo, máxima produção e não restrição de produção e, desenvolvimento de cada homem para a sua máxima eficiência e prosperidade.

73

Teoria da Burocracia: o enquadramento dessa teoria para alguns autores é feito como perspectiva clássica devido ao seu período de ocorrência, bem como, por sua visão da atividade organizacional. 74 Frederick Winslow Taylor: (1856 – 1915) nasceu na Pensilvânia (EUA) em uma família quaker (nome dado a um grupo religioso, de cunho protestante, que prega o pacifismo e a simplicidade), teve uma educação básica rígida e disciplinada. Escreveu o livro "Os Princípios da Administração Científica", publicado em 1911. (WIKIPEDIA [Frederick Taylor], 01 jun. 2016).

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A partir disso definiu quatro princípios básicos: desenvolvimento de um método científico para o trabalho dos operários; estabelecimento de processo científico de seleção e treinamento do operário; cooperação entre a gerência e os operários; divisão do trabalho dos operários em função da sua especialização. Por último, o princípio da exceção: tudo o que ocorrer na ―área da normalidade‖ não deverá ser objeto de preocupação da alta administração. Henry Ford75 conhecido como o grande empreendedor e, embora não fosse teórico, foi o maior representante empresário contribuindo com seus conhecimentos práticos e inovativos para a administração científica. Para Silva (2013, p. 123) ―com sua filosofia de produção em massa, preços baixos, altos salários e organização eficiente do trabalho, destacando-se aí a rapidez de fabricação, Henry Ford apresentou ao mundo o maior exemplo de administração eficiente individual que a história conhece‖. (SILVA, 2013, p. 123).

A Teoria Administrativa teve como seu principal e mais conhecido representante Henri Fayol76. Os avanços até aquele momento se deram em relação à parte produtiva, técnica industrial, mas a gestão ficou relegada a um segundo plano ou ainda, observou que existia uma separação grande entre teóricos e o dia a dia nas fábricas. Coube a Fayol (1972 apud SILVA, 2013, p. 134) definir teoria para a administração como ―uma coleção de princípios, regras, métodos e procedimentos testados e verificados por experiência geral‖. Foi com Fayol que a administração encontrou sua real valorização teórica e prática, tratou a administração como disciplina e profissão. Criou o Centro de Estudos Administrativos, onde se reuniam semanalmente pessoas interessadas na administração de negócios comerciais, industriais e governamentais, contribuindo para a difusão das doutrinas administrativas. Preocupado com a administração identificou e destacou suas principais funções: Planejar/prever, 75

Organizar,

Controlar,

Coordenar

e

Comandar

(POCCC).

Henry Ford: (1863 – 1947) nascido no estado de Michigan (EUA) não foi um teórico, mas representa a contribuição da indústria na construção da teoria da administração científica. (SILVA, 2013, p. 110). 76 Jules Henri Fayol: (1841 – 1925) nasceu em Constantinopla atual Istambul, em 1860 graduou-se em engenheiro de minas. Um dos teóricos clássicos da Ciência da Administração, sendo o fundador da Teoria Clássica da Administração e autor de Administração Industrial e Geral, editado em 1916. Um dos principais contribuintes para o desenvolvimento do conhecimento administrativo moderno. (SILVA, 2013, p. 110).

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Universalizou a administração e seu estudo, demonstrando que todas as organizações tinham necessidades semelhantes do ponto de vista da gestão e estabeleceu quatorze princípios77 que, tornaram-se uma espécie de prescrição organizacional. A terceira corrente da perspectiva clássica é a Teoria da Burocracia. Seu principal representante foi Max Weber78, responsável por teorizar a organização da atividade humana (burocracia). Considerava que ―uma organização é uma estrutura de relacionamentos, poder, objetivos, papéis, atividades, comunicações e outros fatores que existem quando pessoas trabalham juntas‖. (WEBER, 1947 apud SILVA, 2013, p. 147). A maioria dos fundadores da administração caracterizou-se pela sua origem industrial, engenheiros e industriais preocupados com a concepção da administração como ciência e técnica. Weber representa a liderança desses estudos em relação à sociedade, suas implicações e representações, sua origem diferentemente dos demais foi a academia. Na Perspectiva Humanística79 com raízes nos anos 1920, encontra seu auge e maior reconhecimento em 1930, com marcantes contribuições da psicologia, com enfoque no elemento humano e da sociologia, com foco no comportamento coletivo. Surge como uma reação à Teoria Clássica por considerá-la uma teoria com motivação essencialmente voltada para produtividade e o rendimento, economia e técnica, pouco preocupada com o fator humano. Encontramos aqui as Teorias da Transição, a Escola das Relações Humanas, a Escola Comportamentalista e a Teoria Estruturalista.

77

Quatorze princípios de Fayol: 1) Divisão de trabalho; 2) Autoridade e responsabilidade; 3) Disciplina; 4) Unidade de comando; 5) Unidade de direção; 6)Subordinação do interesse individual ao interesse coletivo; 7) Remuneração do pessoal justo e compensatório por desempenho; 8) Centralização; 9) Cadeia escalar/Hierarquia; 10) Ordem (um lugar para cada coisa, uma cada coisa no seu lugar); 11) Equidade (tratamento igual para todos); 12) Estabilidade do pessoal no cargo; 13) Iniciativa; 14) Espírito de equipe. (SILVA, 2013, p. 134 e 135) 78 Max Weber: (1864 – 1920) nasceu em Erfurt, na Turíngia, parte da Alemanha, na ocasião sob domínio da Prússia. Sociólogo notabilizou-se pelo desenvolvimento da teoria das estruturas da autoridade, formado em direito, viveu boa parte de sua vida como professor universitário. Desenvolveu a teoria da autoridade que distingue o conceito de autoridade em confronto com outras formas de influência: poder e persuasão. (SILVA; 2013, p.147 a 149) 79 Perspectiva Humanística: marco inicial em 1920 conforme Figura 1.2. (SILVA; 2013, p.171) destaca os seguintes personagens e aspectos: 1) Mary Follett: integração dinâmica; 2) Chester Barnard: responsabilidade executiva; 3) Elton Mayo e Fritz Roethlisberger: relações humanas.

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Os principais representantes das Teorias da Transição foram Mary Parker Follett80 e Chester Irving Barnard81. Follett foi a primeira a analisar a motivação humana, partindo de valores individuais e sociais. Para ela a administração precisa compreender as pessoas, os grupos e a comunidade. Chester Barnard afirma que a natureza do sistema social é cooperativa e que assim deveria ser conduzida, dessa forma, buscou formular uma teoria da organização e cooperação, e apresentar uma descrição do processo executivo. Tanto Mary Follett como Chester Barnard objetivavam desenvolver os meios para integrar as pessoas e as organizações. Ela centrou-se mais nas pessoas, ele mais nas organizações. A Escola das Relações Humanas foi construída com base na Teoria Clássica, como uma continuidade. Enquanto Taylor deu ênfase à tarefa, Fayol à estrutura, Weber à autoridade, a Escola das Relações Humanas põe seu foco nas pessoas. Seu protagonista foi o psicólogo Elton Mayo82 Foi um movimento de teóricos e executivos para fazer gerentes mais sensíveis às necessidades dos empregados. Certas condições do contexto sócioeconômico do final do primeiro quartel do século XX como: a Grande Depressão norte-americana de 1930, o enfraquecimento que isso provocou ao sindicalismo; e a filosofia do humanismo industrial83 foram determinantes para o seu desenvolvimento. A Escola Comportamentalista também denominada ―novas relações humanas‖, representa um desdobramento da Teoria das Relações Humanas. Essa escola é até o momento a mais crítica em relação à Teoria Clássica, acusando-a de rigidez e mecanicismo. Critica também a Teoria da Burocracia por seu ―modelo de máquina‖. Imprimiu um novo direcionamento às abordagens teóricas da administração, valorizando o comportamento do indivíduo e minimizando a importância das 80

Mary Parker Follett: (1868 – 1933) nasceu em Quincy, Massachusetts, pesquisadora acadêmica, concentrou seus estudos em filosofia, história, política e direito. Os aspectos relevantes da visão de Mary Follett são: * A redução do conflito, por meio de uma integração de interesses; * A obediência à lei da situação, para a integração do trabalho; * A elaboração de processos psicológicos básicos, para a integração dos indivíduos no grupo de trabalho. (SILVA; 2013, p. 174) 81 Chester Irving Barnard: (1886 – 1961) nasceu em Malden, Massachusetts (EUA), economista e sociólogo sem diploma, executivo de empresas escreveu dois livros The functions of the executive e Organization and management. Sua definição de eficácia e eficiência é diferente da convencionada. Considera que eficácia de um sistema representa a cooperação requerida para provocar o alcance das metas, e eficiência como sendo o grau no qual os objetivos individuais estejam sendo satisfeitos. (SILVA; 2013, p. 177) 82 Elton Mayo: (1880 – 1949) nasceu em Adelaide, Austrália, psicólogo trabalhou a maior parte de sua vida na Harvard Business School. Conhecido também por sua famosa pesquisa na fábrica de Hawthorne (1924-1932) sobre o relacionamento das pessoas no trabalho. (SILVA; 2013, p. 189) 83 Filosofia do Humanismo industrial: estabelecida por estudiosos que queriam provar que a produtividade dos trabalhadores dependia do tratamento dado a eles. (SILVA, 2013, p. 204)

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posturas normativas e prescritivas84 proposta pelas teorias existentes até aquele momento. Com os estudos dessa escola inicia-se na história da administração na perspectiva do comportamento organizacional85. As maiores contribuições foram dadas nessa escola por Kurt Lewin86 doutor em psicologia que desenvolveu diversas metodologias e experimentações com grupos de indivíduos em seu local de trabalho. Diversos autores trataram vários aspectos pioneiramente como: motivação e ciclo de motivação, necessidades e expectativas no trabalho, frustração do indivíduo, entre outros temas. A respeito da motivação, diversas teorias foram apresentadas, sendo a mais conhecida a Teoria da Hierarquia das Necessidades de Abraham Maslow87, propôs que as necessidades básicas fossem estruturadas em uma hierarquia de predominância e probabilidade de surgimento. Para ele os ―indivíduos se comportam no sentido de suprir suas necessidades mais imediatas‖88. Muitos outros trabalhos dessa escola abordaram além da motivação, a liderança, o poder, clima organizacional, através de visões e modelos contingenciais e situacionais89. Outro aspecto importante diz respeito à preocupação com a qualidade de vida no trabalho. O estruturalismo significa reconhecer que os fenômenos da organização se interligam, interpenetram e interagem de forma tal que qualquer alteração ocorrida em uma parte da organização interfere nas demais partes, assim surge a Teoria Estruturalista. O nome de destaque dessa teoria é Amitai Etzioni90, através de seus 84

Posturas normativas e prescritivas: normas das diversas escolas e teorias buscando normatizar e prescrever cargos, funções, posturas, preocupadas com a necessária padronização, daí a crítica da Escola Comportamentalista. (SILVA, 2013, p. 206) 85 Comportamento Organizacional: Comportamento organizacional é o estudo do comportamento dos indivíduos e grupos em situação de trabalho e seus impactos no ambiente empresarial. (ADMINISTRADORES, [Comportamento Organizacional], 20 abr. 2016). 86 Kurt Lewin: (1890 – 1947) nascido na Alemanha, doutorando-se em psicologia em Berlim. Com seus estudos e pesquisas a psicologia encontrou um meio, através das empresas, de usar experimentações para analisar a vida dos grupos. (SILVA, 2013, p.205) 87 Abraham Maslow: (1908 – 1970) nascido no Brooklin, NY, psicólogo comportamentalista. Trabalhou no Massachusetts Institute of Technology (MIT), fundando o centro de pesquisa National Laboratories for Group Dynamics. WIKIPEDIA [Abraham Maslow], 01 jun. 2016). 88 MASLOW (1954 apud SILVA, 2013, p. 215. 89 Teorias Contingenciais e situacionais: veremos estas definições quando tratarmos mais à frente a Teoria das Contingências. 90 Amitai Etzioni: (1929 –) nasceu em Colônia, Alemanha e é um sociólogo germano-estadunidense-israelense. Professor das Universidades de Columbia e de George Washington (EUA) e membro do Instituto de Estudo de Guerra e Paz. (WIKIPEDIA [Amitai Etzioni], 01 jun. 2016).

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estudos reconhece o conceito de sistema aberto, onde se promove a interação entre organizações humanas e o ambiente que elas se inserem. Interessante observar que estas ideias são retomadas pelos sistemas de informações gerenciais da perspectiva quantitativa e, pela Teoria de Sistemas da perspectiva moderna. A Perspectiva Quantitativa91 originou-se no decorrer da 2ª. Guerra Mundial e promoveu muitas alterações na administração. Necessidades de melhores ferramentas para a tomada de decisões, ligadas às forças armadas como a movimentação de tropas, produção de armamentos, e outros similares. Essa abordagem se diferencia das anteriores por envolver muita matemática, estatística, física e outras técnicas quantitativas. Essa perspectiva apresenta-nos a Pesquisa Operacional, responsável pelo desenvolvimento de técnicas como análise do ponto de equilíbrio, programação linear e o PERT-CPM92; a Administração de Operações também conhecida como administração da produção e logística busca garantir que os gestores tomem decisões para garantir que os produtos e/ou serviços de sua empresa ofereçam: 1) demanda adequada; 2) num tempo apropriado; 3) com o nível de qualidade desejado; 4) de uma maneira compatível com as metas da organização.

(SILVA,

2013, p. 276 e 292). Outra escola da perspectiva quantitativa é a dos Sistemas de Informações Gerenciais, conhecido também pelo acrônimo SIG. Todo encaminhamento de uma organização apoia-se no uso de informações, constituindo-se na base do processo de tomada de decisão. Sistema é um conjunto de partes interdependentes que atuam de modo conjunto, efetuando determinada função, formando um todo equilibrado, com objetivo específico. Um sistema de informações é a coleta, a organização e a distribuição de dados, de tal modo que eles se tornem significativos como informações e contribuam significativamente para a tomada de decisão.

91 92

Perspectiva Quantitativa: marco inicial em 1940 conforme Figura 1.2. PERT-CPM: Acrônimo de Program Evaluation and Review Technique ou, avaliação de programa e técnica de revisão e Critical Path Method ou método do caminho crítico.

55

Reconhecer que a perspectiva clássica, humanística e quantitativa da administração não são necessariamente contraditórias e mutuamente excludentes é crucial. Mesmo que considerações e projeções díspares sejam promovidas pelas três visões, cada uma delas complementa as demais, além do que, surgiram em contextos distintos, com olhares diferentes e complementares. Para Reinaldo Silva (2013, p. 326) a visão clássica enfatizou as condições técnicas de uma organização e suas necessidades; o ângulo humanístico, os aspectos sociais e psicológicos e o reconhecimento das necessidades humanas; e na perspectiva quantitativa, o uso de ferramentas matemáticas e estatísticas no tratamento dos problemas de tomada de decisão nas operações. Na

Perspectiva

encontramos

a

Moderna93 Teoria

de

também Sistemas,

chamada a

de

Teoria

abordagem das

integrativa

Contingências,

o

Desenvolvimento e a Cultura Organizacionais e com a Administração por Objetivos. A Teoria de Sistemas conhecida também como Teoria Geral de Sistemas (TGS) propõe a reorientação do pensamento e da visão do mundo, tendo o sistema como um novo paradigma científico ou modelo ideal, em oposição à visão de ciência clássica, cartesiana e mecânica-linear. O principal expoente dessa teoria foi Ludwig von Bertalanffy94 biólogo austríaco, que iniciou o movimento retornando ao pensamento aristotélico, com base nos conceitos encontrados na química-física, cinemática, termodinâmica, encaminhou seus estudos tendo em vista o metabolismo, estados estáveis, crescimento e sistemas abertos95. ―Um sistema pode ser definido como um conjunto de elementos interagentes e interdependentes relacionados cada um ao seu ambiente de modo a formar um todo organizado‖. (SILVA; 2013, p. 330).

93

Perspectiva Moderna: marco inicial em 1960 conforme Figura 1.2. Karl Ludwig von Bertalanffy: (1901 – 1972) biólogo austríaco responsável pela Teoria Geral dos Sistemas, que surge em oposição a Teoria Cartesiana, chamada também de mecanicista, racionalista. (GOMES, dez. 2014). 95 Sistemas Abertos: ―Um organismo é um sistema aberto que mantém um estado constante enquanto matéria e energia, que atuam para mantê-lo em alteração (o chamado equilíbrio dinâmico). O organismo é influenciado por seu ambiente e o influencia, alcançando, com ele, um estado de equilíbrio dinâmico (estado de troca de elementos). Tal descrição de um sistema encaixa-se adequadamente às organizações típicas de negócios. (SILVA; 2013, p. 334) 94

56

Essa teoria tem sido a mais aceita e usada pelos teóricos da administração até hoje, particularmente nas publicações acadêmicas, mas a prática na maioria das pequenas empresas no Brasil que representam 99% das empresas constituídas formalmente (cfe. SEBRAE, 2015) nos parece, ainda ser uma prática antiga, ligada à visão cartesiana, mecanicista, como veremos no próximo item ao tratar da prática administrativa nas empresas de pequeno porte. A Teoria das Contingências estabelece que situações diferentes exijam práticas diferentes, apregoando o uso das teorias tradicionais, comportamentais e de sistemas separadamente ou combinadas para resolver problemas das organizações. O Desenvolvimento e a Cultura Organizacionais abreviado por (DO) teve Richard Beckhard96 como seu maior expoente. O DO contribui para que os gerentes alcancem um grau de síntese da organização, ajudando a juntar as muitas peças de um sistema complexo, na melhor configuração possível. O DO é muito útil para os gerentes, pois, instiga-os a ver as organizações como sistemas abertos dinâmicos, interagindo ativamente com o ecossistema e internamento com os subsistemas. Além disso, encoraja-os a olharem ao seu redor o que os colaboradores e os grupos estão fazendo, mas também como estão operando. A Administração por Objetivos para Silva (2013, p. 405) pode ser definida como um estilo ou sistema de administração que relaciona as metas organizacionais com o desempenho e o desenvolvimento individual, por meio do envolvimento de todos os níveis administrativos. As Perspectivas Contemporâneas97 ocorrendo em torno dos anos 1980, como as últimas da linha do tempo das perspectivas, tratam aspectos chave para a condução das organizações, em função de elementos extremamente mutantes do ambiente, frente à constante atualização da concorrência e a crescente exigência dos clientes e consumidores. Encontramos aqui a Qualidade e a Excelência Organizacional e os Projetos Organizacionais

96

Richard Beckhard: (1918 – 1999) cientista comportamental norte-americano do MIT foi o criador da expressão Desenvolvimento Organizacional (DO). O DO é um processo sistemático, administrado e planejado de mudança de cultura, sistemas e comportamentos de uma organização, como forma de melhorar a eficácia na solução dos problemas e no alcance dos objetivos organizacionais. (SILVA; 2013, p. 374) 97 Perspectivas Contemporâneas: marco inicial em 1980 conforme. Figura 1.2.

57

A Qualidade e a Excelência Organizacional devem ser entendidas assim: a qualidade como a totalidade de aspectos e características de um produto ou serviço que propiciam a habilidade de satisfazer dadas necessidades. E a excelência como uma condição em que a eficiência leva a uma eficácia maior do que o esperado, ou o realizado é melhor do que o planejado, em termos de resultados. Projetos Organizacionais também conhecido como desenho organizacional, referese à criação ou reprojeto, por parte de organizações avançadas, de estruturas modulares, virtuais e sem fronteiras. Acredita-se que os projetos serão totalmente diferentes, que em lugar de departamentos tradicionais as organizações estarão assentadas em cinco centros diferentes: 1) Centro de conhecimento/aprendizagem; 2) Centro de recuperação/desenvolvimento; 3) Centro de serviço mundial/espiritual; 4) Centro de operações de classe mundial; 5) Instituto de liderança. Um dos destaques dessa visão é Peter Senge98 que nos apresenta cinco novas ―tecnologias

componentes‖

ou

simplesmente

disciplinas

para

a

inovação

organizacional, como podemos observar na Figura 1.3. São elas: 1) Domínio pessoal; 2) Modelos mentais; 3) Visão compartilhada; 4) Aprendizagem em equipe; 5) Pensamento sistêmico.

FIGURA 1.3 – Articulação das disciplinas de Peter Senge para a criação da organização de aprendizagem.

Desenvolvimento do domínio pessoal

Construção de modelos mentais desafiadores Encorajamento do pensamento sistêmico 5ª. Disciplina

Criação da visão compartilhada

Promoção da aprendizagem em equipe

Fonte: adaptado de Silva (2013, p. 461).

O pensamento sistêmico como podemos observar representa a 5ª. disciplina, título inclusive de seu conhecido livro. O escrito ―Encorajamento do pensamento sistêmico‖ no centro da Figura 1.3 aparece como o foco ou o resultado das demais 98

Peter Senge: (1947 – ) nascido em Stanford, Califórnia. Autor do famoso livro A quinta disciplina. (WIKIPEDIA [Peter Senge], 01 jun. 2016).

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disciplinas. Rompe-se assim, com a visão estanque de trabalho individual isolado e individualizado, criando as condições para que a organização e seus colaboradores aprendam e ensinem conjuntamente. Infelizmente, esse discurso e prática ficam muito distantes da realidade da maioria esmagadora dos empresários e administradores como poderemos analisar no item 1.2 – Práticas administrativas nas MPE‘s.

1.1.3.1 – Modelo japonês de administração O Modelo Japonês de Administração foi durante muito tempo um ponto fora da curva para o ocidente. Seu surgimento e desenvolvimento foram desconsiderados por muitos. Prova disso, são as diversas publicações americanas e algumas nacionais baseadas nessas, que nem citam o evento, ou quando o fazem, lembram-no apenas pelo seu significado no movimento da qualidade total. A própria Figura 1.2 das perspectivas administrativas, na página 50, não contém o modelo de produção japonês. Fizemos questão de reproduzi-la abaixo inserindo na linha do tempo o modelo japonês de gestão. Esse modelo revolucionou a forma de se encarar a produção, a qualidade e, especialmente o ser humano. Na Figura 1.2a todas as cinco perspectivas e as escolas e teorias em seu interior são ocidentais, e muitos livros ocidentais acabam desconsiderando esse sistema de produção que nos anos 1970 deu uma ―lição ao mundo‖.

FIGURA 1.2a – Linha do tempo das teorias da administração ocidentais e japonesa Perspectiva clássica Perspectiva humanística Perspectiva quantitativa Perspectiva moderna Modelo Japonês de Gestão

1900

Perspectivas contemporâneas

1970 1920 1960 1940 1980 Fonte: adaptado de Silva (2013, p. 106), acrescentando o Modelo Japonês de Gestão.

A Figura 1.4 apresenta-nos uma série de fatores que contribuíram para que esse modelo influenciasse tanto e, tão profundamente, não só a produção, mas, jogasse

59

mais uma pá de cal no apoio a sociedade industrial99. Como podemos ver na figura, um desses fatores foi a cultura japonesa orientada para o trabalho em grupo e a economia de recursos. A administração científica e particularmente as ideias de Taylor reforçaram o sistema Toyota de produção, que se viu apoiado pela configuração da linha de produção fordista e pelo ciclo de Shewhart-Deming100, sua ferramenta principal. O kaizen101 sustenta-se em duas práticas, a dos 5S e 5W 102. O Sistema Toyota de Produção e o modelo japonês de administração representam praticamente a mesma coisa, pois, foram se integrando e um contribuindo para com o outro, numa constante sinergia. FIGURA 1.4 – Bases do modelo japonês de administração SHEWHART

DEMING

SISTEMA TOYOTA DE PRODUÇÃO

MODELO JAPONÊS DE ADMINISTRAÇÃO

FORD

TAYLOR E OUTROS DA ADMINISTRAÇÃO CIENTÍFICA

CULTURA JAPONESA ORIENTADA PARA O TRABALHO DE GRUPO E A ECONOMIA DE RECURSOS

Fonte: Maximiano (2008, p. 60). 99

Sociedade Industrial: baseada no período de dominação da indústria; maior força no período da revolução industrial (anos 1920 do Século XX); principais características: previsibilidade, hierarquia bem definida, decisões centralizadas. Valores: obediência, pontualidade e lealdade. Foco na produção. 100 Ciclo de Shewhart-Deming: conhecido também por Ciclo PDCA (acrônimo de Plan, Do, Check e Action), isto é, estabelecer objetivos, implementar o plano, estudar os resultados e propor ações corretivas visando a melhoria constante. Cabe esclarecer a importância de Shewhart e Deming para a sociedade japonesa. Walter Andrew Shewhart (1891 – 1967) físico, engenheiro, estatístico e consultor americano, responsável pelo desenvolvimento do Controle Estatístico de Qualidade, tendo influenciado sobremaneira o também estatístico americano William Edwards Deming (1900 – 1993), reconhecido pela melhoria dos processos produtivos nos EUA durante a Segunda Guerra Mundial, mas, destacado internacionalmente por suas contribuições ao movimento da qualidade no Japão. Deu contribuições imprescindíveis para que o Japão se tornasse notório pela fabricação de produtos com alto valor agregado pela inovação e qualidade. (WIKIPEDIA [Ciclo PDCA], 01 jun. 2016). 101 Kaizen: práticas de aprimoramento contínuo. (MAXIMIANO; 2015, p. 181) 102 5S e 5W: abreviação de Seiri (Sort, Separar), Seiton (Systematize, Organizar), Seiso (Shine, Dar brilho), Seiketsu (Standardize, Padronizar, Normatizar) e Shitsuke (Sustain, Self-discipline, Manter, Conservar). Os 5W, ou Five Whys ou ainda, cinco porquês, perguntar cinco vezes qual a causa do problema conduz a causa original. Consertada a causa primeira, a cadeia de problemas se desfaz. (FREEWEBS [Housekeeping], 01 jun. 2016).

60

Para Maximiano (2015a., p. 180), o sistema Toyota está ancorado na ―eliminação completa de todo e qualquer desperdício‖. Assim, incorporaram, desde o início, os dois princípios fundamentais do TPS103: Jidoka104 e Just in time105. Sendo o Kaizen, a ferramenta que faz o sistema se aprimorar continuamente. O Sistema Toyota de Produção vem sendo desenvolvido desde 1926, quando a Toyota ainda era uma fábrica de teares. Sempre tiveram a preocupação em evitar o desperdício. Em 1956 observando a produção americana concluíram que seria necessário simplificar o modelo de Henry Ford, que mantinha grandes contingentes de trabalhadores com capacidade subaproveitada trabalhando em tarefas menores, alienados e desmotivados. Assim, uma das bases de sustentação como podemos verificar na Figura 1.5 é a participação dos operários colaboradores, com dois pilares lastreando o sistema Toyota, que são a produtividade e a qualidade. Muitas vezes o modelo japonês de gestão e produção é confundido com o movimento pela qualidade total 106, que foi outro aspecto que impulsionou o sistema a conquistar o mundo. FIGURA 1. 5 – Princípios do sistema Toyota de produção

SISTEMA TOYOTA

PRODUTIVIDADE

QUALIDADE

PARTICIPAÇÃO Fonte: Maximiano (2008, p. 61).

Esse modelo se universalizou nos anos 1980, quando empresas como Toyota, Honda e Nissan instalaram-se nos Estados Unidos e na Europa impressionando as empresas com sua superior eficiência na produção e, pela maneira participativa e

103

TPS: Toyota Production System ou Sistema Toyota de Produção Jidoka: interromper o funcionamento das máquinas e das linhas de produção quando ocorre qualquer tipo de problema ou defeito. (MAXIMIANO; 2015a, p. 180) 105 Just in time: fabricar apenas a quantidade necessária de produtos. (MAXIMIANO; 2015a, p. 181) 106 Gestão da Qualidade Total: "Total Quality Management" ou simplesmente "TQM" consiste numa estratégia de administração orientada a criar consciência da qualidade em todos os processos organizacionais. É referida como "total", uma vez que o seu objetivo é envolver distribuidores e demais parceiros de negócios. (WIKIPEDIA [Gestão da Qualidade Total], 01 jun. 2016). 104

61

igualitária que tratava seus funcionários, radicalmente oposta aos costumes das fábricas ocidentais, com uma separação hierárquica marcante. Conforme Maximiano (2015a, p. 192), nos anos 1990 o modelo japonês já havia deixado de ser exclusivamente nipônico, tornando-se o padrão universal das empresas que intencionavam competir em escala global. As principais diferenças entre os modelos de produção fordista-taylorista tradicionais e o modelo japonês no Quadro 1.1. Analisando o Quadro 1.1, podemos facilmente perceber como o modelo japonês de administrar rompe como um conjunto de paradigmas mecânicos lineares da produção fordista ocidental. Através de grupos de trabalho auto gerenciados está se ―empoderando‖ as pessoas e as equipes através do que se convencionou chamar de células de produção107, que trabalham valorizadas em suas capacidades cognitivas operando com conhecimentos tácitos e explícitos. Os demais elementos do quadro são autoexplicáveis. QUADRO 1.1 – Comparativo entre as ideias ocidentais e as orientais em relação à administração Ideais Orientais

Ideais Ocidentais Linha de montagem móvel, com trabalhadores especializados.

Grupos de trabalho autogerenciados.

Verticalização, controle de todas as fontes de fornecedores, administração de estoques, mentalidade just in case.

Parcerias com fornecedores dedicados, produção enxuta, mentalidade just in time.

Tamanho é documento.

Guerra ao desperdício.

Máquinas e equipamentos dedicados.

Produção flexível.

Fonte: Maximiano (2015b, p. 105).

Sobre o conhecimento Nonaka e Tackeuchi (1997, p. XIII) no prefácio de seu livro ―Criação de Conhecimento na Empresa‖ criticam a filosofia Ocidental, e tratam de maneira mais coletiva o conhecimento. Escrevem: 107

Células de produção: dentro da teoria do pensamento enxuto: ―Uma célula é um arranjo de pessoas, máquinas, materiais e métodos em que as etapas do processo estão próximas e ocorrem em ordem sequencial, através do qual as partes são processadas em um fluxo contínuo‖. (ROTHER; HARRIS, 2002 apud PATTUSSI, 04 mai. 2016. (p. 26)

62 Na filosofia dominante no Ocidente, o indivíduo é o principal agente, que possui e processa o conhecimento. Nesse estudo, entretanto, mostraremos que o indivíduo interage com a organização através do conhecimento. A criação do conhecimento ocorre em três níveis: do indivíduo, do grupo e da organização. Portanto, nossa discussão da criação do conhecimento organizacional tem dois componentes principais: as formas de interação do conhecimento e os níveis de criação do conhecimento. As duas formas de interação – entre o conhecimento tácito e o conhecimento explícito e entre o indivíduo e a organização – realizarão quatro processos principais da conversão do conhecimento que juntos, constituem a criação do conhecimento: (1) do tácito para o explícito; (2) do explícito para o explícito; (3) do explícito para o tácito; (4) do tácito para o tácito. (NONAKA; TACKEUCHI, 1997, p. xiii).

Retomaremos a esses conceitos e visões no Capítulo 3 ao tratarmos a Sociedade do Conhecimento e Sociedade Industrial.

1.2 – Práticas administrativas nas Micro e Pequenas Empresas (MPEs) brasileiras O

estudo

das

práticas

administrativas

nas

empresas

brasileiras

passa

necessariamente pelas empresas de pequeno porte. Estas representam a maioria esmagadora das organizações formalmente constituídas para a produção e oferta de produtos e serviços ao mercado consumidor. Tem destaque no cenário social, econômico e político a participação das Empresas de Pequeno Porte (EPPs) como fonte geradora de empregos e renda, bem como celeiro e potencial criador de empreendedores e inovações. O Gráfico 1.1, autoexplicativo, é uma demonstração de como a MPE é importante, significativa e vem crescendo mais que a Média e Grande Empresa (MGE). As MPEs representam 99% de todas as empresas formalizadas.

63 GRÁFICO 1.1 – Evolução do núm ero de estabelecim entos por porte – Brasil 20022012 (em m ilhões)

Fonte: SEBRAE; DIEESE. (p.28)

1.2.1 – Aspectos gerais sobre as MPE’s Para Soares (2002, p. 44) nas intervenções a respeito de desenvolvimento econômico, em todo o mundo, destaca-se a participação das empresas de pequeno porte como força essencial no desenvolvimento econômico. As grandes unidades produtivas, do comércio e de serviços com crescimento intenso no último século não ofuscaram a importante participação na produção social das micro e pequenas empresas. Por um lado o processo de concentração do capital nos grandes conglomerados e por outro, as dificuldades tecnológicas, financeiras, organizacionais mantendo altas taxas de mortalidades das MPEs, indicam o seu fim como um prenúncio apocalíptico. (SOARES, 2002, p. 44). Mas, contradizendo essa visão, a natalidade das micro e pequenas empresas parece desconsiderar tais óbices, com um nascimento contínuo de novas e pungentes empresas. Diversas obras, publicadas no limiar do nosso século, apontam para uma tendência de efetivo crescimento das MPEs e de redução estrutural dos grandes conglomerados. A importância das empresas de pequeno porte não se resume ao Brasil. Podemos tomar, por exemplo, as empresas da indústria de transformação, que num trabalho

64

feito para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Fernando Puga (2000, p. 11) afirma que em todos os países analisados, as Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPMEs) representam no mínimo 98% do total de empresas. MPMEs representam uma classificação mais ampla, normalmente adotada na padronização do tratamento das empresas de pequeno porte internacionais, pois, alguns países como os Estados Unidos não trabalham com o conceito de microempresa e as empresas pequenas abrangem até 500 funcionários. Reforçando a contribuição social econômica das MPME‘s, Puga afirma no referido trabalho: Na Europa, a criação líquida de postos de trabalho nas MPMEs mais do que compensou a diminuição nas grandes empresas, no período de 1988 a 1995. As empresas com menos de 100 empregados foram responsáveis por quase todos os postos criados, em ritmo de 259 mil novos empregos por ano (European Commission, 1995). Além disso, durante os períodos de recessão, as pequenas empresas demitiram mais lentamente do que as grandes empresas. (PUGA, 2000, p. 11).

As MPMEs, também, têm papel destacado no que diz respeito à produção de inovações nos EUA.

Apesar dos gastos em P&D proporcionalmente menores,

quando comparados às empresas de grande porte elas respondem por mais da metade das inovações. (PUGA, 2000, p. 11). Drucker (2014, p. 4) considera que a tecnologia teve relativa importância nos EUA 1970/1980 na geração de empregos, mas que o grande gerador de empregos foi as pequenas e médias empresas, essas últimas expandiram três vezes mais suas atividades e empregos que as maiores da lista das ―500 da Fortune‖ no período compreendido entre 1970 e 1983. Ele, (DRUCKER, 2014, p. 16), considera que o grande responsável pela geração de emprego e renda foi a ―nova tecnologia‖ produzida pelo Quarto Setor, as parcerias público privadas para resolver o que o estado não tem conseguido por falta de recursos e, que o setor privado isoladamente acaba olhando, exclusivamente, pela ótica da maximização dos lucros. Chama de administração empreendedora. As pequenas e médias empresas, particularmente nos EUA foram as que mais cresceram quantitativamente em números de empresas e, em relação ao

65

crescimento do mercado. A razão disso é a administração sendo usada de forma criativa e criadora representando a nova tecnologia nas pequenas e médias empresas. Aprofundaremos essa questão no subitem 1.3 Perspectivas das MPEs. No Brasil, até meados da década de setenta, as empresas de pequeno porte pouco foram analisadas em estudos tradicionais. E ainda, boa parte dos estudos após este período pecava por análises estáticas com muita informação quantitativa e pouca ou nenhuma qualitativa. Nas últimas três décadas e meia essa realidade vem mudando através de uma série de contribuições promovidas pelo SEBRAE nacional e por suas unidades estaduais, particularmente as de São Paulo e Minas Gerais, com importantíssimas contribuições ao estudo dessa categoria de empresas, e ao empreendedorismo latente nesses empresários. Outras inúmeras contribuições surgiram das academias e de seus acadêmicos, da parte de institutos de pesquisas, analisando os empresários e as empresas. Porém ainda muitos desses estudos são desenvolvidos tendo como referência as grandes empresas. Para continuar nosso estudo definiremos e apresentaremos a classificação de micro ou pequena empresa. Os preceitos convencionais como número de empregados ou valor do faturamento, ou ainda, capital social, patrimônio líquido e investimentos são insuficientes para estabelecimento de categorias mais adequadas. Soares (2002, p. 45) considera que o uso exclusivo de critérios quantitativos para a classificação das empresas, como por exemplo, o número de empregados, sem uma prévia análise da composição orgânica do capital, pode conduzir a equívocos fazendo com que empresas altamente capital-intensivas estejam em uma mesma categoria de unidades artesanais mão-de-obra-intensivas108.

108

Empresas capital-intensivas e unidades artesanais mão-de-obra-intensivas: As primeiras referem-se a empresas com alto valor agregado, exigindo altos investimentos e/ou tecnologias avançadas, enquanto que as outras têm menor valor agregado, exigindo uso amplo e constante de habilidades da mão de obra. (SOARES, 2002, p. 46).

66

Segundo Rattner109 (1985) os dados quantitativos são de extrema relevância no dimensionamento e comparação de aspectos, funções e problemas das MPEs. Mas existe uma necessidade de informações qualitativas que permitam o entendimento da dinâmica e as ―tendências do processo de acumulação, bem como as funções diferenciadas que nele desempenham, pequenas e grandes unidades produtivas‖. (RATTNER, 1985, p. 24). O que tem predominado nas classificações é o número de empregados ou a receita bruta anual. Os governos federal, estaduais e municipais lançam mão de números do faturamento oficial para definir o enquadramento dessas. Apoiados nesses números e no de colaboradores, estudiosos se esforçam para uma catalogação da MPE‘s mais próxima do real. Portanto, para Soares (2002, p.47) como consequência dos diferentes critérios e fins, não existe uniformidade, pois, os parâmetros para formatação dos mapas de classificação são divergentes, gerando números diferentes.

Diversos órgãos

responsáveis por sua divulgação utilizam várias regras e conceitos. Por isso, existe uma selva de números que para um pesquisador desavisado parecem conflitantes em diversos momentos. Nosso objetivo ao levantar tais questões, não é o de tentar desacreditar qualquer uma destas instituições ou questionar seus critérios internos, mas simplesmente apontar as dificuldades do desenvolvimento de pesquisas, quando não existem normas e conceitos suprainstitucionais padronizados e acordados pela comunidade de pesquisa. Pode parecer secundário, mas Soares (2002, p. 47) critica um aspecto que considera importante destacar, que é o erro de denominar os empresários das MPEs de pequeno empresário, microempresário e pior ainda, como fez o governo ao criar a Lei Complementar nº 128, de 19/12/2008 instituindo o microempreendedor individual. Tal fato ocorre rotineiramente na academia, na imprensa falada e escrita

109

Henrique Rattner: (1924 – 2011) nome correto Heinrich Rattner, adotado Henrique aqui no Brasil pela facilidade de comunicação, economista nascido em Viena na Áustria publicou 30 livros e mais de uma centena de artigos em jornais e revistas no Brasil e em diversas outras partes do mundo, um pensador do desenvolvimento. (EDITORA SENAC [Henrique Rattner], 15 mai. 2016).

67

e em órgãos governamentais110, que, em várias publicações expressam tal discriminação. Essa classificação segregacionista desqualifica os empresários de pequenos negócios, como se suas atribuições como administrador e/ou empreendedor fossem proporcionais ao tamanho de seu empreendimento, naquele preciso momento. No entanto,

vemos

na

rica

história

empresarial

brasileira,

vários

pequenos

empreendimentos transformarem-se em grandes negócios, contrariando esta infeliz colocação.

1.2.2 – Conceito e participação das MPEs na economia brasileira Registradas as observações e preocupações, adotamos uma orientação quantitativa na categorização das MPEs, na falta de material com critérios qualitativos que nos embasasse. Apoiamo-nos, nos critérios mais largamente usados no Brasil, que são o do número de empregados combinado quando possível com o faturamento. O uso exclusivo do valor do faturamento como regra pode implicar em maior risco de erro na classificação, pois, devemos considerar a possibilidade de dissimulação de seus valores pelo empresário, tendo em vista um menor recolhimento de impostos e tributos. No Quadro 1.2 podemos observar o número nacional de 6,3 milhões de empresas111 contendo 3,7 milhões de MEIs, apurado pela pesquisa do SEBRAE; DIEESE (2013, p. 52) realizada em 2012, e identificou também a geração de 16,2 milhões de empregos formais não agrícolas. 3,6 milhões empregadores e 19,5 milhões dos ―por conta própria‖ perfazendo um total de 23,1 milhões para uma população oficial de

110

Provas da discriminação dos empresários das MPE‘s pelas entidades, órgãos do poder legislativo, judiciário e do próprio governo: MICROEMPRESÁRIO e MICROEMPREENDEDOR [Diversos]. Diversos. disponível em: a) ; b) ; c) ; d) ; e) ; f) . Acesso em: 10 mai. 2016. 111 Empresas constituídas: Os pequenos negócios empresariais são formados pelas micro e pequenas empresas (MPEs) e pelos microempreendedores individuais (MEIs). (SEBRAESP [micro e pequenas empresas em números], 01 mai. 2016).

68

204,4 milhões de pessoas112 e uma população economicamente ativa – PEA113 de 60,02 milhões. (BRASIL, IBGE 01 mai. 2016) e (SEBRAE; DIEESE, 2013, p. 27 a 39). QUADRO 1.2 – Número de estabelecimentos com e sem empregados por porte e setor de atividade econômica – Brasil 2012

Fonte: Anuário do trabalho na MPE SEBRAE; DIEESE (2013, p. 52).

O Quadro 1.3 apresenta a classificação das MPEs em relação ao seu porte utilizando isoladamente o critério, por número de empregados.

Conforme essa

regra: Microempresa no comércio e nos serviços empregam até nove pessoas e na Indústria até dezenove, enquanto as classificadas como de pequeno porte empregam respectivamente entre dez e quarenta e nove e entre, vinte e noventa e

112

População oficial: Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgadas no Diário Oficial da União, o país tinha, em 1° de julho de 2015, 204.450.649 habitantes. População projetada de 205,8 milhões de pessoas. (BRASIL, IBGE [População projeção], 01 mai. 2016 (11:00 AM)). População oficial em 2010 era de 190,7 milhões (Censo 2010). 113 População Economicamente Ativa (PEA): Compreende o potencial de mão-de-obra com que pode contar o setor produtivo, isto é, a população ocupada e a população desocupada, assim definidas: população ocupada aquelas pessoas que, num determinado período de referência, trabalharam ou tinham trabalho mas não trabalharam (por exemplo, pessoas em férias). As pessoas ocupadas são classificadas em: Empregados aquelas pessoas que trabalham para um empregador ou mais, cumprindo uma jornada de trabalho, recebendo em contrapartida uma remuneração em Dinheiro ou outra forma de pagamento (moradia, alimentação, vestuário, etc.). Incluem- se, entre as pessoas empregadas, aquelas que prestam serviço militar obrigatório e os clérigos. Os empregados são classificados segundo a existência ou não de carteira de trabalho assinada. Conta Própria - aquelas pessoas que exploram uma atividade econômica ou exercem uma profissão ou ofício, sem empregados. Empregadores - aquelas pessoas que exploram uma atividade econômica ou exercem uma profissão ou ofício, com auxílio de um ou mais empregados. Não Remunerados - aquelas pessoas que exercem uma ocupação econômica, sem remuneração, pelo menos 15 horas na semana, em ajuda a membro da unidade domiciliar em sua atividade econômica, ou em ajuda a instituições religiosas, beneficentes ou de cooperativismo, ou, ainda, como aprendiz ou estagiário. População Desocupada - aquelas pessoas que não tinham trabalho, num determinado período de referência, mas estavam dispostas a trabalhar, e que, para isso, tomaram alguma providência efetiva (consultando pessoas, jornais, etc.). (BRASIL, IBGE [Indicadores trabalho rendimento], 01 mai. 2016).

69

nove funcionários. Acima destes números as empresas são classificadas como médio e grande porte. QUADRO 1.3 – Classificação das MPEs segundo o número de empregados

Fonte: SEBRAE; DIEESE (2013, p. 17).

Completando essas informações temos outra classificação pelo faturamento bruto anual, lastreada nos valores estabelecidos pela Lei Geral da MPE114. Enquadra-se assim, como microempresa aquela que obtiver um faturamento bruto anual de até R$ 360.000,00, correspondente a um faturamento bruto médio por mês de R$ 30.000,00. Empresa de pequeno porte situa-se entre um faturamento bruto médio mensal de R$30.000,01 e R$ 300 mil equivalendo respectivamente a um faturamento bruto/ano com 0,1 centavo acima de R$ 360 mil até R$ 3,6 milhões. A importância das MPEs na economia brasileira salta aos olhos no Quadro 1.4. Apuramos que as MPEs em 2012, por representarem 99% do total de empresas, significariam aproximadamente 6,3 milhões de empresas e empregavam em torno de 23,1 milhões de brasileiros, incluindo-se aí os empregados, empresários e os chamados ―por conta própria‖115. As Micro e Pequenas Empresas são as principais geradoras de riqueza no comércio no Brasil (53,4% do PIB deste setor). No PIB da indústria, a participação das micro e pequenas (22,5%) já se aproxima das médias empresas (24,5%). E no setor de

114

Lei Geral da MPE: Lei Complementar Federal 123/2006 14/12/2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte; altera dispositivos das Leis no 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, da Lei no 10.189, de 14 de fevereiro de 2001, da Lei Complementar no 63, de 11 de janeiro de 1990; e revoga as Leis no 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e 9.841, de 5 de outubro de 1999. (BRASIL, Planalto Casa Civil [Lei Geral da MPE], 01 mai. 2016). 115 Conta-própria: Pessoa que trabalhava explorando o seu próprio empreendimento, sozinha ou com sócio, sem ter empregado e contando, ou não, com a ajuda de trabalhador não-remunerado. (BRASIL, IBGE [Notas técnicas], 04 mai. 2016).

70

Serviços, mais de um terço da produção nacional (36,3%) têm origem nos pequenos negócios. (SEBRAE, 2014, p. 6). QUADRO 1.4– Evolução da distribuição dos estabelecimentos por porte Brasil 2007 – 2012 (em %)

Fonte: Adaptado pelo autor SEBRAE; DIEESE (2013, p. 17).

Como podemos observar no Quadro 1.5 as MPEs vêm progressivamente aumentando sua relevância na economia brasileira. Constatou-se que em termos agregados (PIB116) esta participação era de 21% em 1985, aumentou para 23% em 2001 e para 27% em 2011. Esta participação aumentou tanto em serviços como no comércio tendo se reduzido um pouco na atividade industrial, onde predominam médias e grandes empresas que se beneficiam de economias de escala. (SEBRAE, 2014, p.55). QUADRO 1.5 – Evolução e Distribuição percentual do valor adicionado das MPEs Brasil – 2001 - 2011

Fonte: SEBRAE e FGV, a partir de dados do IBGE extraído SEBRAE (2014, p. 32).

116

PIB: Produto Interno Bruto representa a soma, em valores monetários, de todos os bens e serviços finais produzidos numa determinada região, durante um determinado período.

71

A pujança das MPEs é impressionante, mesmo com a economia em retrocessos o número de entrantes mantém-se elevado, entre 2011 e 2012 foi de 18,5% a média dos dois anos. Sustenta 52% dos empregados com carteira assinada e seus salários representam 40% dos pagos pelo mercado. Mas como nem tudo são flores, precisamos estudar as taxas de mortalidade que vem caindo, mas ainda são altas. Essa pujança que afirmamos acima se confirma nas informações do Quadro 1.6 que trata da constituição de empresas no estado de São Paulo no período de 1990 a 2008. QUADRO 1.6 –

72

Não podemos deixar de registrar a importância das Pequenas e Médias Empresas (PMEs) no contexto mundial, podendo passar a impressão ao leitor que essa é uma questão restrita às nossas fronteiras. Muito embora o conceito de pequena e média empresa seja diferente, pois, por exemplo, nos EUA não existe o conceito de microempresa. Além disso, para a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) a classificação de empresa exige a existência de ao menos um empregado, diferentemente de nossa visão que considera os por conta própria – empregados de si mesmo. O Gráfico 1.2 deixa muito claro que nos diversos outros países em desenvolvimento as empresas de pequeno e médio porte têm grande importância, inclusive nos países desenvolvidos como Canadá, Espanha, Itália e Nova Zelândia. Mas, o outro lado da moeda também é representativo, como a taxa de mortalidade, que consome recursos significativos dos países. ( )

GRÁFICO 1.2 – Taxa de sobrevivência internacional de empresas com até 2 anos * , para empresas com empregados (%)

Nota (*): Empresas criadas em 2007 Fonte: SEBRAE, (2013, p. 53).

73

1.2.3 – Diagnóstico da mortalidade das MPEs no Brasil Verificamos no Gráfico 1.3, fruto do estudo sobre a sobrevivência das MPEs publicado em 2013, pelo SEBRAE nacional, que, a taxa de mortalidade das MPEs em todo o território nacional, constituídas em 2007 foi de 24,4%, condição melhor a verificada no grupo das empresas constituídas em 2005 e 2006, cujas taxas de sobrevivência foram respectivamente de 26,4% e 24,9%. GRÁFICO 1.3 – Taxa de mortalidade de empresas com 2 anos, por região do país

Notas: As empresas constituídas em 2005 foram verificadas nas bases de 2005, 2006, 2007 e 2008. As empresas constituídas em 2006 foram verificadas nas bases de 2006, 2007, 2008 e 2009. As empresas constituídas em 2007 foram verificadas nas bases de 2007, 2008, 2009 e 2010. Fonte: SEBRAE (2013, p. 31).

Embora o referido estudo não capte as razões da melhora nas taxas de sobrevivência em oposição à mortalidade apontada, a tendência ao aumento da sobrevivência aqui identificada parece estar em sintonia com os avanços verificados tanto no âmbito dos negócios (p.ex. com a tendência à melhora na legislação em favor das MPE), quanto no que diz respeito à evolução das características dos próprios empreendedores brasileiros (p.ex. aumento da escolaridade e dos esforços de capacitação). Esse estudo apontou também que as taxas de sobrevivência são maiores na Indústria (79,9%) e na região Sudeste (78,2%). Os melhores índices de sobrevivência das empresas da indústria parecem estar relacionados aos requisitos de capital, conhecimento e tecnologia, que tendem a ser proporcionalmente maior

74

nesse setor, o que reduz a entrada de concorrentes e a pressão concorrencial. (SEBRAE, 2013, P. 34). No Gráfico 1.3 ainda podemos verificar algumas dessas afirmações, além de observarmos que as taxas de mortalidade em todas as demais regiões, excetuandose o sudeste, são maiores que a média nacional. Na região norte, nordeste e centrooeste chegam a ficar de 4% a 7% acima das médias do país dependendo do período comparado. Os motivos podem ser diversos, como no sudeste e no sul a economia é mais dinâmica, influenciando na logística, nos custos, no consumo, etc. Aspecto importante referencia-se no que diz respeito à estabilidade das empresas com maior estrutura no sul e sudeste que nas demais regiões do país. Sobre isso, o Mapa 1.1 e Mapa 1.2 são elucidativos, pois, nos apresentam a proporção de empregadores no total de ocupados no país em 2012 e, o percentual dos por conta própria em relação ao total de ocupados no país. Podemos observar a enorme concentração de empregadores no sul e sudeste do país, indicando empresas com maior número de empregados e, consequentemente maior estrutura. Enquanto que no Mapa 1.2 apresenta-nos uma elevadíssima participação dos ―por conta própria‖, que são empregadores de si mesmos, sem empregarem mais ninguém. Nos totais observados na Tabela 1.1 abaixo vemos que a participação dos TABELA 1.1 – Evolução da taxa de empregadores e conta própria os Brasil 2002 – 2012 (% e n . absolutos)

Período Empregadores Conta própria 2002 16,0 84,0 2012 15,4 84,6

% 100 100

Total 20.911.557 23.125.469

Fonte: adaptado pelo autor do SEBRAE (2013, p. 70).

empregadores diminuiu de 2002 a 2012, indicando também um possível aumento dos autônomos e dos optantes pelo MEI, contribuindo significativamente com os conta própria.

75 MAPA 1.1 – Proporção de empregadores no universo de ocupados

Fonte: SEBRAE; DIEESE (2013, p. 71). Obs.: Em 2012, a proporção de empregadores no total de ocupados era de: Brasil = 3,8%; Norte = 2,7%; Nordeste = 2,8%; Sudeste = 4,1%; Sul = 4,7%; Centro-Oeste = 4,6%

MAPA 1.2 – Proporção de conta própria no universo de ocupados

Fonte: SEBRAE; DIEESE (2013, p. 72). Obs.: Em 2012, a proporção de conta própria no total de ocupados era de: Brasil = 20,7%; Norte = 27,4%; Nordeste = 24,6%; Sudeste = 17,7%; Sul = 19,7%; Centro-Oeste = 19,0%

76

Outro aspecto importante de ser observado é a grande variação da renda média entre as regiões, apresentada no Gráfico 1.4. Se compararmos com a média das três regiões metropolitanas do NE (próximo da renda de Salvador), perceberemos que esta equivale a 2/3 daquela. GRÁFICO 1.4 – Renda média mensal real dos ocupados nas MPEs Regiões Metropolitanas e Distrito Federal 2012 (em R$)

Fonte: SEBRAE (2013, p. 70).

(1)

77 QUADRO 1.7 – Custo equivalente da mortalidade de empresas Equivalente a perda de recursos financeiros (por ano)

Nota: para o cálculo do custo equivalente da mortalidade de empresas em produtos, foram utilizados os valores de referências desses produtos (itens básicos) vigentes ao final de cada pesquisa de campo. Fonte: SEBRAE-SP (2010, p. 8).

Pelos cálculos do SEBRAE-SP (2010, p. 8) as perdas financeiras totalizaram R$ 15,7 e 19,6 bilhões em 2006 e 2008 respectivamente. Essas e outras perdas são de difícil reparação. Quantas bocas poderiam ser alimentadas com todo esse desperdício? Mas esse não é um problema somente do Brasil, como mostramos anteriormente o SEBRAE (2013, p. 53), extraindo de um estudo da OCDE (14/06/2013) apresentou-nos um estudo resumido no Gráfico 1.2 – Sobrevivência das PMEs em quinze países com alguns números assustadores como os da Holanda, Portugal, Hungria e Nova Zelândia com 50%, 49% e 44% (empatados os dois últimos) respectivamente. O Brasil até que está bem posicionado entre os quinze, ficando entre o 3º. e o 4º. lugares nesse mesmo período com 24,4%. Entre os fatores que provocam a mortalidade das MPEs aparece, com grande força, a falta de planejamento prévio adequado.

O problema do planejamento prévio

observa-se não ser restrito às que encerraram suas atividades, ocorrendo também nas que sobreviveram. O SEBRAE (2011, p. 14 e 15) faz as seguintes recomendações a serem seguidas pelos empresários ou futuros empresários: • Identificação da oportunidade de negócio - identificar seu diferencial - ter afinidade e gostar de atuar no segmento escolhido - buscar conhecimento atualizado do ramo - avaliar oportunidades de negócios pertinentes

78

• Estudo de viabilidade - Mercado: estudar demanda, fornecedores, concorrência - Finanças: investimento inicial, preço justo para cobrir os custos e gerar lucro • Capacitação Empresarial - profissionalização continuada da gestão - perfil empreendedor Conclui apresentando o que chama de dicas para a sobrevivência da empresa: 1) Planeje-se sempre; 2) Respeite sua capacidade financeira; 3) Não misture as finanças da empresa com finanças pessoais; 4) Fique de olho na concorrência; 5) Prospecte novos fornecedores; 6) Tenha controle do seu estoque; 7) Marketing não se resume a anúncio, invista em outras estratégias; 8) Inove, mesmo que seja um produto/serviço de sucesso; 9) Invista sempre na formação empresarial; 10) Seja fiel aos seus valores e do seu negócio.

O SEBRAE-SP (2010, p. 41) chega a conclusões muito próximas das do SEBRAE Nacional. Após identificar diversas características que apresentamos na Tabela 1.2, prescreve recomendações do Quadro 1.8. A Tabela 1.2 dá uma boa ideia de quanto o empresário das MPEs evoluiu, mas temos muito a avançar, olhando para o Quadro 1.8, nas sugestões do SEBRAE, percebemos nitidamente que o conjunto dos atores sociais, governos em todos os níveis, associações e sindicatos de classe, mas principalmente os empresários precisam se conscientizar e, agir no sentido de sua autonomia, autoconhecimento e domínio do ambiente que o cerca. TABELA 1.2 – Características dos empresários com registro da empresa na JUCESP (2007)

      

83% possuíam ensino médio completo ou mais 78% abriram ―por oportunidade‖ 64% eram do gênero masculino 62% afirmaram ter tido experiência/conhecimento anterior no ramo 67% têm familiares ou amigos donos de negócios próprios 37 anos era a média de idade de quem abriu empresa 32% estavam ocupados como empregados de empresa privada, antes da abertura da empresa. Fonte: SEBRAE-SP, (2010, p. 28-30).

79 QUADRO 1.8 – Principais recomendações SEBRAE –SP às empresas paulistas (resumo)

Itens

Principais recomendações

1 - Comportamento Empreendedor

Aprimoramento de características empreendedoras: busca de informações, planejamento e monitoramento, antecipação aos fatos, estabelecimento de objetivos e metas e contato com clientes e parceiros. O planejamento apresenta algumas deficiências, p. ex., quanto aos itens relacionados à sua ação no mercado: número de clientes e seus hábitos, número de concorrentes e fornecedores e suas práticas. Diversos itens de gestão empresarial podem ser aperfeiçoados: investimento na capacitação dos sócios e mão de obra, atualização quanto à tecnologia do setor, inovação de processos e procedimentos, acompanhamento da evolução de receitas e despesas e busca de novos mercados (p ex., análise dos concorrentes e aperfeiçoamento de produtos). Necessidade de ampliação da cobertura de ações que melhorem o ambiente empreendedor, p. ex. vendas para o governo, acesso ao credito e acesso a inovações. Crescimento da economia, estabilidade de preços e recuperação da renda precisam ser mantidos. Problemas com sócios e problemas particulares (p. ex., de saúde e de falta de segurança)

2 - Planejamento prévio

3 - Gestão empresarial

4 - Políticas de apoio 5 – Conjuntura Econômica 6 - Problemas “pessoais”

Fonte: SEBRAE-SP, (2010, p. 41).

1.3 – Perspectivas das MPES Depois de todas essas considerações sobre as MPEs e seus empresários, necessitamos pensar mais no geral que no particular, até por que além da contribuição para as minhas reflexões, esperamos poder contribuir com um grãozinho que seja para os estudos e reflexões e, quiçá para algumas mudanças positivas nesse cenário. O primeiro aspecto que aponto é a necessidade de termos muito mais estudos, além dos excelentes, realizados pelo SEBRAE e seus escritórios regionais, com o foco nas MPEs. Na atualidade, ainda, muitos estudos são desenvolvidos pelo mesmo ângulo de estudo que são feitos os estudos a respeito das grandes empresas. Isso foi necessário há cem anos, quando a realidade empresarial dos principais centros desenvolvidos

necessitava

de

uma

padronização

com

foco

nas

grandes

organizações. Essa crítica é feita por diversos autores conforme aponta Soares (2002, p. 45): Louis Jacques Filion118 é mais um dos que condena os estudos feitos sobre MPEs pelo viés das empresas de grande porte que operam em condições radicalmente diferentes. 118

Os modelos de estudo e análise baseiam-se em padrões gerais de

Louis Jacques Filion: (1945 - ) canadense é professor titular da cadeira de Empreendedorismo da escola de negócios HEC, de Montreal (Canadá), considerado por Fernando Dolabela um empreendedor acadêmico, por toda a suas contribuições ao estudo do empreendedorismo. (HEC Montreal [Louis J. Filion], 15 mai. 2016).

80

escolas da administração, que por sua vez estabeleceram suas posições e princípios lastreados nas grandes corporações. (SOARES, 2002, p. 45) Para Rattner são necessários estudos na dimensão histórica... [...] analisando o comportamento dos empresários em circunstâncias e conjunturas mutantes [...] e que torna possível observar e avaliar a capacidade das PME em assimilar, adotar e incorporar novas tecnologias na área de produção, de marketing e das técnicas contábil-financeiras mais atualizadas. (RATTNER, 1985 apud SOARES, 2002, p. 45).

Rattner (1985 apud SOARES, 2002, p. 45) propõe ainda, um esquema distinguindo características qualitativas das pequenas e grandes empresas que apresentamos a seguir no QUADRO 1.9. Rattner (1985 apud SOARES, 2002, p. 45), conclui justificando a importância da análise macroeconômica combinada à microeconômica, assim como do estudo e pesquisa dos aspectos qualitativos e quantitativos integrados: [...] torna-se necessário uma análise que abrange, desde as etapas históricas do desenvolvimento das PME, até a compreensão de sua natureza e função no processo de produção capitalista, incluindo os fenômenos de surgimento, desaparecimento, dissolução e reaparecimento das pequenas e médias unidades produtivas. (RATTNER, 1985 apud SOARES, 2002, p. 47).

Outro ângulo que faço questão de ressaltar aqui é o da imprescindibilidade de maior intervenção do setor público através de políticas públicas, não só de defesa, mas principalmente de apoio e incentivo aos empreendedores, aos empresários, estruturando, lastreando e consolidando um ambiente que contribua com os empresários e gestores em geral. QUADRO 1.9 – Características Qualitativas Distintivas das Grandes Unidades e das Pequenas Unidades Grandes Unidades

Pequenas Unidades

Diferenças acentuadas entre o trabalho de execução Pouca ou nenhuma divisão social e técnica do (direto), e de direção (POCC); trabalho; Hierarquização das funções, com predomínio de Impossível crescer e expandir-se, sem uma divisão padrões organizacionais burocráticos; de trabalho mais aprofundada; Sistema complexo de máquinas, processos e Ausência de um sistema de máquinas e equipamentos; equipamentos; Cooperação baseada em tarefas ligadas e Cooperação interdependentes; Assimilação e incorporação rápida de inovações Pouca ou nenhuma incorporação do ―progresso tecnológicas. técnico‖. Fonte: SOARES (2002, p. 46).

81

As diversas gestões dos governos de São Paulo têm se movimentado nessa direção, criando e apoiando centros tecnológicos e de pesquisas. Mas, essas políticas deveriam ser desenvolvidas de maneira mais ampla e envolvente, vinculadas aos interesses regionais e setoriais. Exemplo que posso dar é o do Arranjo Produtivo Local da Indústria da Saúde de Ribeirão Preto e Região, importante instrumento de apoio as MPEs da saúde, mas que padece, um dos motivos, por falta de maior apoio por parte dos governos federal, estadual e municipal. Apoio-me em Peter Drucker (1999, p. 9 e 10) para levantar o último aspecto necessário a ser reparado que diz respeito à cultura, paradigma de gestão das empresas. Drucker em seu livro ―Desafios Gerenciais para o Século XXI‖ trabalha com maestria apontando os problemas dos gestores afirma: Vivemos em um período de profunda transição e as mudanças são talvez mais radicais que as anunciadas na Segunda Revolução Industrial de meados do século XiX, ou que as mudanças estruturais provocadas pela Grande Depressão e II Guerra Mundial. [...] as novas realidades e suas demandas requerem uma reversão de políticas que funcionaram bem no último século e, ainda, mudança na mentalidade das organizações e das pessoas. (DRUCKER, 1999, p. 9).

Drucker (1999, p. 9 e 10) considera que na sociedade do conhecimento, não cabem mais práticas administrativas do paradigma da sociedade industrial. Ele afirma que as práticas administrativas estão presas ao passado, às práticas consideradas adequadas até o período da II Guerra Mundial. O que espanta, é que completamos setenta anos do fim da Guerra e ainda criticamos visões e práticas ultrapassadas que são implementadas na maioria das empresas. No Quadro 1.10 buscamos apresentar as sete velhas hipóteses e as novas hipóteses apresentadas por Drucker em substituição. Levanta sete hipóteses erradas para os novos tempos e as novas exigências do mercado em relação às empresas. Essas demandas ocorrem em relação a todas as empresas, independente de seu porte ou área de atuação.

82 QUADRO 1.10 – Sete hipóteses que orientavam a velha gestão e as novas sete hipóteses propostas por Drucker para a nova gestão Velhas Hipóteses

Novas Hipóteses

Administração é Administração de Negócios A Única Organização Certa Existe - ou deve existir - uma organização certa. A Única Maneira Certa para Gerenciar Pessoas Cada vez menos pessoas se subordinam, mesmo em níveis muito baixos da estrutura. Cada vez mais fala-se em trabalhadores do conhecimento, não mais como empregados e sim como associados. Tecnologias e Usuários Finais são Fixos e Determinados O Escopo da Gerência é Definido Legalmente Esta foi – e ainda é – a hipótese quase universal. Tanto na prática quanto na teoria lida-se com a entidade legal. O Escopo da Gerência é Definido Politicamente Na disciplina de gerenciamento em geral ainda se supõe que a economia doméstica, representa a ecologia de empreendimento e gerenciamento. Esta suposição é subjacente à tradicional ―multinacional‖. O Interior é Domínio da Gerência - incompatibiliza a gestão da organização com o espírito empreendedor

Administração é ADMINISTRAÇÃO (sem qualificações). Gerenciamento é o órgão específico e distintivo de toda e qualquer organização. A organização deve ser e estar adequada à tarefa ao mercado. A tarefa central é liderar pessoas. Não se ―gerencia‖ pessoas. A meta é tornar produtivos as forças e o conhecimento específicos de cada pessoa. As bases devem ser valores do cliente e suas decisões sobre a distribuição de sua renda. Em síntese a gerência deve estar voltada para o mercado. O escopo da gerência é operacional, com foco nos resultados e desempenho ao longo de toda a cadeia econômica. As fronteiras nacionais são importantes principalmente como restrições. A prática da gerência, e não apenas para empresas, terá de ser definida operacionalmente e não politicamente. Os resultados de qualquer instituição existem somente no exterior.

Fonte: a partir de DRUCKER (1999, p. 13 a 41).

Em relação às perspectivas das MPEs, o surgimento de novas empresas tem se concentrado justamente naqueles segmentos (comércio e serviços) onde já se encontra a maior parte das empresas pode ser explicado pelo fato destes segmentos apresentarem menores barreiras à entrada: a tecnologia é de fácil acesso e a necessidade de capital é relativamente baixa. Porém, essa facilidade à entrada pode implicar também maior concorrência, menor rentabilidade e maior número de ―saídas‖, ou seja, maior volume de empresas que fecham. A alteração desse quadro está

diretamente

vinculada

ao

aprimoramento

dos conhecimentos

e

das

capacidades de articulação dos empresários das MPEs. 1.4 – Impasses na vida de um professor de empreendedorismo para administradores Devido ao meu envolvimento com os estudos sobre empreendedorismo, particularmente os estudos preparatórios de minha dissertação de mestrado, e outros estudos que vinha desenvolvendo através de meu escritório da CAPTA

83

Projetos119, e, mais especificamente minha prática empreendedora, qualificaram-me a produção de grades curriculares de disciplinas de empreendedorismo em diversas faculdades, cursos de extensão cultural e de pós-graduação.

1.4.1 – Educador empreendedor ou empreendedor educador? Há pouco mais de quinze anos, no início do século XXI a discussão sobre empreendedorismo

pululava

nas

Instituições

de

Ensino

Superior

(IES),

concentradamente nas de administração, pois, os administradores sentiam a necessidade prática no que diz respeito à gestão. Estudar, entender, aplicar pessoalmente e na gestão. Muitas IES começaram a demandar a inclusão da disciplina Empreendedorismo em sua grade. Fui inicialmente convidado para Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) para as Faculdades Alcântara Machado (FAAM) e Faculdades Oswaldo Cruz (FOC), todas na cidade de São Paulo. Posteriormente foram diversas outras. Mas, surge ai um problema! Seria eficiente e eficaz, ou mesmo adequado, o ensino do empreendedorismo num curso de administração isolado das demais disciplinas? Claro que não, os coordenadores dos cursos sabiam disso, e as normas do Ministério da Educação determinam a necessária articulação das disciplinas. Mas como programar essa articulação com as demais disciplinas sem combinar ou discutir com os demais professores? E as resistências? Empreendedorismo passaria a ser uma disciplina eixo do curso, e as demais disciplinas teriam essa orientação? Ou seria mais uma disciplina como uma optativa para conhecimento geral? Como lidar com a fogueira das vaidades? Bem, essa integração não ocorreu e a disciplina de empreendedorismo ficou como mais uma na grade, despertando um interesse variado de diversos alunos. Uns interessados realmente no empreendedorismo, ou intraempreendedorismo, outros curiosos, interessados em saber com o que se relacionava, qual a real utilidade para agregar valor a sua carreira, mas a maioria – nada de extraordinário – via como mais 119

CAPTA Projetos: É uma empresa de consultoria e treinamento organizacional que acredita na força do trabalho em parceria. A excelência da rede de parceiros, integrados a um objetivo comum, assegura o desenvolvimento de projetos e soluções em diversas áreas, organizados de acordo com os interesses e as necessidades dos nossos clientes. No ambiente da rede, a CAPTA Projetos detém a governança e responsabilidade dos trabalhos desenvolvidos. (CAPTA PROJETOS, Odair Soares, 29 mai. 2016).

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uma disciplina a ser decorada e feitas as tarefas e a prova. Com isso perdemos a eficiência e eficácia da disciplina, e, do curso, perdendo diversas oportunidades de ter cursos de administração diferenciados. Depois de todas essas experiências, me senti como mais um professor ministrando uma disciplina com algumas poucas conexões com as outras diversas disciplinas. Mas, a disciplina de empreendedorismo chegou a incomodar a estrutura estabelecida. Alguns professores deram mais apoio a disciplina, a maioria, mais uma vez, ficou apática a essa novidade. Essas experiências apontaram na direção da necessidade de uma real e verdadeira visão e prática interdisciplinar. Essa

experiência

pode

nos mostrar

vivamente

como

num

horizonte

da

administração, de pequenas e médias empresas educacionais, está extremamente presa a uma prática de mensuração de resultados quantitativos, e muito pouco qualitativos. A interdisciplinaridade pregada no discurso passa a margem da prática pedagógica. O professor administrador acaba sendo conformado pelo status quo, o mesmo acontecendo com seus pares e com os alunos.

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Capítulo 2 – Bases e Perspectivas do Empreendedorismo Quem não sabe o que busca, não identifica o que acha Immanuel Kant Os grandes navegadores devem sua reputação aos temporais e às tempestades Epicuro

Nesse capítulo, tratamos de diversas visões sobre empreendedorismo. Resgatamos as primeiras ideias mais gerais até a formação de um campo específico de estudo e pesquisa. Retratamos a atualidade do empreendedorismo no Brasil e no mundo, apresentando ao final algumas perspectivas. Resgatamos na biografia do autor a experiência de ter organizado uma visita em 2005 com os jovens empreendedores da Associação Comercial de São Paulo a Santa Rita do Sapucaí (MG), na expectativa de demonstrar a importância de um ecossistema empreendedor para o desenvolvimento local e regional; e, posteriormente em 2006 realizando pesquisas sobre essa cidade considerada uma das mais empreendedora do país. No dialeto Kanji chinês120, o ideograma crise é composto por outros dois ideogramas com significados aparentemente opostos: problema e oportunidade, conforme demonstra a Figura 2.1. Se por um lado crise representa um risco, por outro pode ser um prenúncio favorável para alguma realização. Olhando para a história do desenvolvimento da humanidade, damos razão a Schumpeter121 e sua Teoria da Destruição122 Criativa, observando que os grandes saltos tecnológicos ocorreram na busca por solução de grandes problemas. Assim, a sabedoria milenar chinesa 120

Kanji chinês é mais antigo só tem uma leitura (pronúncia), diferente do Kanji japonês que tem várias leituras e é originário do chinês. (CASA DO CONHECIMENTO, 17 ago. 2015). 121 Joseph Alois Schumpeter: (1883 – 1950) foi um economista e cientista político austríaco. É considerado um dos mais importantes economistas da primeira metade do século XX, e foi um dos primeiros a considerar as inovações tecnológicas como motor do desenvolvimento capitalista. (WIKIPEDIA [Joseph Schumpeter], 10 jun. 2016). 122 Teoria da Destruição Criativa ou Criadora: Processo observado/desenvolvido por Joseph Alois Schumpeter que ocorreria a cada decênio, num rompimento do elo mais fraco da cadeia econômica mundial. Empresário (Empreendedor) inova, ocorre uma difusão dessa e, finalmente sua exaustão e crise. Explicando de uma outra forma, ocorre um ciclo de desenvolvimento de uma determinada combinação dos fatores de produção (terra, trabalho, capital, tecnologia e pessoas), sendo que esse ciclo tem duração aproximada de uma década Ao final desse período, ocorre um esgotamento dessa composição. Na crise surge uma nova composição dos fatores produtivos que dá início a um novo ciclo. Algumas questões devem ser destacadas, a primeira diz respeito à duração do ciclo de uma década, essa regularidade foi observada por Schumpeter no final do século XIX e nos primeiros 40 anos do Século XX. Segundo, Schumpeter observa que por mais intensa que seja a crise, no processo macro histórico-econômico e social quando observado o conjunto dos ciclos detecta-se um desenvolvimento, apesar das sucessivas crises. A terceira questão que merece ser realçada é que Schumpeter distingue a importância dos empreendedores os primeiros a enxergar as novas combinações dos fatores de produção e assumirem o risco, dando o start em um novo ciclo de desenvolvimento. (WIKIPEDIA [Destruição criativa ou criadora], 01 jun. 2016).

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apresentada pelo ideograma kanji da crise se mostra em toda sua profundidade de significados. FIGURA 2.1 – Grafia do termo crise no dialeto Kanji chinês

PROBLEMA

OPORTUNIDADE

Fonte: CASA DO CONHECIMENTO (17 ago. 2015).

Sobre a crise, Japiassu e Marcondes (2001, p. 45) afirmam que, em seu conteúdo mais amplo, geral ―significa uma mudança decisiva no curso de um processo, provocando um conflito ou um profundo estado de desequilíbrio‖. Reforçando nossa visão, lançamos mão de Japiassu (1983, p. 15) onde enfatiza que o conhecimento nasce da dúvida e alimenta-se da incerteza. Muitos foram os momentos de dúvidas e incertezas em minha trajetória de vida. Os principais foram o falecimento repentino de minha esposa e a luta em defesa de ideais, momentos de crise apresentando enormes problemas, quando por eventos alheios

a

minha

vontade

ou,

por

situações

provocadas,

vivenciei

a

interdisciplinaridade e o empreendedorismo. Diz um ditado americano ―Se a vida lhe atira um limão, faça uma limonada‖. Dessa forma, apresentei uma postura interdisciplinar para aprender com a nova existência, ainda que desconhecesse, à época, os seus princípios fundadores, como a humildade na resignação aos acontecimentos, paciência com a realidade, desapego e respeito em relação aos ideais. Tanto na morte de um ente querido, quanto na defesa de ideais, temos que respeitar o próximo para sermos respeitados, analisar o ambiente por diversos ângulos, perseguindo diuturnamente a coerência entre teoria e prática, entre as palavras e sua aplicação, é outro aspecto fundamental para garantirmos a manutenção da

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direção rumo a alguns preciosos objetivos, buscando um mínimo de planejamento e controle de nossas vidas. Diferentemente de décadas passadas, quando empreendedores corriam atrás de realização de seus sonhos isoladamente, hoje o empreendedorismo constitui-se num movimento econômico e social. Buscando melhor entendê-lo, desmistificando o processo e o personagem, demonstramos nas próximas páginas sua evolução pari passu ao desenvolvimento do mercado e da economia mundial através de uma breve retomada histórica.

2.1 – Retrospectiva das abordagens sobre o empreendedorismo O termo entre-preneur originou-se na língua francesa, segundo Filion (1999b apud SOARES, 2002, p. 15), como vários outros da administração, e foi assumindo com o passar do tempo diversos significados.

No século XII referia-se àquele que

agenciava brigas de rua, no século XVII representava uma pessoa que chamava para si a responsabilidade e comandava uma ação militar. Somente no final do século XVII passou a ser usado para referir-se à pessoa que ―criava e conduzia projetos‖ ou ―criava e conduzia empreendimentos‖. No segundo quartel do século XVIII, Richard Cantillon (1950 apud SOARES, 2002, p. 16) em sua obra ―Ensaio Sobre a Natureza e o Comércio em Geral‖, deu ao termo empreendedor significado próximo do atual como sendo uma pessoa que comprava matéria-prima (insumo), processava-a e vendia-a como semiacabado para outros ou já como produto acabado. O empreendedor era aí, uma pessoa que identificava uma oportunidade de negócio, assumia um risco ao adquirir, processar e revender um produto. Vejamos a seguir, algumas visões sobre a figura do empreendedor e seu papel na sociedade.

2.1.1 – Primeiros estudos sobre o empreendedorismo Em meados do século XVIII o banqueiro Richard Cantillon, definido hoje como um capitalista de risco, apontou através de seus escritos as preocupações de um homem à procura de oportunidades de negócios. Era capaz de identificar

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lucratividade e potencialidades dos negócios através de observação e estudo. (SOARES, 2002, p. 16). Jean-Baptiste Say123 foi o

segundo autor a

trabalhar com a

ideia do

empreendedorismo. No início do século XIX, em seu Tratado de Economia Política formula a Lei dos Mercados, conhecida Lei de Say, segundo a qual a produção criaria sua própria demanda, impossibilitando uma crise geral de superprodução. (SOARES, 2002, p. 17). Segundo Say (1983 apud SOARES, 2002, p. 17) não existem obstáculos insuperáveis para o desenvolvimento, não existem limites para o enriquecimento de uma nação. O bem-estar de um país depende da sua população ativa, do progresso técnico e do dinamismo de seus empresários. Say é considerado por Filion (1999b apud SOARES, 2002, p. 17) como o ―pai do empreendedorismo‖ por ter sido pioneiro na exposição de suas bases. Distinguia os empreendedores dos capitalistas, associava os primeiros à inovação e consideravaos agentes de transformações econômicas e sociais. O empreendedorismo foi reconhecido e elogiado inclusive pelo economista socialista Karl Marx, que segundo Henry Mintzberg124: [...] estranhamente, foi um deles [economistas que elogiavam o empreendedorismo]. Ele elogiava os empreendedores como agentes de mudanças econômicas e tecnológicas, mas criticava fortemente seu impacto sobre a sociedade em geral. (MINTZBERG, 2000, p. 100-101).

No entanto, foi Joseph Alois Schumpeter na primeira década do século XX quem realmente lançou o campo do empreendedorismo, associando-o mais claramente à inovação, afirmando: A essência do empreendedorismo está na percepção e no aproveitamento das novas oportunidades no âmbito dos negócios [...] sempre tem a ver com criar uma nova forma de uso dos recursos nacionais, em que eles sejam 123

Jean-Baptiste Say: (1767 – 1832), economista francês, publicou diversos livros e um periódico. Desenvolveu a conhecida Lei de Say, que afirma que a oferta de um produto, sempre gera demanda por outros produtos; e ainda que a oferta cria sua própria demanda. Responsável por cunhar o termo empreendedor na língua francesa entrepreneur. (WIKIPEDIA, [Jean Baptiste Say], 15 mai. 2016). 124 Henry Mintzberg: (1939 - ) canadense de Montreal é um renomado acadêmico e autor de diversos livros na área de administração. Ele é Ph.D. pela MIT Sloan School of Management e atualmente é professor na McGill University, no Quebec, Canadá, onde leciona desde 1968, após ter concluído seu Mestrado em Gerência no MIT. (WIKIPEDIA, [Henry Mintzberg], 15 mai. 2016).

89 deslocados de seu emprego tradicional e sujeitos a novas combinações. (SCHUMPETER, 1982 apud SOARES, 2002, p. 17).

Schumpeter (1961, p. 89 e 90) não só associou os empreendedores à inovação, como também apontou em sua significativa obra ―A Teoria do Desenvolvimento Econômico‖ os empreendedores como propulsores do desenvolvimento econômico. Nesse contexto apresenta-nos a Teoria da Destruição Criativa ou Criadora. De forma sintética a Figura 2.2 busca demonstrar esse processo com realce à inovação promovida pelo empreendedor, ao qual Schumpeter chama de empresário inovador. Assim, o empreendedor inova e essa inovação é difundida até sua completa exaustão, quando esse ciclo entra em crise.

FIGURA 2.2 – Síntese d/P
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