UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Análise dos impactos da produção, comercialização e consumo de transgênicos no Brasil

January 16, 2017 | Author: Benedicto Canedo Martinho | Category: N/A
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1 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES Análise dos impactos da produ&cc...

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES

Análise dos impactos da produção, comercialização e consumo de transgênicos no Brasil

Daniel Eduardo Neves

Orientadora: Profa.Dra.Flávia Mori Sarti

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao bacharelado em Gestão de Políticas Públicas da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.

São Paulo 2012

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES

Análise dos impactos da produção, comercialização e consumo de transgênicos no Brasil

Daniel Eduardo Neves

Orientadora: Profa.Dra.Flávia Mori Sarti

São Paulo 2012

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Avaliação do Trabalho de Conclusão de Curso Título: Análise dos impactos da produção, comercialização e consumo de transgênicos no Brasil Autor: Daniel Eduardo Neves Ano: 2012

Profa.Dra.Flávia Mori Sarti

Nota:

Orientadora

[Nome do Convidado à Banca] Participante da Banca de Avaliação

Nota:

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Dedicatórias e Agradecimentos Gostaria de dedicar este presente trabalho especialmente à minha Avó Ida Ghirelli Rodrigues (in memoriam) e aos meus pais Luiz e Márcia que muito me ensinaram durante a minha vida e de quem tenho muito orgulho e espelho de dedicação, sucesso e comprometimento; aos meus irmãos Luiz e Letícia com quem pude compartilhar os momentos mais importantes da minha vida; à minha orientadora Flavia Mori que me auxiliou do começo ao fim com o tema e aceitou trabalhar com esse assunto polêmico; à minha namorada Júlia que sempre me incentivou e lutou comigo para alcançar os meus objetivos; aos meus colegas de sala, especialmente Yuri, João, Enzo, Danilo, Kayo, André e Beatriz que dividiram esse período acadêmico de novas experiências e amadurecimento; aos meus familiares por acreditarem sempre em meu potencial intelectual e prestativo; aos meus amigos de infância que incentivaram a minha criatividade; aos meus amigos do colégio que dividiram os momentos mais difíceis e os mais alegres; aos amigos da vida que sempre estiveram prontos para ouvirme e aconselhar-me; aos meus professores e colaboradores da Universidade de São Paulo, em especial os professores Dr. Wagner Iglesias e o professor Dr. Marcelo Nerling, por me incentivarem a sede pelo saber; ao Colégio Sagrado Coração de Jesus que muito me ensinou os princípios da vida, da cidadania e da cultura; um especial agradecimento aos amigos: Rodrigo, Luan, Felipe, Cyro, Rafael, Enrico, Letícia, Fabio, Flavio, Henrique, Sergio, Alexandre, Eduardo, Paula, Isabel, Pedro, Renan, Felipe, Guilherme, Caio, Bruno, Gabriel, Ricardo, Gustavo, Luis, Vitor, Sandra, Augusto, Ivan, Saulo, Fernando, Carlos, Aline, Eric, Alexandre, Raphael, Rafael, Evandro, Thamiris, Juliana, Priscila, Desiree, Fernanda, Andre, Amanda, Amauri, Khalil, Arthur, Beatriz, Marcos, Marcelo, Julio, Bruna, Daniela,Elisa, Marina, Elizabeth, Vivian, José, Esteban, Vinicius, Giovana, Luisa, Hsu, Jacques, Cecilia, Jean, Joao, Julia, Lara, Silvia, Leandro, Leonardo, Lucas, Luciano, Manoel, Pablo, Patrick, Renato, Diogo, Rodolfo, Thiago, Victor, Paulo e Wilma, por fazerem parte da minha vida e dividirem comigo os momentos mais importantes. E por fim, dedico esse trabalho a ciência, para que as novas gerações possam estudar mais a fundo e desenvolver novas teorias para o bem da humanidade.

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Sumário

Introdução ............................................................................................................................................... 9 Abordagens teóricas da produção de alimentos .................................................................................... 10 Objetivos ............................................................................................................................................... 14 Objetivo geral .................................................................................................................................... 14 Objetivos específicos ........................................................................................................................ 14 Metodologia .......................................................................................................................................... 15 Produção agrícola no Brasil e no mundo .............................................................................................. 16 Produção agrícola no mundo ............................................................................................................. 16 Produção agrícola no Brasil .............................................................................................................. 19 Transgênicos: Histórico e definição ...................................................................................................... 22 A produção mundial de transgênicos ................................................................................................ 22 A produção de transgênicos no Brasil ............................................................................................... 25 Vantagens e desvantagens dos transgênicos ......................................................................................... 28 Vantagens .......................................................................................................................................... 28 Desvantagens..................................................................................................................................... 29 Considerações finais.............................................................................................................................. 32 Referências ............................................................................................................................................ 35

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Lista de Tabelas e Figuras

Figura 1. Representação do modelo utópico da problematização da produção de alimentos mundial. . 13 Figura 2. Representação do modelo real da problematização da produção de alimentos mundial. ....... 13 Tabela 1. Produtividade agrícola dos maiores produtores mundiais. ..................................................... 16 Tabela 2. Principais países importadores de produtos agrícolas. 2010. ................................................. 17 Figura 3. Maiores produtores agrícolas mundiais. ................................................................................. 18 Figura 4. Mapa das terras cultiváveis no mundo. ................................................................................... 19 Tabela 3. Desempenho das exportações no Brasil. 2010. ...................................................................... 20 Figura 5. Avaliação da safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas. ...................................... 20 Tabela 4. Área de plantio baseado em biotecnologia, em milhões de hectares. 1996-2010. ................. 23 Tabela 5. Área de plantio baseado em biotecnologia, segundo país. ..................................................... 23 Tabela 6. Área global de plantio baseado em biotecnologia, em milhões de hectares. .......................... 24 Figura 6. Mapa dos países adotantes de biotecnologia. 2010................................................................. 25 Figura 7. Produção de grãos brasileira. .................................................................................................. 26 Figura 8. Exportação de soja do Brasil. 1999-2010. .............................................................................. 27 Tabela 8. Benefícios econômicos estimados da adoção de biotecnologia por tipo de cultura e por tipo de resultado. 1996-2009. ............................................................................................... 28 Figura 9. Representação de modelo possível de produção agrícola a partir de entrada da produção de transgênicos no mercado. ................................................................................................ 33 Tabela 9. Análise dos retornos decorrentes do uso da semente transgênica, em reais. .......................... 33

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Lista de Abreviações ABRACEX - Associação Brasileira de Comércio Exterior

ABRASEM - Associação Brasileira de Sementes e Mudas CTNBio - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

EACH - Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo EUA - Estados Unidos da América

FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas

ICONE- Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

NECSI - New England Complex Systems Institute

OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico OGM's - Organismos Geneticamente Modificados OMC - Organização Mundial do Comércio OMS - Organização Mundial de Saúde ONU - Organização das Nações Unidas PIB - Produto Interno Bruto UE - União Européia VAP - Variedade Alta de Produtividade

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Resumo

Daniel Eduardo Neves. Análise dos impactos da produção, comercialização e consumo de transgênicos no Brasil. São Paulo, 2012.

O presente trabalho busca apresentar informações quanto aos impactos da produção e

investimento em sementes transgênicas, especialmente no que tange à geração de uma série de externalidades à produção agrícola e ao desenvolvimento econômico do país. Há diversos fatos e mitos em torno do tema, resultando em exageros injustificáveis nos discursos

maniqueístas baseados em opiniões extremistas favoráveis ou desfavoráveis à produção de

transgênicos. A pesquisa quanto ao potencial dos transgênicos é extremamente importante e complexa, sendo assim, o presente trabalho de conclusão de curso adotou um enfoque analítico quanto aos principais indicadores de consumo e produção de sementes transgênicas no país.

Palavras-chave: transgênicos, agricultura, balança comercial, biotecnologia, políticas públicas.

Abstract

Daniel Eduardo Neves. Analysis of the impacts of transgenetics production, commercialization and consumption in Brazil. São Paulo, 2012.

This study aims to present information regarding the impacts of the production and

investment in transgenetics, especially in relation to the generation of a number of externalities for agriculture and economic development of the country. There are several

myths and facts on the subject, resulting in unjustifiable exaggerations on maniqueus discourses based upon extremist opinions in favor or opposite to the transgenetics production.

Research on the potential of transgenetics is extremely important and complex, thus, the present monograph adopted an analytical focus in relation to the main indicators of transgenetics consumption and production in Brazil.

Keywords: transgenetics, agriculture, trade balance, biotechnology, public policies.

Resúmen

Daniel Eduardo Neves. Análisis del impacto de la producción, comercialización y consumo de transgénicos en Brasil. São Paulo, 2012.

El presente estudio tiene como objetivo presentar informaciones de los impactos de la

producción y inversión en los transgénicos, especialmente en relación a la generación de una

serie de externalidades a la producción agrícola y el desarrollo económico del país. Hay

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muchos factos y mitos en torno del asunto, resultando en exagero injustificable en los discursos maniqueos basados en opiniones extremistas favorables o desfavorables a la producción de transgénicos. A investigación del potencial de los transgénicos es

extremamente importante y compleja, así, el trabajo adoptó un enfoque analítico cuanto a los principales indicadores de consumo y producción de transgénicos en Brasil.

Palabras-clave: transgénicos, agricultura, balanza comercial, biotecnología, políticas públicas.

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Introdução

A população mundial recentemente alcançou 7 bilhões de pessoas e estima-se que

atingirá 9 bilhões de habitantes até 2050. Segundo projeções da FAO, a produção de alimentos deve ser duplicada nas próximas quatro décadas para satisfazer as necessidades nutricionais da população mundial (OECD/FAO, 2012).

A escassez de novas fronteiras aráveis para incremento da área de produção agrícola impõe o desafio de duplicação da produção a partir das áreas atualmente ocupadas. Alguns

autores defendem a necessidade de uma nova revolução verde, similar à aceleração do ritmo de produção agrícola ocorrida na década de 1960, cujo incremento de produtividade foi

decorrente da utilização de defensivos, fertilizantes e novas técnicas de plantio (ROSA, 1998; MARINHO, MINAYO-GOMEZ, 2004).

Os avanços atuais em melhoria genética de sementes, sobretudo a partir do

desenvolvimento de variedades transgênicas resistentes à seca e às pragas, são potencialmente geradores de uma nova revolução verde (MARINHO, MINAYO-GOMEZ, 2004).

Um dos poucos países que ainda apresenta grandes extensões de terras cultiváveis

inexploradas é o Brasil. A elevação da produtividade média nas terras atualmente utilizadas para produção agrícola no país tem postergado a necessidade de exploração das áreas inexploradas.

O presente trabalho busca apresentar informações quanto aos impactos da produção e

investimento em sementes transgênicas, especialmente no que tange à geração de uma série de externalidades à produção agrícola e ao desenvolvimento econômico do país. Há diversos fatos e mitos em torno do tema, resultando em exageros injustificáveis nos discursos

maniqueístas baseados em opiniões extremistas favoráveis ou desfavoráveis à produção de transgênicos.

A pesquisa quanto ao potencial dos transgênicos é extremamente importante e complexa, sendo assim, o presente trabalho de conclusão de curso adotou um enfoque analítico quanto aos principais indicadores de consumo e produção de sementes transgênicas, assim como seus impactos na balança comercial do país.

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Abordagens teóricas da produção de alimentos

A abordagem dos problemas relativos à produção de alimentos é alvo de diferentes

arcabouços teóricos, enunciados a partir de importantes teses e marcos históricos que buscaram analisar a relação entre crescimento populacional, produtividade das terras agricultáveis, limitação territorial, fome e consumo dos alimentos.

Thomas Robert Malthus, economista britânico, foi pioneiro no uso de dados primários

na constituição de sua teoria do controle do aumento populacional (malthusianismo). A partir da constatação de incremento em progressão geométrica da população, face ao incremento em

progressão aritmética da produção de alimentos, postulou a ocorrência de esgotamento das áreas cultiváveis (fator de produção fixo) e redução da oferta de alimentos per capita, resultando em fome e guerras baseadas em disputas territoriais (MALTHUS, 1798).

O fracasso das previsões malthusianas, tendo em vista a aceleração da produção agrícola pelo desenvolvimento tecnológico ao longo das décadas seguintes (SILVA, 2004), demonstrou o impacto do fator progresso técnico, desconsiderado por Malthus, na produção agrícola e, consequentemente, na manutenção da sobrevivência populacional.

Durante a década de 1940, algumas instituições privadas, como Instituto Rockefeller e Fundação Ford, iniciaram investimentos em pesquisa de melhoramentos genéticos de

sementes no México e nas Filipinas, denominadas Variedades de Alta Produtividade (VAP) (ROSA, 1998).

Concomitantemente, a indústria química mundial direcionava sua produção ao setor

agrícola, comercializando e incentivando o emprego de diferentes tipos de agrotóxicos para

eliminação de fungos, insetos e ervas daninhas: herbicidas, fungicidas, inseticidas e fertilizantes químicos; enquanto a indústria metalomecânica desenvolvia maquinário pesado:

tratores, colheitadeiras e demais equipamentos utilizados em diversas etapas da produção agrícola, desde o plantio até a colheita (ROSA, 1998).

Ao término da Segunda Guerra Mundial, o período de tensões denominado Guerra Fria,

foi marcado pela polarização mundial entre dois extremos ideológica e economicamente opostos: a União Soviética, liderando o bloco socialista, e os Estados Unidos da América, no comando do bloco capitalista (HOBSBAWM, 1995).

O imbricado cenário geopolítico mundial impõe uma argumentação política, social e econômica sobre a busca de melhoria da produtividade agrícola. Assim, a partir de 1950,

vários países buscaram adotar as inovações tecnológicas na produção agrícola de forma intensiva, inclusive o Brasil, de forma a tornarem-se competitivos no comércio internacional.

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A partir de meados do século XX, o progresso tecnológico aplicado à produção agrícola foi determinante aos ganhos de produtividade que resultaram em significativas alterações das relações campo-cidade, a partir da denominada Revolução Verde. O termo foi cunhado em 1966 por Wiliam Gown (ANDRADES, GANIMI, 2007) durante uma conferência em Washington, DC, que anunciou o potencial impacto de novas tecnologias na produção agrícola como: “a Revolução Verde, feita a base de tecnologia, e não do sofrimento do povo”.

O problema da fome tornava-se cada vez mais sério em várias partes do mundo, e o governo americano e os grandes capitalistas temiam que se tornasse elemento decisivo nas tensões sociais existentes em muitos países, o que poderia ampliar o número de nações sob o regime comunista, particularmente na Ásia e na América Central, tradicionais zonas de influência norte-americana (ROSA, 1998, p. 19).

Durante a década de 1970, a intensificação da produção agrícola, a partir do uso de ŀ

máquinas, insumos e sementes selecionadas, foi outro marco histórico da trajetória da agricultura mundial. Norman Ernest Borlaug, agrônomo norte-americano ganhador do prêmio Nobel da Paz de 1966, incentivou a instauração de novas práticas agrícolas, sendo denominado pai da Revolução Verde (MARINHO, MINAYO-GOMEZ, 2004). A modernização da agricultura promovida pela Revolução Verde torna-se, assim, um processo marcado pela conjuntura social, política e econômica que permitiu sua implantação em nível mundial, demarcando uma revolução à medida que apresenta causas e impactos bastante além da mera adoção de inovações tecnológicas na produção de alimentos. No entanto, o aumento da produtividade agrícola obtido a partir da Revolução Verde não foi suficiente à eliminação da escassez na produção de alimentos mundial. Ademais, a expansão agrícola tem sido alvo de críticas pela persistência da má distribuição dos alimentos, associada à agressão ao meio ambiente (MARINHO, MINAYO-GOMEZ, 2004). A população mundial apresentou significativo crescimento a partir de meados da década de 1960 (LAM, 2007), uma situação que não deve ocorrer novamente.

Não há dúvidas de que as taxas de crescimento da população mundial diminuirão [...]. A taxa é tão alta porque há muitas

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mulheres

em

idade

reprodutiva

nos

países

em

desenvolvimento como resultado do rápido crescimento da população nas décadas anteriores. Atravessamos períodos de taxas de crescimento absolutamente sem precedentes. No entanto, a produção de alimentos cresceu ainda mais rápido que

a

população

e

as

taxas

de

pobreza

caíram

substancialmente.

O crescimento populacional das últimas décadas, aliado à consolidação do processo de transição demográfica, tem reavivado preocupações quanto à possibilidade de uma crise de abastecimento alimentar. David Lam, economista da Universidade de Michigan, observa que, apesar do crescimento da população mundial, a produção agrícola ainda tem sido suficiente para evitar crises de fome e pobreza nos últimos anos. Segundo Lam, uma variedade de fatores combinados contribuiu para redução do impacto do incremento populacional, entre as quais destaca, particularmente, a Revolução Verde e a capacidade dos centros urbanos de absorver o contingente populacional adicional (LAM, 2007). ̽

No entanto, deve-se destacar que as necessidades nutricionais da população mundial em crescimento apresentam algumas particularidades, tal como a necessidade de incremento de proteínas na dieta de países em desenvolvimento, principalmente China, Índia, Brasil e Rússia. Tais populações têm obtido crescimento de poder aquisitivo, buscando complementar a alimentação básica com alimentos proteicos anteriormente inacessíveis ao consumo geral. As soluções viáveis à satisfação da crescente demanda por alimentos incluem a busca por redução de desperdício, ocupação de novas fronteiras produtivas, aumento da eficiência produtiva e, novamente, incremento tecnológico na produção agrícola. Destacam-se, particularmente, os avanços na biotecnologia para produção de alimentos, tanto via melhoramento genético convencional (cruzamentos das espécies existentes e seleção de sementes mais produtivas, potencializando a capacidade de produção das lavouras), quanto pelo desenvolvimento de sementes transgênicas (inserção de material genético diferente nas sementes para melhoria da resistência a pragas ou condições climáticas adversas, assim como incremento do conteúdo nutricional). Tecnicamente, é possível delinear uma representação do modelo utópico, onde o crescimento populacional seria um incentivo à busca pelo aumento da produtividade para redução da fome (Figura 1), mesmo face a uma limitação territorial.

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Crescimento Populacional Modelo Utópico Produtividade

Consumo

Limitação Territorial

Fome

Figura 1. Representação do modelo utópico da problematização da produção de alimentos mundial. Entretanto, uma abordagem mais realista inicia-se pelo incremento populacional, impulsionado pelo aumento da produtividade agrícola e pressionado pela limitação territorial, resultando em necessidade de elevação do consumo alimentar global e gerando fome (Figura 2).

Crescimento Populacional Modelo Real Produtividade

Consumo

Limitação Territorial

Fome

Figura 2. Representação do modelo real da problematização da produção de alimentos mundial.

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Objetivos Objetivo geral Apresentar informações quanto aos impactos da produção e investimento em sementes transgênicas, especialmente no que tange à geração de uma série de externalidades à produção agrícola e ao desenvolvimento econômico do país.

Objetivos específicos •

Apresentar a importância da adoção de novas tecnologias na produção agrícola como forma de promover políticas públicas para erradicação da fome;



Analisar evidências e dados relativos aos Organismos Geneticamente Modificados (OGMs);



Abordar analiticamente alguns dos principais indicadores de consumo e produção de sementes transgênicas, assim como seus impactos na balança comercial do país.

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Metodologia A metodologia utilizada no presente trabalho consistiu em análise documental e bibliográfica, a partir de busca de referências na literatura acadêmica sobre biotecnologia, organismos geneticamente modificados, transgênicos, produção agrícola e seus impactos na balança comercial brasileira. O levantamento documental na temática do trabalho incluiu bases de dados bibliográficas (Scielo e outras), organizações internacionais (Food and Agriculture Organization, World Bank, Organisation for Economic Co-Operation and Development, World Health Organization, Organização Mundial do Comércio, entre outras), setor privado (como International Service for the Acquisition of Agri-Biotech Applications), organizações governamentais (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Ministério da Agricultura e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, entre outras) e organizações nãogovernamentais (como ESPLAR Centro de Pesquisa e Assessoria). A síntese do material obtido, acompanhada de dados quantitativos sobre a produção, comercialização e consumo de transgênicos, foi utilizada para análise do panorama atual da adoção e potencial impacto da nova tecnologia no Brasil e no mundo.

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Produção agrícola no Brasil e no mundo Segundo a OCDE/FAO (2012), a agricultura constitui a base da balança comercial em diversos países, principalmente nações da América Latina, sudeste asiático e África, considerados subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. A produção agrícola em diferentes países apresenta características particulares, ligadas ao acesso e à possibilidade de adoção de novas tecnologias, ao clima e à disponibilidade de áreas de plantio. Tais variáveis, por sua vez, influenciam diretamente o valor da produção agrícola e seu impacto na balança comercial do país.

Produção agrícola no mundo Nos últimos 50 anos, os ganhos de produtividade na agricultura resultaram de dois principais fatores: introdução de modernas técnicas agrícolas (especialmente mecanização, uso de insumos químicos e irrigação) e uso intensivo de cultivares com alto potencial de produção (obtidos em programas de melhoramento vegetal desenvolvidos em universidades e institutos de pesquisa). Contudo, o ritmo de crescimento da produtividade agrícola tem desacelerado desde a metade da década de 1980. Uma das principais causas parece residir no esgotamento da capacidade de obtenção de variedades mais produtivas a partir de técnicas tradicionais de melhoramento vegetal (FERREIRA, 2000). A partir do final da década de 1990, reinicia-se um processo de aceleração da produtividade agrícola mundial (Tabela 1), cujo motivo parece ser ligado ao emprego de técnicas ligadas à biotecnologia.

Tabela 1. Produtividade agrícola dos maiores produtores mundiais. Países Mundo Brasil Canada Austrália EUA China Índia União Europeia

1990 414.723 9.779 22.339 11.875 59.404 10.060 3.506 -

Valor (milhões de reais) 2000 2007 2008 551.294 1.132.882 1.340.149 15.464 48.287 61.400 34.789 48.726 54.125 16.446 22.399 26.134 71.408 113.697 139.967 16.384 38.860 42.254 5.931 16.770 21.769 230.390 491.371 568.003

Fonte: Adaptação de OCDE/FAO (2012).

2009 1.168.847 57.659 43.637 23.449 119.584 40.880 16.661 494.860

Participação nas exportações 2000 2009 8,8 9,6 28,1 37,7 12,6 13,8 25,7 15,2 9,1 11,3 6,6 3,4 14 10,2 9,4 10,8

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Observa-se que o Brasil teve um aumento de quase 590% no valor de sua produção agrícola desde 1990 até 2009. Entretanto, em outros países, a produção agrícola apresenta redução na transição dos anos 2008 para 2009. Tal queda pode representar um saturamento da produção nas terras disponíveis. Segundo dados do IPEA (2010), uma análise dos principais países importadores de produtos agrícolas no mundo indica que poucos dos maiores países produtores mundiais apresentam autossuficiência na produção em seus territórios produtivos (Tabela 2).

Tabela 2. Principais países importadores de produtos agrícolas. 2010. País 1 - China 2 - EUA 3 - Argentina 4 - Países Baixos 5 - Alemanha 6 - Japão 7 - Reino Unido 8 - Chile 9 - Itália 10 Rússia 11 - Espanha 12 - Venezuela 13 - Coréia do Sul 14 - México 15 - França 16 - Outros

Valor (US$ Milhões) 30.789 19.462 18.523 10.228 8.138 7.141 4.635 4.258 4.235 4.152 3.894 3.854 3.760 3.715 3.576 -

Variação percentual 2010/2009 (%) 46,6 23,7 44,9 25,5 31,8 67,2 24,4 50,3 40,4 44,7 46,2 6,8 41,5 38,9 23,1 -

Participação (%) 15,3 9,6 9,2 5,1 4 3,5 2,3 2,1 2,1 2,1 1,9 1,9 1,9 1,8 1,8 35,4

Fonte: IPEA (2010).

Segundo Lagi et al. (2012), uma preocupação na produção de alimentos mundial está ligada à existência de impactos sobre a estabilidade econômica, social e política das nações. Assim, a volatilidade dos preços de alimentos, associada às condições climáticas e inexistência de novas fronteiras agrícolas, constitui uma ameaça às populações mundiais, enquanto houver estoques limitados de alimentos. Relatório OCDE/FAO (2012) indica que fatores como crescimento populacional, contínua migração aos centros urbanos, aumento da renda per capita e transformação da dieta nos países em desenvolvimento devem exercer pressão contínua na demanda por produtos agrícolas. Os países em desenvolvimento apresentam maior potencial de constituir os novos líderes da produção agrícola global até 2021, tendo em vista a possibilidade de incremento da área dedicada à agricultura e continuidade de melhoria na produtividade. Estima-se que o

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potencial de crescimento da produção anual nos países em desenvolvimento situe-se em torno de 1,9% ao ano, em comparação a 1,2% ao ano nos países desenvolvidos. O aumento da renda per capita associado ao desenvolvimento urbano devem gerar outras alterações nos hábitos alimentares, direcionando o consumo alimentar para ingestão de alimentos altamente processados com alto teor de gorduras e proteínas (OCDE/FAO, 2012). A maior parte da expansão da oferta mundial de leguminosas e oleaginosas, como a soja, deve concentrar-se no Brasil, EUA e Argentina, estimando-se incremento de 70% das exportações provenientes do Brasil, elevando de 26% para 35% sua participação no comércio mundial até 2019 (OCDE/FAO, 2012). Assim, o aumento da produtividade agrícola nos países em desenvolvimento deve ser fundamental para assegurar uma oferta suficiente de alimentos nas próximas décadas. Aos governos, caberia o estabelecimento de incentivos adequados à adoção de melhores práticas de produção nas zonas rurais, assim como a busca por capacitação dos agricultores. Por outro lado, a participação da iniciativa privada deve promover a consolidação dos investimentos necessários (OCDE/FAO, 2012). Segundo o relatório OCDE/FAO (2012), o comércio mundial de produtos agrícolas deve continuar a crescer no eixo Sul-Sul, em adição ao tradicional eixo Norte-Sul. Em termos de importações, há expectativa de integração de países em desenvolvimento, como Índia, no mercado mundial. Países com participação já consolidada, como China, devem buscar diversificar suas fontes de suprimento, redesenhando o fluxo global de produtos agrícolas (Figura 3).

Figura 3. Maiores produtores agrícolas mundiais. Fonte: OMC (2010).

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Os aumentos de produtividade, em médio prazo, devem ser destinados à busca por incremento da produção de matérias-primas destinadas à produção de biocombustíveis e sementes transgênicas. Atualmente, a área cultivável ainda disponível para expansão de fronteiras agrícolas é bastante limitada (Figura 4) (OCDE/FAO, 2012).



Figura 4. Mapa das terras cultiváveis no mundo. Fonte: FAO (2010).

Produção agrícola no Brasil A agricultura no Brasil é, historicamente, umas das principais bases da economia do país, desde os primórdios da colonização até o século XXI, evoluindo das extensas monoculturas à diversificação da produção (IBGE, 2006; IBGE, 2012). Inicialmente concentrada na produção de cana-de-açúcar, seguida pelo café, a agricultura brasileira apresenta-se, atualmente, como uma das maiores exportadoras do mundo em diversas espécies de cereais, frutas, grãos, entre outros (IBGE, 2006; IBGE, 2012). A vocação natural do Brasil para agricultura é reconhecida mundialmente, dada sua vasta extensão territorial combinada às condições climáticas favoráveis a diversos tipos de culturas. O Brasil é o quinto maior país na produção agropecuária mundial (US$ 100 bilhões anuais), segundo dados do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Ícone), sendo superado somente pela China (US$ 600 bilhões), seguida pela União Europeia (US$ 420 bilhões), Estados Unidos (US$ 287 bilhões) e Índia (US$ 140 bilhões).

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Considerando-se, adicionalmente, a parcela destinada à exportação, o país apresenta a terceira maior produção agrícola mundial (IPEA, 2010).

Tabela 3. Desempenho das exportações no Brasil. 2010. Exportação Total Básicos Manufaturados Semimanufaturados

Valor (US$ Milhões) 201.915 90.005 79.563 28.207

Variação percentual 2010/2009 (%) 32 45,3 18,1 37,6

Participação (%) 100 44,6 39,4 14

Fonte: IPEA (2010).

Segundo dados divulgados pelo IPEA, durante os anos de 2009 e 2010 o país teve uma variação de 32% no total geral de exportações, índice superado anualmente. Segundo dados do IBGE (2012), a safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas (que representa a maior parcela da produção agrícola nacional) é estimada em 163,3 milhões de toneladas em 2012, superior em 2,0% à safra obtida em 2011 (160,1 milhões de toneladas). A área produtiva em 2012 (49,4 milhões de hectares) apresenta acréscimo de 1,5% em relação à área de 2011. Arroz, milho e soja constituem os três principais produtos do grupo, representando 91,0% da produção estimada e correspondendo a 84,7% da área produtiva (Figura 5).

Figura 5. Avaliação da safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas. Fonte: IBGE (2012).

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A produção agrícola de grãos apresentou aumento constante desde 1997, ano de ingresso dos transgênicos no país. Tal incremento está altamente correlacionado à adoção de novas práticas agrícolas de manejo, plantação e colheita nas estações corretas, uso intensivo de maquinário e maior número de empregos em lavouras. Adicionalmente, a elevação da produção observada ocorre em uma área de plantio praticamente estável durante os quinze anos analisados (aumento correspondente a 22,5% da área cultivada), em face de incremento de 202,5% na produção. Entre os anos de 2000 e 2008, as exportações agrícolas brasileiras obtiveram um aumento médio de 18,6% por ano, superior ao crescimento das exportações agrícolas do Canadá (6,3%), Austrália (6%), EUA (8,4%) e União Europeia (11,4%). Em 2000, o Brasil ocupava o sexto lugar no ranking dos países exportadores agrícolas (IBGE, 2012). No entanto, o país ainda está distante de constituir o maior exportador de alimentos mundial. EUA e UE exportam valor superior ao dobro da produção do Brasil.

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Transgênicos: Histórico e definição O melhoramento genético de plantas, animais ou microrganismos é possível a partir da existência de alguma variabilidade genética, isto é, se houver indivíduos com diferentes características nas espécies a serem melhoradas. A variabilidade genética é facilmente constatada e tem origem em mutações (modificações nas moléculas do ácido desoxirribonucleico, DNA). O mecanismo de recombinação (resultante da hibridação, ou seja, do cruzamento entre tipos portadores de diferentes mutações) promove uma variabilidade adicional nas populações, propiciando a ocorrência de seleção natural. Hansen e Wright (1999) defendem que a seleção artificial é praticada há muito tempo. Desde o início das primeiras práticas agrícolas, há cerca de dez mil anos, populações humanas utilizam empiricamente métodos de melhoramento genético que imitam processos da evolução natural. A domesticação de culturas como trigo, cevada, ervilha e lentilhas é datada de 7.000 a.C. Banana, maçã, batata, milho, sorgo e outras culturas vegetais são melhoradas a partir de 5.000 a.C. Outras espécies, como abacaxi, determinadas hortaliças, morango, seringueira e dendê foram melhoradas na era cristã. A partir da descoberta de mecanismos genéticos, métodos racionais de melhoramento genético passam a ser utilizados pelos geneticistas em plantas cultivadas, animais domésticos e microrganismos úteis. Os organismos geneticamente modificados, ou transgênicos, são organismos com inserção de genes estranhos em seu código genético. O processo consiste na transferência de um ou mais genes responsáveis por determinada característica em um organismo para outro organismo ao qual é desejável incorporar tal característica (ESPLAR, 2012). A transgenia é resultado da convergência de técnicas de engenharia genética como solução biotecnológica para problemas da agricultura mundial, como pragas, doenças e estresses ambientais. Ademais, é possível beneficiar os demais setores produtivos (saúde, indústria e alimentação), contribuindo à geração de maior valor nos produtos agropecuários, unindo o agronegócio aos setores farmacêutico e industrial (HANSEN, WRIGHT, 1999).

A produção mundial de transgênicos As primeiras plantas transgênicas foram utilizadas na China no início da década de 1990. Nos EUA, a primeira aprovação para uso comercial de uma planta transgênica ocorreu no ano de 1994, via lançamento de um tomate com vida de prateleira superior pela empresa Calgene. Dados de diversas instituições internacionais revelam incremento nas plantações comerciais de transgênicos no mundo. Em 1999, cerca de 40 milhões de hectares

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apresentavam cultivo de vegetais transgênicos no mundo (Tabela 4) (AZEVEDO, FUNGARO, VIEIRA, 2000).

Tabela 4. Área de plantio baseado em biotecnologia, em milhões de hectares. 1996-2010. Ano Hectares (em milhões) Acres (em milhões)

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 1,7

4,3

11

27,8 39,9

44,2

27,5 69,5 98,6 109,2

52,6 58,7

130

2003 2004 2005 2006 2007

67,7

81

145 167,2 200

90

102 114,3

222

252

282

2008 2009 2010

125

Total

134

148

1097,9

308,8 335

365

2716,1

Fonte: JAMES (2010a).

Desde 1996, a aplicação da tecnologia dos transgênicos nas plantações de países desenvolvidos e países em desenvolvimento apresenta crescimento constante ao longo dos anos.

Tabela 5. Área de plantio baseado em biotecnologia, segundo país. País EUA Brasil Argentina Índia Canada China Paraguai Paquistão África do Sul Uruguai Bolívia Austrália Filipinas Mianmar Burkina Faso Espanha México Colômbia Chile Honduras Portugal República Tcheca Polônia Egito Eslováquia Costa Rica Romênia Suécia Alemanha Fonte: JAMES (2010a).

2009 Área 64,0 21,4 21,3 8,4 8,2 3,7 2,2 2,1 0,8 0,8 0,2 0,5 0,1 0,1 0,1
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